Folha de S.Paulo

Acadêmico respeitado, Cacá Machado lança disco com canções populares

- Luiz Fernando Vianna

rio de janeiro Cacá Machado (ou Carlos Gonçalves Machado Neto) é um respeitado estudioso da música brasileira, autor de ensaios sobre Ernesto Nazareth e Tom Jobim. Foi professor visitante da USP e desde 2014 é professor titular da Unicamp.

Ao escolher como título de seu segundo CD um adjetivo pouco conhecido, “Sibilina”, e pouco luminoso (significa obscura, misteriosa), ele parece estar sendo acadêmico mesmo quando cria e interpreta canções populares.

Mas não é isso o que move o trabalho do compositor paulistano de 46 anos. “Para mim, se a música é boa, se balança, está tudo bem.”

“Sibilina”, a canção, surgiu “aos 45 minutos do segundo tempo”, de acordo com Machado. O título do disco seria o da faixa de abertura, “Tem Um”, uma composição de ritmo forte e com apelo social e político. A opção, no entanto, poderia não traduzir todo o repertório do disco nem o estilo do artista. “Minhas músicas são um pouco enigmática­s, dizem não dizendo. São claros enigmas”, diz.

Há outros intérprete­s no disco, em duos com Machado ou não. As escolhas têm significad­os para além das vozes. Guilherme Wisnik canta “Nós, Formigas”, letra sua sobre a vida nas grandes cidades e a “nebulosida­de” do presente, temas de seu trabalho como teórico de arquitetur­a e ensaísta.

Alessandra Leão, cantora e pesquisado­ra dedicada aos primórdios da música popular no Brasil, participa de “Polca”. O gênero-título está na origem do choro e do samba.

A voz do baiano Mateus Aleluia, 75, integrante do histórico trio Os Tincoãs, abre o CD. “Seu Mateus é uma entidade. É interessan­te ele pôr aquela voz afro-barroca em ‘Tem Um’, que é quase um rap”, destaca Machado.

O também baiano Tiganá Santana está em “Tremor Essencial”, e duas cantoras de estilos marcantes, Ava Rocha e Iara Rennó, interpreta­m “Depois do Trovão”. O CD anterior, “Eslavosamb­a” (outro título sibilino), de 2013, era aberto por outra entidade, Elza Soares, em “Sim”.

“Sempre foi um bolero, para ser cantado de maneira intensa, como a da Elza. Mas quis gravar agora do meu jeito, mais intimista, quase cochichand­o”, explica.

Machado integra o círculo de artistas que está por trás dos dois últimos CDs de Elza e de alguns dos mais importante­s projetos musicais realizados em São Paulo.

Parte dessas pessoas tem vínculos familiares com países do Leste Europeu: entre outros nomes, Wisnik, Nestrovski, Nikitin, Climachaus­ka (o Clima). Daí nasceu o conceito “eslavosamb­a”.

Em “Sibilina”, a ideia é representa­da por “Sambábuchk­a”, parceria de Machado e Nikitin que Alessandra Leão interpreta. A união entre produção de música popular e reflexões sobre ela descende de uma geração anterior, a de José Miguel Wisnik e Luiz Tatit, e tem em Machado um forte continuado­r —embora, até o momento, menos conhecido, com uma carreira ainda sob neblina.

“É o meu jeito, pois faço muitas coisas ao mesmo tempo”, diz ele, ao modo sibilino.

Sibilina

Artista: Cacá Machado. Gravadora: Circus/YB. R$ 25 e plataforma­s digitais

 ?? José de Holanda/ Divulgação ?? O professor e compositor Cacá Machado, que lança ‘Sibilina’
José de Holanda/ Divulgação O professor e compositor Cacá Machado, que lança ‘Sibilina’

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