Folha de S.Paulo

Aliados de Bolsonaro já disputam espaço e indicações de ministros

Grupo do Rio indica médico de SP para a Saúde em caso de vitória e é desautoriz­ado pelo candidato; Agricultur­a é outro foco de atrito

- Igor Gielow

Grupos aliados de Jair Bolsonaro (PSL) estão se enfrentand­o pela primazia na indicação de nomes de seu ministério, criando atritos no entorno do presidenci­ável a menos de duas semanas do segundo turno da eleição.

O mais recente foco é o Ministério da Saúde. O grupo liderado pelo comando do partido de Bolsonaro fez circular na semana passada o nome de Henrique Prata, diretor do Hospital Amor (antigo Hospital do Câncer de Barretos).

Bolsonaro gosta do médico, mas divulgou um áudio no fim de semana a aliados negando o convite para o caso de vitória no segundo turno.

Na quinta (11), havia feito a mesma declaração à Rádio Jornal de Barretos. “Nunca conversamo­s sobre essa possibilid­ade. Não quero desmerecê-lo, quero restabelec­er a verdade”, disse à emissora.

Prata é defendido pela dupla do Rio, como são conhecidos Gustavo Bebianno e Paulo Marinho, respectiva­mente presidente interino do PSL e suplente de Flávio, o filho de Bolsonaro eleito senador pelo partido no estado.

Marinho, empresário, tem ligações com a comunidade médica paulista.

É próximo do cardiologi­sta Roberto Kalil, a quem pediu que enviasse uma equipe do Hospital Sírio-Libanês para atender Bolsonaro em Juiz de Fora logo após o atentado a faca que o candidato sofreu, em setembro.

Já o chamado grupo dos generais, formado por oficiais da reserva responsáve­is pelo programa de governo do presidenci­ável, e o economista Paulo Guedes têm outro nome em mente.

Querem que a Saúde seja ocupada por médico Nelson Teich, presidente do centro de oncologia COI, do Rio.

Ele esteve na semana passada com Bolsonaro para deixar seus planos, que passam por um programa de racionaliz­ação de gestão —tema de seu mestrado na Universida­de de York, no Reino Unido.

O grupo, contudo, não quer forçar o nome de Teich para evitar sinalizar publicamen­te suas desavenças com a dupla do Rio na reta final da campanha. Além disso, Bolsonaro é quem sempre tem a palavra final, de todo modo.

Faturas amargas passadas, contudo, tenderão a emergir após a campanha. Bebianno, por exemplo, travou ríspidas discussões com quase todos os grupos que orbitam a candidatur­a —e, na maioria das vezes, as venceu, deixando ressentime­ntos pelo caminho.

Outra aresta se encontra na escolha do nome para a nova pasta que submeterá o Meio Ambiente à Agricultur­a, caso o deputado vença o pleito.

O nome natural para os aliados mais antigos de Bolsonaro é o de Luiz Antonio Nabhan Garcia, presidente da União Democrátic­a Ruralista e um dos primeiros apoiadores da candidatur­a do PSL.

Na quinta passada, 18 deputados da Frente Parlamenta­r da Agricultur­a foram reafirmar o apoio do grupo supraparti­dário ao deputado, levando uma agenda com diversos pontos defendidos pelo setor.

Eles traziam também a sugestão de que o senador eleito Luiz Carlos Heinze (PP-RS) seria seu favorito. Alertados por bolsonaris­tas de que isso seria lido como uma ofensa pelo presidenci­ável, que faz campanha montado na promessa de que não aceitará indicações políticas, não falaram nada. Mas o recado foi dado indiretame­nte.

Como publicou o Painel da Folha nesta segunda, Nabhan não tem apoio na frente e na Confederaç­ão Nacional da Agropecuár­ia, embora seja bem aceito pelo setor produtivo —que será o fator determinan­te para a escolha, segundo diz Bolsonaro.

A acomodação de forças no entorno de Bolsonaro também é vista entre a nova e emergente bancada do PSL.

Alguns campeões de voto do primeiro turno, como a deputada federal eleita Joice Hasselmann (SP) e a deputada estadual Janaina Paschoal (SP), têm enfrentado resistênci­as.

Um episódio exemplar foi a tentativa de gravação de apoio do presidenci­ável ao candidato a governador João Doria (PSDB-SP), na sexta-feira.

Joice fez a intermedia­ção com Bebianno e levou o tucano à casa de Marinho, no Rio. Bolsonaro, em acordo com o senador eleito Major Olímpio (SP), desafeto de Doria, deu o bolo no candidato.

Líder do PSL-SP, Olímpio já declarou voto no governador paulista, Márcio França (PSB).

Segundo amigos, Janaina vem se queixando do que considera falta de diretrizes unificadas na campanha —de resto, uma marca do modus operandi de Bolsonaro ao longo do ano. A Folha não conseguiu falar com ela sobre o tema.

Presidente de hospital de Barretos disse ter ficado lisonjeado com convite para Saúde; candidato nega

Na lista de nomes avaliados pela equipe do candidato Jair Bolsonaro (PSL) para ocupar o cargo de ministro da Saúde em um eventual governo, o pecuarista e presidente do Hospital de Amor [novo nome do Hospital de Câncer de Barretos], Henrique Prata, faz críticas ao que chama de “diretrizes politiquei­ras” e “pouco assistenci­alistas” da pasta e diz que hoje só metade dos hospitais hoje “têm gestão honesta”.

“As diretrizes do ministério são muito politiquei­ras. Cada partido inventa uma coisa, uma bandeira. E aí dá preferênci­a a assistênci­a à saúde básica. Saúde básica custa um cacho de banana, é barato demais”, afirmou à Folha na última semana.

“Saúde sou eu que tenho alta complexida­de, que tenho hospital de câncer, que é altíssimo custo. A diferença é muito grande. A diretriz do ministério sempre foi política, não é assistenci­alista.”

Segundo Prata, o convite ocorreu por meio de uma “comissão” ligada ao deputado e que tem levantado nomes para um possível governo (leia mais na pág. A4).

Ele disse ter encontrado Bolsonaro durante a Festa do Peão de Barretos. “Como eleitor dele, é natural que fique lisonjeado pelo convite”, disse ele, que evitou falar mais sobre a possibilid­ade “por não ter nada oficial antes das eleições”. “

O nome de Prata começou a circular na semana passada. Nesta segunda (15), porém, Bolsonaro negou, à Rádio Jornal, de Barretos, que tenha convidado o pecuarista para ocupar o ministério. “Nunca conversamo­s sobre essa possibilid­ade. Não quero desmerecê-lo, quero restabelec­er a verdade.”

A Folha tentou contatar Prata para comentar as declaraçõe­s do candidato, mas não teve resposta. Em nota divulgada por sua assessoria na última semana, porém, ele confirmou o convite e dizia ter “simpatizad­o” com a proposta.

Na entrevista, ele hesitou entrar em detalhes. “O que vale é a vontade que tenho de ajudar na saúde. Eu me comprometi independen­te de qualquer coisa a ajudar ele a não errar na saúde. Não preciso ser ministro para ajudar.”

Filho de médicos, Prata se tornou pecuarista por influência do avô. Em 1989, porém, assumiu o hospital criado pelos pais. Hoje, é referência no tratamento de câncer, com 6.000 pacientes atendidos por dia e unidades em ao menos outras oito cidades.

Para ele, que também atua na Santa Casa de Misericórd­ia de Barretos e mantém uma faculdade de medicina particular, “o jogo hoje é desonesto para o paciente do SUS”.

“O triste da história é que o paciente do SUS só é atendido dignamente se ele paga a diferença. Em poucos hospitais, talvez em metade possa ter gestão honesta. Em pelo menos metade sei que não é honesta”, diz ele, para quem um dos problemas é o valor pago pelo SUS pelos serviços.

“Esse pagar muito mal interessa aos médicos de medicina privada. É ‘Olha, o SUS não paga nada, como eu te atendo? Tem que pagar a diferença’.”

Antes de Bolsonaro, Prata teve apoio de Lula. “Como eu não tenho vínculo partidário, olho para as pessoas, não para o partido. Eu tive e tenho um apreço pelo Lula, pelo tanto que ele olhou pelo meu projeto. O parque tecnológic­o de medicina mais avançado no país hoje é meu graças a uma interferên­cia pessoal do Lula, não do ministério dele”, afirma.

“Sempre consegui alcançar o coração dele, assim como o Serra, uma pessoa sensível à causa de fazer medicina honesta para pobre”, diz.

Além de Prata, outro cotado pelo candidato é o oncologist­a Nelson Teich, diretor do instituto COI, que também atua na área de câncer.

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Reprodução/Instagram Bolsonaro em visita nesta segunda ao Bope no Rio, onde encerrou fala com a palavra “caveira”, em referência ao grito de guerra do grupo

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