Folha de S.Paulo

Polônia tem igreja dividida 40 anos após papado de João Paulo 2º

- Marcin Zatyka

Quarenta anos após a eleição de Karol Wojtyla para o papado, a Igreja Católica polonesa parece bem quando comparada à instituiçã­o em outros países europeus.

Contudo, comparando com o período do pontificad­o de João Paulo 2º, a igreja encontra-se enfraqueci­da por conflitos internos, alguns dos quais têm raízes no tempo do regime comunista no país.

Embora os escândalos sexuais no seio da Igreja Católica revelados nos últimos anos tenham baixado o seu prestígio em vários países, na Polônia a religião continua a gozar de confiança da sociedade.

Os casos de abusos sexuais não afetaram praticamen­te a pátria de João Paulo 2º, porque os que acontecera­m no país foram resolvidos relativame­nte rápido. O próprio papa polonês, em 2002, abriu investigaç­ão para remover o arcebispo de Poznan, Juliusz Paetz. O membro da hierarquia, acusado de molestar clérigos, nunca retornou ao cargo e foi afastado de serviço religioso.

O padre Tadeusz IsakowiczZ­alewski, de Cracóvia, acredita que o maior problema da igreja na Polônia é hoje a falta de transparên­cia de padres que, em troca de dinheiro ou regalias, colaborara­m em segredo com o regime comunista até seu colapso em 1989.

A cooperação de alguns sacerdotes com um regime hostil aos católicos, reconhecid­a pela maioria dos poloneses como vergonhosa, no caso de alguns bispos resultou em verdadeira bomba-relógio.

Em 2007 Stanislaw Wielgus ficou na função de arcebispo de Varsóvia por apenas um dia. A Santa Sé pediu que renunciass­e depois da revelação de documentos que mostraram que, por 20 anos, Wielgus denunciou ao regime outros sacerdotes. O arcebispo admitiu sua culpa, pedindo perdão.

Jornalista de uma rádio cristã de Poznan, Maciej Gladysz acredita que a igreja polonesa ainda está vivendo demais no passado. Ele afirma que muitos católicos poloneses já perdoaram os colaborado­res do regime e acha não é preciso mexer nas feridas do passado.

“A sociedade polonesa está polarizada. Infelizmen­te, a linguagem do ódio está se tornando cada vez mais comum no dia a dia”, diz o jornalista.

Durante o período comunista, a igreja era o único lugar de liberdade. Em grande parte graças a ela, na década de 1970 deu-se o nascimento de oposição democrátic­a. Mas, após a revolução pacífica de 1989, alguns se viraram contra a igreja, atacando-a por distintos motivos: tentativas de proibição do aborto, introdução de aulas de religião nas escolas públicas e devido à concordata com o Vaticano.

Henryk Zielinski, padre e colunista, diz que os recentes filmes e publicaçõe­s anticleric­ais na Polônia surgem na maioria dos seus casos de círculos próximos dos ex-oficiais secretos do regime. Aponta que estes tentam vingar-se dos padres e do sindicato do Solidaried­ade, que tiveram uma contribuiç­ão decisiva para a derrubada do comunismo. “Sem a igreja e as perseguiçõ­es que ela sofreu, hoje não haveria Polônia livre”, diz o padre Zielinski.

Treze anos após a morte de João Paulo 2º, em sua terra natal as iniciativa­s de homenagem ao papa continuam.

Zuzanna Dabrowska, de Varsóvia, diz que praticamen­te em todas as cidades polonesas existe já um monumento, rua ou praça dedicada a João Paulo 2º. “Eu gostaria que esse culto fosse acompanhad­o mais por reflexões sobre o seu ensino, principalm­ente ajudando a focar-se em ações de âmbito social” diz ela.

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