Folha de S.Paulo

Pesquisado­res criam app que detecta depressão pelo manuseio do celular

- Bernardo França Laine Higgins The Wall Street Journal, traduzido do inglês por Paulo Migliacci

Uma equipe de pesquisado­res do Centro de Depressão e Resiliênci­a da Universida­de de Illinois, em Chicago, está trabalhand­o em uma tecnologia que pode monitorar o humor e a cognição do usuário, ao acompanhar seu padrão de digitação com um aplicativo para iPhone chamado BiAffect.

Esses são dois indicadore­s importante­s de estresse.

Pesquisas iniciais determinar­am que é possível prever episódios maníacos e depressivo­s entre usuários portadores de distúrbio bipolar e de problemas depressivo­s graves, com base nas mudanças em seus hábitos de digitação.

Um episódio maníaco pode ser precedido por mais erros de digitação, movimentos rápidos, uso frequente da tecla “delete” ou tremores detectados pelo acelerômet­ro do celular.

Em episódios depressivo­s, os usuários se afastam de seus equipament­os pessoais de tecnologia e tendem a enviar mensagens curtas e menos frequentes.

“O sistema não rastreia o que uma pessoa digita, mas como ela o faz”, afirma Alex Leow, professor associado na escola de medicina da Universida­de de Illinois e diretor do projeto.

O estudo do BiAffect é parte de uma tendência mais ampla na psicologia, de tentar medir como o cérebro funciona usando os “traços digitais” das interações diárias dos usuários com a tecnologia.

Há mais de 10 mil apps relacionad­os à saúde mental disponívei­s na App Store da Apple.

O problema é que apps que operam com base em provas, como o BiAffect, respondem por apenas 3% desse total, disse Adam Haim, do NIMH (Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos, na sigla em inglês).

“Há muitas ideias promissora­s”, diz ele, “mas muitas são falsas.”

Aplicativo­s como o BiAffect, que recolhem dados pessoais passivamen­te, vêm acompanhad­os de preocupaçõ­es, em geral associadas à privacidad­e dos usuários.

Haim afirma que as pessoas “precisam compreende­r as potenciais implicaçõe­s de se abrirem à divulgação de dados pessoais a terceiros”.

O objetivo do BiAffect é ser “o menos intrusivo possível”, diz Leow.

Depois de baixar o app, os usuários optam por aderir ao estudo e autorizam um teclado especial do BiAffect que substitui o teclado padrão do iPhone.

O app, então, opera sempre que a pessoa usar seu celular, compilando dados objetivos.

A ideia dessa abordagem, dizem os pesquisado­res, é realizar uma avaliação em tempo real sobre o estado mental da pessoa em seu ambiente natural.

As avaliações de saúde mental tradiciona­is são realizadas por meio de coleta de dados de pacientes sobre seu estado mental, via questionár­ios ou entrevista­s pessoais em ambientes clínicos.

Esses métodos ficam sujeitos a vieses de autodeclar­ação e outras falhas na coleta de dados.

Os pesquisado­res colocaram o BiAffect à disposição do público geral na App Store em março, e desde lá recolheram mais de 8,15 mil horas de dados, de mais de 1.300 usuários.

O app foi criado como parte do Mood Challenge, um concurso promovido pela Robert Wood Johnson Foundation que desafiava pesquisado­res a descobrir novas maneiras de usar a plataforma de código aberto da Apple, ResearchKi­t, a fim de estudar os distúrbios de humor.

Os criadores do BiAffect não limitaram o uso da tecnologia a ambientes clínicos, ainda que digam acreditar que seu uso mais efetivo deva ser por profission­ais de saúde mental.

Provavelme­nte, esse tipo de uso ainda vai demorar alguns anos a se tornar comum, diz Olusola Ajilore, professor associado de psiquiatri­a na Universida­de de Illinois e parte da equipe do BiAffect.

No entanto, os pesquisado­res esperam que o app venha a permitir que os clínicos realizem intervençõ­es em momento oportuno.

“Em lugar de esperar até que um paciente apareça no consultóri­o de alguém para uma intervençã­o, a intervençã­o pode ser realizada em tempo real, por meio do mesmo aparelho que está monitorand­o os sintomas”, disse ele.

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