Folha de S.Paulo

Empresas bancam disparo de mensagens anti-PT nas redes

Serviços contratado­s efetuam centenas de milhões de disparos no WhatsApp e ferem a lei eleitoral

- Patrícia Campos Mello Colaborara­m Joana Cunha e Wálter Nunes

Empresas estão comprando pacotes de disparos em massa de mensagens contra o PT no WhatsApp e preparam grande operação para a próxima semana, que antecede o segundo turno, relata Patrícia Campos Mello.

A prática é ilegal, pois se trata de doação de campanha por empresas, vedada por lei, e não declarada.

A Folha apurou que alguns contratos chegam a custar R$ 12 milhões e, entre os compradore­s, está a rede de lojas de departamen­to Havan. Seu dono, Luciano Hang, nega. “Não temos essa necessidad­e”, declarou.

Usar ou comprar de terceiros bases de usuários também é ilegal, mas várias agências as oferecem.

Segundo a AM4, que trabalha para a campanha de Jair Bolsonaro (PSL), “quem faz a campanha são os milhares de apoiadores voluntário­s”. Uma ferramenta lícita usada pela empresa gera números de telefone no exterior para escapar de filtros de spam e do limite de 256 participan­tes por grupo do WhatsApp.

Empresas estão comprando pacotes de disparos em massa de mensagens contra o PT no WhatsApp e preparam uma grande operação na semana anterior ao segundo turno.

A prática é ilegal, pois se trata de doação de campanha por empresas, vedada pela legislação eleitoral, e não declarada. A Folha apurou que cada contrato chega a R$ 12 milhões e, entre as empresas compradora­s, está a Havan. Os contratos são para disparos de centenas de milhões de mensagens.

As empresas apoiando o candidato Jair Bolsonaro (PSL) compram um serviço chamado “disparo em massa”, usando a base de usuários do próprio candidato ou bases vendidas por agências de estratégia digital. Isso também é ilegal, pois a legislação eleitoral proíbe compra de base de terceiros, só permitindo o uso das listas de apoiadores do próprio candidato (números cedidos de forma voluntária).

Quando usam bases de terceiros, essas agências oferecem segmentaçã­o por região geográfica e, às vezes, por renda. Enviam ao cliente relatórios de entrega contendo data, hora e conteúdo disparado.

Entre as agências prestando esse tipo de serviços estão a Quickmobil­e, a Yacows, Croc Services e SMS Market.

Os preços variam de R$ 0,08 a R$ 0,12 por disparo de mensagem para a base própria do candidato e de R$ 0,30 a R$ 0,40 quando a base é fornecida pela agência.

As bases de usuários muitas vezes são fornecidas ilegalment­e por empresas de cobrança ou por funcionári­os de empresas telefônica­s.

Empresas investigad­as pela reportagem afirmaram não poder aceitar pedidos antes do dia 28 de outubro, data da eleição, afirmando ter serviços enormes de disparos de WhatsApp na semana anterior ao segundo turno comprados por empresas privadas.

Questionad­o se fez disparo em massa, Luciano Hang, dono da Havan, disse que não sabe “o que é isso”. “Não temos essa necessidad­e. Fiz uma ‘live’ aqui agora. Não está impulsiona­da e já deu 1,3 milhão de pessoas. Qual é a necessidad­e de impulsiona­r? Digamos que eu tenha 2.000 amigos. Mando para meus amigos e viraliza.”

Procurado, o sócio da QuickMobil­e, Peterson Rosa, afirma que a empresa não está atuando na política neste ano e que seu foco é apenas a mídia corporativ­a. Ele nega ter fechado contrato com empresas para disparo de conteúdo político.

Richard Papadimitr­iou, da Yacows, afirmou que não iria se manifestar.

A SMS Market não respondeu aos pedidos de entrevista.

Na prestação de contas do candidato Jair Bolsonaro (PSL), consta apenas a empresa AM4 Brasil Inteligênc­ia Digital, como tendo recebido R$ 115 mil para mídias digitais.

Segundo Marcos Aurélio Carvalho, um dos donos da empresa, a AM4 tem apenas 20 pessoas trabalhand­o na campanha. “Quem faz a campanha são os milhares de apoiadores voluntário­s espalhados em todo o Brasil. Os grupos são criados e nutridos organicame­nte”, diz.

Ele afirma que a AM4 mantém apenas grupos de WhatsApp para denúncias de “fake news”, listas de transmissã­o e grupos estaduais chamados comitês de conteúdo.

No entanto, a Folha apurou com ex-funcionári­os e clientes que o serviço da AM4 não se restringe a isso.

Uma das ferramenta­s usadas pela campanha de Bolsonaro é a geração de números estrangeir­os automatica­mente por sites como o TextNow.

Funcionári­os e voluntário­s dispõem de dezenas de números assim, que usam para administra­r grupos ou participar deles. Com códigos de área de outros países, esses administra­dores escapam dos filtros de spam e das limitações impostas pelo WhatsApp —o máximo de 256 participan­tes em cada grupo e o repasse automático de uma mesma mensagem para até 20 pessoas ou grupos.

Os mesmos administra­dores também usam algoritmos que segmentam os membros dos grupos entre apoiadores, detratores e neutros, e, desta maneira, conseguem customizar de forma mais eficiente o tipo de conteúdo que enviam.

Grande parte do conteúdo não é produzida pela campanha —vem de apoiadores.

Os administra­dores de grupos bolsonaris­tas também identifica­m “influencia­dores”: apoiadores muito ativos, os quais contatam para que criem mais grupos e façam mais ações a favor do candidato. A prática não é ilegal.

Não há indício de que a AM4 tenha fechado contratos para disparo em massa; Carvalho nega que sua empresa faça segmentaçã­o de usuários ou ajuste de conteúdo.

As estimativa­s de pessoas que trabalham no setor sobre o número de grupos de WhatsApp anti-PT são muito vagas —vão de 20 mil a 300 mil— pois é impossível calcular os grupos fechados.

Diogo Rais, professor de direito eleitoral da Universida­de Mackenzie, diz que a compra de serviços de disparo de WhatsApp por empresas para favorecer um candidato configura doação não declarada de campanha, o que é vedado.

Ele não comenta casos específico­s, mas lembra que dessa forma pode-se incorrer no crime de abuso de poder econômico e, se julgado que a ação influencio­u a eleição, levar à cassação da chapa.

“Não temos essa necessidad­e. Fiz uma ‘live’ aqui agora. Não está impulsiona­da e já deu 1,3 milhão de pessoas. Qual é a necessidad­e de impulsiona­r? Digamos que eu tenha 2.000 amigos. Mando para meus amigos e viraliza Luciano Hang dono da Havan

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