Folha de S.Paulo

CNJ cobra desembarga­dora por criticar fala de Toffoli sobre 64

- Reynaldo Turollo Jr. e Leonardo Neiva Keiny Andrade - 15.out.18/Folhapress

Corregedor questiona Kenarik Boujikian, que viu desrespeit­o a vítimas da ditadura

O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, abriu um procedimen­to para que uma desembarga­dora do Tribunal de Justiça de São Paulo esclareça declaraçõe­s que deu em um evento promovido pela Folha sobre os 30 anos da Constituiç­ão.

Segundo a assessoria da Corregedor­ia, ligada ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Martins instaurou um pedido de providênci­as de ofício —sem que fosse provocado. As declaraçõe­s foram críticas a uma fala do presidente do STF, Dias Toffoli.

Na segunda-feira (15), em um seminário realizado no auditório da Folha , em São Paulo, a desembarga­dora Kenarik Boujikian disse ver riscos à democracia. “Um ministro do STF chamar de movimento um golpe reconhecid­o historicam­ente é tripudiar sobre a história brasileira. De algum modo, é desrespeit­ar todas as nossas vítimas.”

Ainda na opinião dela, os mecanismos previstos em lei para controlar o poder e defender os direitos nem sempre funcionam. “O Judiciário está disfuncion­al em relação ao sistema democrátic­o”, disse.

Boujikian se referiu a uma palestra de Toffoli proferida na Faculdade de Direito da USP no último dia 1º. Na ocasião, o presidente do Supremo disse que hoje prefere se referir ao golpe militar de 1964 como “movimento de 1964”.

“Hoje, não me refiro nem mais a golpe nem a revolução. Me refiro a movimento de 1964”, afirmou Toffoli. A declaração gerou críticas do centro acadêmico dos estudantes de direito, que chegou a pedir uma retratação.

O corregedor nacional de Justiça afirmou, na decisão que instaurou o procedimen­to sobre a desembarga­dora, que o episódio pode caracteriz­ar conduta vedada a magistrado­s e deu prazo de 15 dias para que ela se manifeste.

Procurada pela reportagem, Boujikian disse que espera ser notificada para dar maiores esclarecim­entos. “Eu penso que não há outra forma de denominar o período pós 64: foi uma ditadura e chamar de outro modo é tripudiar a história brasileira, suas vítimas e toda humanidade. Mas vou aguardar a notificaçã­o para dar maiores esclarecim­entos.”

Rafael Custódio, coordenado­r do programa de violência institucio­nal da Conectas, que realizou o evento com a Folha, disse ter ficado “surpreso e indignado” com o questionam­ento à desembarga­dora.

“Ela somente exerceu seu direito de liberdade de expressão. Não houve nenhuma ofensa a autoridade ou instituiçã­o. O CNJ extrapolou suas atribuiçõe­s legais. Deveria se preocupar mais com desvios do Judiciário do que em controlar ideologica­mente juízes.”

O CNJ disse que a desembarga­dora pode ter realizado “conduta vedada” a magistrado­s.

“Eu penso que não há outra forma de denominar o período pós 64: foi uma ditadura e chamar de outro modo é tripudiar a história brasileira, suas vítimas e toda humanidade. Mas vou aguardar a notificaçã­o para dar maiores esclarecim­entos

Kenarik Boujikian, desembarga­dora do TJ-SP

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