Folha de S.Paulo

Bolsonaro tem de entregar o ouro

Enquete mostra motivos de o mercado acreditar em planos ainda vagos de reforma liberal

- Vinicius Torres Freire Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administra­ção pública pela Universida­de Harvard (EUA) vinicius.torres@grupofolha.com.br

Quanto Jair Bolsonaro trata de reafirma Previdênci­a, a tese dos “direitos adquiridos”, em geral um argumento de sindicatos, corporaçõe­s e de certa esquerda.

Seus planos de reforma previdenci­ária vivem em uma zona crepuscula­r que vai desde

mudança quase nenhuma até mirabolânc­ias ou ambições no

momento inviáveis.

No entanto, o mercado se move. Os negociante­s de dinheiro declaram voto em Bolsonaro e votam também nos preços da moeda brasileira e

dos títulos da dívida pública, que sobem. Na praça financeira, é o que interessa.

Ainda que existam planos

infalíveis em elaboração, não há diretrizes firmes, prioridade­s e sequenciam­ento de mudanças econômicas, porém.

Além do mais, algumas conversas do universo bolsonaris­ta não são liberais, mas libertinas.

O atropelo de boas normas ambientais ou sanitárias e de mínimos trabalhist­as tende a ser um tiro pela culatra. Feitos a ferro e fogo, produtos agropecuár­ios ou extrativis­tas

podem ser objeto de barreiras comerciais ou civilizató­rias, no exterior.

Restrições a investimen­tos

estrangeir­os, mesmo que venham da China, podem pegar mal e deixar gente lá fora com o pé atrás —e fora daqui. Mesmo pelos piores motivos, não são boas ideias.

Como então o pessoal elabora os motivos de seu otimismo

com uma reforma liberal? Este jornalista fez uma enquete.

Primeiro, o que mais se ouve é que Bolsonaro tem uma equipe grande trabalhand­o no programa de reformas, um governo já em obras.

Seria gente capacitada a elaborar os planos, faz tempo comprometi­da política e intelectua­lmente com mudança radical do Estado.

Além do mais, dizem que executivos reputados, vários deles de bancos, estão sendo cotados para fazer parte do governo, hipótese revelada por esta Folha.

A colaboraçã­o vai aumentar,

acreditam, baseados em conversas de bastidores ou rumores. Confirmada uma vitória de Bolsonaro, de mais economista­s haveria a adesão de prestígio, de proximidad­e com longa com os história tucanos, por exemplo.

Segundo, Bolsonaro ainda não disse a que veio. Ainda estaria em campanha, dourando a pílula, estratégia de qualquer candidato. Como deu o sentido geral do governo, liberal em economia, não seria suspeito de estelionat­o eleitoral.

As grandes linhas seriam ine

quívocas, vide as declaraçõe­s recentes sobre a independên­cia do Banco Central, câmbio flutuante, meta de inflação.

Terceiro, Bolsonaro ainda

não teve tempo de bater ponto a ponto o programa com Paulo Guedes, planos que, no entanto, seriam claros, acertados com o candidato. Não deu mais detalhes também porque detalhes ainda não há (essa conversa não faz sentido no

caso de Previdênci­a ou salário

mínimo, mas passemos).

Quarto, dizem alguns mais raros, a primeira reação de Bolsonaro à venda de joias da coroa estatal não seria tão pro

blemática quanto parece.

Privatizaç­ões de grandes em

presas são um plano complexo e demorado e, de qualquer modo, o governo vai se livrar do custo de um monte de estatais menores e ineficient­es.

Quinto, quase um conjunto

vazio: dificuldad­es políticas

são raramente mencionada­s.

De qualquer modo, o humor

no mercado teria batido em um teto provisório. A melhora seria resultado, em parte, de um monte de especulaçõ­es pessimista­s com o dólar (na fofoca da praça, o favoritism­o petista levaria o dólar a R$ 4,50 ou R$ 5 e além, lembra?).

A partir de novembro, a festa continua apenas se Bolsonaro entregar o ouro de verdade.

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