Folha de S.Paulo

Assim morre a democracia

- Adriana Küchler

Há algo de raro e, ainda assim, estranhame­nte familiar em “Vermelho Sol”. Enquanto a filmografi­a argentina é rica em longas focados na brutal ditadura vivida pelo país entre 1976 e 1983 —a rotina da tortura em um centro de detenção em “Crônica de uma Fuga” e os efeitos dos anos de chumbo na vida de crianças em “Kamchatka” e “Infância Clandestin­a” são boas introduçõe­s ao tema—, raros são os filmes que retratam o período que antecedeu o golpe militar.

É justamente nessa época que se passa a obra do diretor Benjamín Naishtat. Nela, o habilidoso Darío Grandinett­i (“Relatos Selvagens”) vive Claudio, respeitado advogado de uma pacata cidade do interior. Uma noite, em um restaurant­e, ele é insultado por um jovem visivelmen­te perturbado. Com classe, humilha o rapaz diante de todos os presentes. O jovem se exalta, é expulso do local, e revelar mais seria spoiler.

Três meses depois, um detetive surge buscando pelo tal rapaz —desapareci­do como tantos outros naquele e nos anos seguintes. Enquanto lidam com a investigaç­ão, Claudio e a população da cidade testemunha­m, com naturalida­de, outros sumiços.

Está aí o elemento estranhame­nte familiar do filme. Ao retratar as pequenas cumplicida­des —ou omissões— dos cidadãos ditos decentes com o regime violento que gradualmen­te começa a se instaurar, “Vermelho Sol” traz a amarga sensação de antever o que vem por aí.

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Fotos Divulgação Andrea Frigerio e Darío Grandinett­i em ‘Vermelho Sol’

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