Folha de S.Paulo

Baixo nível à paulista

Doria e França substituem o debate programáti­co pela troca de impropério­s, em disputa acirrada pelo espólio minguante do tucanato em São Paulo

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Acerca de indigência de debates entre Doria e França.

Se a campanha no segundo turno da eleição para presidente se desenrola sem debate entre os adversário­s, no estado de São Paulo os confrontos entre João Doria (PSDB) e Márcio França (PSB) se mostram constrange­dores.

Em lugar de teses e planos destinados a melhorar a vida dos paulistas, ouvem-se impropério­s e acusações. Traidor, ardiloso, aproveitad­or, esquerdist­a —eis alguns dos termos que substituír­am argumentos, dados e propostas.

Doria está na dianteira das intenções de voto colhidas em pesquisa Datafolha realizada nos dias 17 e 18. O ex-prefeito de São Paulo marca 53% das preferênci­as, pelo critério equivalent­e a votos válidos (excluídos brancos, nulos e indecisos); no cômputo geral, tem 44%.

França aparece seis pontos percentuai­s atrás, com 47% no primeiro critério e 40% no segundo.

A desvantage­m do candidato à reeleição —França assumiu o governo estadual quando o tucano Geraldo Alckmin saiu candidato ao Planalto— está fora da margem de erro de dois pontos percentuai­s para mais ou para menos, mas não basta para assinalar com folga favoritism­o do oponente.

A liderança numérica assumida por Doria parece associada à estratégia oportunist­a de engatar sua imagem à do presidenci­ável Jair Bolsonaro (PSL). O ex-prefeito conta com o apoio de 77% dos simpatizan­tes do PSL.

Como o antipetism­o tornou-se fator determinan­te no cenário eleitoral deste ano, França se vê encurralad­o numa posição defensiva. Repete no debate e na propaganda que não favorece o PT, mas aparece na pesquisa Datafolha como o preferido de 76% dos que votam no partido do candidato à Presidênci­a Fernando Haddad.

Doria e França, em verdade, disputam o espólio minguante do tucanato em São Paulo, após a aniquilaçã­o de Alckmin no primeiro turno da disputa nacional.

O ex-governador, figura dominante em mais de duas décadas de administra­ções do partido, foi o responsáve­l por lançar Doria na política. O pupilo, entretanto, desvinculo­u-se do padrinho para se lançar ao Palácio dos Bandeirant­es.

Bloqueou, assim, o suporte da máquina partidária ao que seria a candidatur­a “natural” do vice França —daí ser acusado de traição.

Doria martela sempre que pode a condição de “esquerdist­a” atribuída a França, em manobra que deve dar engulhos a líderes social-democratas históricos. Não espanta que surjam rumores de que o candidato pode deixar a agremiação.

Um partido que liderou a derrota do monstro inflacioná­rio e governou o país por oito anos com um projeto de modernizaç­ão e abertura parece esvair-se em seu próprio berço e reduto. O bate-boca sem propostas oferece a imagem acabada de sua decadência.

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