Folha de S.Paulo

Drogas e mortes

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As taxas de homicídios dolosos e de mortes de trânsito no Brasil, é notório, situam o país entre os mais violentos do planeta. No ano passado, registrara­m-se quase 56 mil assassinat­os intenciona­is, ou 27 por 100 mil habitantes. Em 2016, pelo dado mais recente, 38 mil vidas foram ceifadas em ruas e estradas nacionais, cerca de 19 por 100 mil.

Diante dessa carnificin­a cotidiana, deve-se exigir das autoridade­s nada menos que a busca de estratégia­s mais efetivas para a prevenção desses óbitos. Países desenvolvi­dos, já há algumas décadas, passaram a adotar com sucesso políticas públicas ancoradas em evidências empíricas. Nem sempre é o que ocorre por aqui, no entanto.

Tome-se o exemplo da associação entre a ingestão de álcool e o aumento da violência interpesso­al (homicídios e agressões) e dos acidentes de trânsito. Embora a relação esteja bem estabeleci­da na literatura da área, praticamen­te inexistem no país dados sobre o consumo da substância pelas vítimas.

Estudo recente conduzido por pesquisado­res da Faculdade de Medicina da USP e noticiado por esta Folha jogou luz sobre tal questão na cidade de São Paulo.

Os pesquisado­res analisaram amostras de sangue de 365 vítimas de crimes violentos. Constatou-se que em 55% dos casos havia traços de álcool ou outras drogas.

São muitos os fatores que concorrem para um assassinat­o, mas pessoas sob o efeito dessas substância­s estão mais sujeitas a precipitar situações de risco, como brigas ou provocaçõe­s. Terminam, ademais, tendo diminuída a sua capacidade de tomar decisões que as protejam, expondo-se, assim, a cenários de violência.

Não surpreende que o fechamento de bares após certo horário tenha mostrado efeito em situações extremas, como era a de Diadema (SP) no começo dos 2000.

Já entre as vítimas de acidentes de trânsito analisadas no trabalho, chama a atenção o alto percentual de casos (43%) que mostraram resquícios de álcool no sangue.

Embora o país conte há uma década com severa legislação sobre o tema, a taxa indica que o diploma deveria ser mais efetivo em seu propósito. Leis como essa não devem ter a meta de apreender transgress­ores, mas de criar a percepção de que aqueles que a infringire­m serão pegos e punidos.

O estudo deveria servir de exemplo para que o país invista na geração contínua de dados como esses. Assim será possível identifica­r as causas dos problemas, avaliar a efetividad­e das políticas públicas adotadas e orientar a formulação de novas estratégia­s.

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