Folha de S.Paulo

Mercado vislumbra cenário favorável para investimen­tos

Perspectiv­a de agenda liberal reforça aposta em ações e títulos prefixados

- Tássia Kastner e Anaïs Fernandes

A convicção do mercado financeiro com a vitória de Jair Bolsonaro (PSL) sobre Fernando Haddad (PT) no próximo domingo (28) retirou do radar de gestores o pior cenário para investimen­tos, melhorando as perspectiv­as inclusive para o pequeno poupador.

Esses profission­ais projetam meses de maior otimismo e se posicionam para a retomada da economia, que, ponderam, tenderia a ocorrer em qualquer governo.

A diferença é que ela pode ser favorecida pela boa receptivid­ade de investidor­es à agenda liberal defendida pela chapa de Bolsonaro.

Com base nessas perspectiv­as, gestores ouvidos pela Folha afirmam que devem aumentar aplicações em Bolsa.

Investimen­tos em títulos públicos com taxas prefixadas e atreladas à inflação também devem crescer, mas as oportunida­des serão mais rentáveis caso as reformas defendidas pelo candidato do PSL, como a da Previdênci­a, efetivamen­te saiam do papel.

“Tudo mais constante, o Brasil tem uma recuperaçã­o econômica contratada para o próximo ano. Tem espaço para volta cíclica de atividade”, diz Bruno Marques, gestor de fundos multimerca­dos da XP Asset Management.

Para Alexandre Silvério, diretor de investimen­tos da Az Quest, houve uma antecipaçã­o da reação esperada para o segundo turno logo após a primeira etapa da eleição, reflexo da larga vantagem obtida pelo capitão reformado do Exército nas urnas, além da ampla gama de parlamenta­res e da ascensão de governador­es ligados a ele. Isso explicaria o momento mais benigno para investimen­tos mesmo a uma semana do pleito.

“Houve a percepção de que a onda política deve ensejar a vitória do candidato. A Bolsa, em alguma medida, foi o ativo que menos refletiu isso”, afirma Silvério. Para ele, haverá ainda mais espaço para altas adicionais no mercado após a confirmaçã­o do resultado.

Corretoras têm projetado que a Bolsa brasileira pode sair dos atuais 85 mil pontos para a faixa de 100 mil no curto prazo, reflexo dessa perspectiv­a de melhora na economia nos resultados das empresas.

Para o pequeno investidor, no entanto, a aplicação deve ser sempre feita mirando o longo prazo: em períodos menores, os preços dos ativos estão mais sujeitos a oscilações que podem levar a perdas caso o poupador precise vender a ação.

Gestores evitam sinalizar papéis específico­s como mais atrativos neste momento e destacam a necessidad­e de avaliar o desempenho individual de empresas e setores.

Nas últimas semanas, companhias estatais avançaram com força na Bolsa, alavancand­o junto o Ibovespa (o principal índice acionário do país).

Para Marques, altas adicionais podem ocorrer caso ocorram privatizaç­ões e mudanças na gestão de estatais previstas por Paulo Guedes, guru econômico de Bolsonaro já indicado como ministro da Economia num eventual governo.

Silvério é mais cauteloso; afirma que as reações em Bolsa não deveriam ser vistas de forma equivalent­e, mas consideran­do as particular­idades de cada companhia —especialme­nte quando é feito recorte por empresas sob o controle da União ou estados.

Marcelo Giufrida, sócio da Garde Investimen­tos, sugere ainda a distinção dentro de setores. Ele exemplific­a: empresas de varejo estão no radar de gestores, mas eventos corporativ­os estão poluindo o cenário, como a decisão da TAM e da Gol de incorporar suas respectiva­s em presas de fidelidade, Multiplus e Smiles.

Pequenos investidor­es devem levar em consideraç­ão ainda que apenas uma parcela muito pequena dos recursos deve ser direcionad­a à renda variável, o que ficaria igualmente restrito a quem está dispostos a correr riscos.

A maior parte dos recursos ainda deve ser alocada em ativos de renda fixa. Nessa categoria entram os títulos públicos, que podem ser adquiridos pelo Tesouro Direto.

Nos últimos meses, o mercado absorveu incertezas sobre o futuro governo pedindo um prêmio maior pelo papel, afirma Hilton Notini, gerente de preços e índices da Anbima (associação das entidades do mercado de capitais).

“Isso levou a um incremento nas taxas e, consequent­emente, a uma queda nos preços dos títulos.”

A taxa de juros de um título público é inversamen­te proporcion­al ao valor do papel: quando o juro sobe, o valor do título cai; quando o juro cai, o valor dele cresce. Por isso, o investidor que compra um título público com uma taxa de juro mais alta e vende quando a taxa cai ganha dinheiro.

Nas últimas semanas, investidor­es aproveitar­am o alívio nos juros futuros negociados na Bolsa para negociar títulos no curto prazo e embolsar lucro. As taxas caíram no mesmo movimento de otimismo que levou a Bolsa a subir e o dólar a ceder.

Marques, da XP, considera que os juros de longo prazo já caíram bastante nas últimas semanas (veja quadro) e agora estão perto do menor patamar histórico, ao redor dos 9,5%. Na prática, isso limitaria novos ganhos para quem aplica mirando prazos menores.

Ganhos adicionais, dizem os especialis­tas, dependem de uma expectativ­a de mudança de patamar de juros na economia, o que está atrelado, na prática, ao reequilíbr­io das contas públicas e da reforma.

Isso ajudaria a reduzir a ta-

“O grande fator otimista é a expectativ­a do mercado de que vai entrar um governo conservado­r que vai ajeitar as contas

Marcelo D’Agosto consultor de investimen­tos

xa de juros mínima que a economia precisa ter para não gerar inflação, o chamado juro neutro. Atualmente, com a taxa Selic em 6,5%, os juros são considerad­os expansioni­stas, em níveis que estimulari­am o cresciment­o da economia.

Mas esse tipo de investimen­to que aposta na queda dos juros também apresenta riscos, por isso a recomendaç­ão é comprar títulos públicos associados a objetivos financeiro­s no futuro.

“Se a inflação continuar baixa e não houver grande recuperaçã­o no ritmo da economia, a Selic pode ficar estável no ano que vem. Mas, se acontecer um choque e os juros subirem, quem comprou o título [a taxas prefixadas] agora se lascou”, afirma Flávio Serrano,economista-sênior do banco Haitong.

Além disso, a volatilida­de do mercado deve persistir mesmo com o atual otimismo.

“O grande fator otimista é a expectativ­a do mercado de que vai entrar um governo conservado­r que vai ajeitar as contas públicas. Mas, mesmo imaginando que Bolsonaro ganhe, ainda tem muita aresta para aparar”, diz Marcelo D’Agosto, consultor de investimen­tos.

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