Espetáculo celebra voz de louva-a-deus e rebeldia da intérprete
Sesc Pinheiros, r. Paes Leme, 195. De qui. a sáb., às 21h; dom., às 18h. Até 18/11. Ingr.: R$ 15 a R$ 50. 14 anos.
O primeiro impacto de “Elza” é com as vozes das sete atrizescantoras, de timbres diversos, mas compondo um quadro à altura daquela que dá nome à peça. Na apresentação, a própria Elza Soares estava na primeira fileira e ao final saudou suas vozes, elas que choravam quase todas, no palco.
Quadros inteiros do espetáculo falam de sua voz. Como escreve o dramaturgo paulistano Vinícius Calderoni no programa, a peça se passa na garganta de Elza.
Das sete, a mais próxima é a baiana Larissa Luz, convidada especial que está no centro da representação da mítica cantora no palco. Não só pela voz de louva-a-deus, mas pela representação física, os gestos, o retrato da paixão e da revolta. É quem incorpora Elza.
Mas todas o fazem, de um jeito ou de outro, o que é uma das facetas que tornam o espetáculo tão singular na vertente dos musicais biográficos nacionais. As atrizes, que vêm de diversas partes do país, têm todas solos de brilho extravagante. Não reproduzem, mas partem de Elza para viagens individuais.
Para além das vozes e da banda, talvez o impacto maior seja o diálogo que “Elza” alcança com a situação política presente. Muito do que Elza Soares enfrentou não é diferente do que se anuncia agora para o país. A personagem se ergue como mito de rebeldia. A emoção das atrizes no final, diante dela, foi em grande parte derivada do que a cantora representa.
Há momentos em que “Elza” entra no relato linear, biográfico, porque é isso que se tem —sua biografia. A diferença é que, no caso, é uma trilha de obstáculos monumentais e ainda vivos.
E o retrato da mulher negra vai além da superfície política. A relação da personagem com o pai, com Mané Garrincha e com o filho que perde é o fio que puxa a trama, e as tragédias deles são as suas.
É um musical com letras e diálogos emocionalmente carregados. E tudo culmina em duas canções recentes, em apoteose de rebeldia, “A Carne” e “Mulher do Fim do Mundo”, confirmando o que é dito ao longo do texto: Elza renasce todo dia. O que aconteceu era só ensaio para o agora.