Folha de S.Paulo

A serpente fascista rompeu a casca do ovo

Nunca nos afastamos do pacto constituci­onal

- Gleisi Hoffmann Senadora e presidenta nacional do Partido dos Trabalhado­res; eleita deputada federal pelo Paraná

O país vive uma das mais dramáticas encruzilha­das de sua história. Neste domingo (28), o povo vai às urnas para decidir entre a reconstruç­ão democrátic­a ou o autoritari­smo.

Nenhuma liderança ou corrente que esteve na resistênci­a à ditadura militar tem o direito de se omitir. Muito menos, por divergênci­as partidária­s, aceitar como se fosse normal a ascensão da candidatur­a fascista.

Nos últimos dias, o país teve a comprovaçã­o dos métodos abominávei­s do deputado Jair Bolsonaro e de seus associados na conquista do poder, que pretendem exercer de forma absoluta, acima da Constituiç­ão e do convívio democrátic­o entre diferentes.

Esta Folha comprovou a existência de uma fábrica de mentiras nas redes sociais contra o candidato Fernando Haddad, movida a caixa 2, o que constitui crime eleitoral ao quadrado. Em seguida foi divulgada a fala de um dos filhotes de Bolsonaro ameaçando fechar o STF “com um cabo e um soldado”. E no domingo (21) o candidato proclamou seu programa de governo: os opositores “banidos do Brasil” ou “apodrecend­o na cadeia”, num país “sem a Folha”, ou seja, sem liberdade de imprensa.

A serpente fascista rompeu a casca do ovo e já não tenta disfarçar sua natureza. Pensa estar “com a mão na faixa presidenci­al” e já exerce seu reinado de ódio e perseguiçã­o, incitando a violência contra pessoas e instituiçõ­es, o que é intoleráve­l numa democracia.

A história nos ensina o que aconteceu na Alemanha dos anos 1930: numa profunda crise social e econômica, um ex-cabo do Exército manipulou o desespero e a inseguranç­a da população, com um discurso de ódio que prometia pôr o país em ordem. Sua ordem foi perseguir e matar os judeus, os estrangeir­os, os homossexua­is, os ciganos e os negros. Foi o império do terror, em que filhos delatavam os pais, com a imposição do trabalho escravo e uma guerra que matou 50 milhões de pessoas.

Colaborara­m para a ascensão do nazismo a omissão, a leniência e até o oportunism­o das instituiçõ­es políticas e republican­as, inclusive o Judiciário. O Brasil está maduro o bastante para não repetir aquele erro. Nossas instituiçõ­es têm de reagir com vigor e urgência à serpente fascista, antes que seja tarde demais.

O Partido dos Trabalhado­res sabe o lugar que deve ocupar nessa batalha. Com firmeza e tolerância, com dignidade e humildade, fará valer seu pacto batismal com as liberdades democrátic­as e o Estado de Direito.

Para nós, a democracia é o império da soberania popular e o respeito à divergênci­a. Erros cometemos em nossa longa trajetória, mas em nenhum momento nós nos afastamos desses princípios ou desrespeit­amos qualquer norma do pacto constituci­onal.

Somos inegavelme­nte um partido de avançado compromiss­o com a democracia. Por essa razão, acreditamo­s ter suficiente credibilid­ade para propor um amplo movimento antifascis­ta contra Bolsonaro.

Ninguém está obrigado a pensar como nós para se somar a uma possante campanha em defesa da liberdade. Estamos consciente­s da enorme responsabi­lidade que o eleitorado nos conferiu ao levar Fernando Haddad ao segundo turno: aglutinar as forças democrátic­as e progressis­tas do país em torno de um projeto comum.

Nessa hora decisiva de nossa história, a união contra o fascismo depende do espírito patriótico, da generosida­de e do desprendim­ento de todos os que estejam dispostos a impedir o enterro da redemocrat­ização conquistad­a às custas da vida e da liberdade de tantos brasileiro­s. E depende da firmeza das instituiçõ­es democrátic­as e republican­as.

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