Folha de S.Paulo

Tal como o filho, Bolsonaro atacou Supremo na pré-campanha eleitoral

Candidato à Presidênci­a também afirmou que ministros do tribunal legitimam a corrupção

- Rubens Valente

Apenas quatro meses antes de mandar uma carta ao STF nesta segunda-feira (22) pedindo desculpas a respeito de declaraçõe­s de seu filho contra a corte, o próprio candidato Jair Bolsonaro (PSLRJ) disse que os ministros do tribunal estão “legitimand­o a corrupção”, que suas decisões têm “envergonha­do a todos” e sugeriu que não há isenção, mas sim um “péssimo exemplo”, no tribunal.

Afirmou ainda que iria ampliar o número de ministros, de 11 para 21, como forma de “dar um recado” ao Supremo.

As declaraçõe­s do candidato contra os ministros do STF ocorreram em pelo menos dois momentos na pré-campanha eleitoral deste ano, em junho e julho passados, mesma época das declaraçõe­s de seu filho. Em julho, durante uma palestra em um cursinho para candidatos a concursos públicos no Paraná, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) atacou o STF e disse que apenas um soldado e um cabo conseguiri­am fechar o tribunal.

O Painel da Folha revelou que, dez dias antes da palestra, Eduardo proferiu um discurso de enfrentame­nto à corte em uma audiência pública sobre a importânci­a do voto impresso. “Quero ver alguém reclamar quando estiver num momento de ruptura mais doloroso do que colocar dez ministros a mais na Suprema Corte. Se esse momento chegar, quero ver quem vai pra rua fazer manifestaç­ão pelo STF”, concluiu.

Após o vídeo com seu filho ter viralizado neste domingo (21), Bolsonaro desautoriz­ou Eduardo, dizendo que a fala dele era um absurdo, e enviou uma carta de desculpas ao STF. Contudo, entrevista­s anteriores concedidas por Bolsonaro mostram que Eduardo apenas radicalizo­u a imagem negativa que seu pai fez dos ministros do STF.

Apenas dez dias antes da fala do seu filho, durante entrevista ao programa Cidade 190, da TV Cidade de Fortaleza (CE), em 30 de junho, Jair Bolsonaro foi indagado pelo apresentad­or se convidaria o juiz federal da Operação Lava Jato em Curitiba (PR), Sergio Moro, para ocupar vaga no STF.

“Da minha parte, tudo bem, não sei se ele aceitaria integrar essa corte, mas com pessoas do perfil dele a gente muda com toda certeza as decisões do Supremo Tribunal Federal, que lamentavel­mente têm envergonha­do a todos nós.”

Bolsonaro afirmou que pretendia reduzir o número de ministério­s, caso seja eleito, mas no caso do STF ele queria ampliar o número de ministros. Fez várias críticas à atual composição do STF.

“É uma maneira de você botar dez isentos lá dentro. Porque da forma como eles têm decidido as questões nacionais, nós realmente não podemos sequer sonhar em mudar o destino do Brasil. Eles têm poderes para muita coisa, estão decidindo a questão até se nós podemos privatizar alguma coisa sem a participaç­ão do Parlamento ou não.”

Dias depois, em 6 de julho, Bolsonaro voltou a ser questionad­o, em entrevista aos jornalista­s Mariana Godoy e Mauro Tagliaferr­i na RedeTV!, sobre a sua intenção de ampliar o número de ministros.

“A minha proposta de aumentar mais dez: estou dando um recado para o Supremo. Cada um tire as suas conclusões que bem entender. A forma de nós equilibrar­mos o Supremo para que ele aja estritamen­te de acordo com o que reza a nossa Constituiç­ão é botar dez pessoas isentas lá dentro. Com o perfil de quem? De Sergio Moro. É uma proposta minha.”

Indagado por Tagliaferr­i se, ao agir assim, não estaria repetindo o exemplo do ditador Hugo Chávez na Venezuela, Bolsonaro não respondeu.

O candidato enfileirou uma série de críticas ao STF, mencionand­o o ministro Ricardo Lewandowsk­i, que no final de junho concedeu uma decisão liminar segundo a qual uma empresa estatal só poderia ser privatizad­a após aprovação do Congresso Nacional.

A decisão ainda seria analisada pelo plenário do tribunal, mas Bolsonaro partiu para o ataque na entrevista à RedeTV!. “O ministro Lewandowsk­i acabou de dar uma liminar [dizendo] que qualquer privatizaç­ão tem que passar pelo Congresso. Eu entendo que é uma liminar política para atender interesses de companheir­os do PT”, declarou.

“O grande foco onde se criam esses militantes de esquerda são nas estatais, um cabidaço de emprego. O que eu lamento do nosso Supremo Tribunal Federal: eles não podem legislar. Estão legislando. Legislam para tudo lá, praticamen­te. O Conselho Nacional de Justiça também legisla”.

Ele atribuiu ao STF parte da responsabi­lidade pela “situação como está no Brasil”, em referência à inseguranç­a.

“Quem levou a esse estado de coisa? Em parte nós, políticos, e o Supremo Tribunal Federal escancaran­do aí as portas dos presídios para todo mundo sair de lá. Olha o [ex-ministro do PT] José Dirceu, condenado a 30 anos de cadeia, de repente ganhou uma liminar do [ministro Dias] Toffoli, que foi advogado do PT, e inclusive nem tornozelei­ra vai usar. Não sou eu que vou botar [os novos dez ministros], eu vou indicar e o Senado vai ter que aprovar. Se o Senado não topar, amém, vamos continuar com esse Supremo que está aí.”

Procurada, a assessoria de Bolsonaro não havia dado retorno a um pedido de esclarecim­entos sobre o assunto até a conclusão desta edição. A coordenaçã­o política da campanha não foi localizada.

“É uma maneira de você botar dez isentos lá no STF. Porque da forma como eles têm decidido as questões, nós não podemos sequer sonhar em mudar o Brasil. Eles estão decidindo a questão até se nós podemos privatizar alguma coisa

Jair Bolsonaro

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Filipe Cordon/ Folhapress Prefeitos e seus representa­ntes visitam Bolsonaro, no Rio

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