Republicanos moderados perdem espaço na era Trump
Eleições legislativas devem determinar se influência do presidente se manterá
O Partido Republicano não é mais o mesmo. E não é de hoje que as mudanças identificadas por republicanos-raiz, que votam desde sempre em candidatos da legenda, incomodam a ponto de alguns abandonarem o barco.
A tendência vem de 2016, quando Donald Trump foi eleito presidente. Nas primárias pela candidatura republicana, seu estilo virulento e controverso criou divergências dentro do partido.
Nomes proeminentes, como de George H. W. Bush e George W. Bush, os dois únicos ex-presidentes republicanos vivos, não endossaram a candidatura de Trump –Bush pai, inclusive, disse ter votado na democrata Hillary Clinton. O senador John McCain, desafeto de Trump até o fim da vida, foi outro a desaprovar sua escolha como nome do partido.
Parte da divergência de republicanos, na época, ancorava-se justamente nas declarações do então candidato. Sobre os mexicanos, por exemplo, Trump disse que os que entravam nos EUA eram “criminosos, traficantes de drogas, estupradores etc.”.
Dois anos –e muitas controvérsias– depois, o Partido Republicano se tornou o Partido de Trump. “Para melhor ou pior. Para quem se opõe a Trump, não há espaço no partido. Quem se opõe é massacrado”, diz Richard Himelfarb, professor de ciências políticas da Universidade Hofstra e que vota em republicanos desde 1982.
Para John Feffer, diretor do Institute for Policy Studies, Trump atraiu eleitores do espectro mais conservador. “Os mais moderados saem. No momento, essa tendência parece ser irreversível.”
Exemplos do êxodo: Max Boot, assessor político McCain na campanha presidencial de 2008. Recentemente, ele escreveu o livro “The Corrosion of Conservatism: Why I Left the Right” (A corrosão do conservadorismo: por que eu deixei a direita). Também qualificou Trump como “a pior pessoa para ser presidente”.
Ou George Will, comentarista político conservador, que escreveu que Trump era um “triste e embaraçoso arremedo de homem”.
Medidas adotadas pelo presidente também são contestadas. A principal delas é o aceno ao protecionismo –o partido é conhecido pela defesa do livre comércio.
No próximo dia 6 de novembro, o presidente deve passar por uma espécie de referendo nas midterms, as eleições legislativas nas quais os democratas esperam retomar o controle da Câmara dos Deputados e do Senado, hoje controlados pelos republicanos.
Trump tem, como vantagem, sua popularidade invejável. Pesquisa de agosto do Pew Research Center mostrou o presidente com 84% de aprovação entre os republicanos. “A maior parte do eleitorado continua identificado com ele no partido”, diz Robert Shapiro, da Universidade Columbia.
Feffer atribui a popularidade ao fato de o presidente estar conseguindo implementar sua agenda de campanha. A última queda de braço que ele venceu foi a indicação de Brett Kavanaugh à Suprema Corte, mesmo após três mulheres virem a público acusar o juiz de assédio sexual.
Isso explica por que muitos candidatos republicanos querem se associar ao presidente. Entre eles está o senador Ted Cruz, que, nas primárias do partido em 2016, chamou Trump de “mentiroso patológico” e narcisista.
Já Trump colocou em Cruz o apelido de “Ted mentiroso” e disse que era “pior que a Hillary”. Na última segunda-feira (22), ambos apareceram lado a lado no Texas, onde o senador disputa a reeleição.
Em algumas disputas, porém, o endosso do presidente pode se mostrar arriscado. No Kansas, Kris Kobach ganhou a candidatura republicana para o governo depois de uma primária acirrada com o mais moderado Jeff Colyer, atual governador. Mas a corrida contra a democrata Laura Kelly está apertada, e o estado tende a votar em republicanos.
Levantamento da instituição Brookings dos discursos dos republicanos que disputam a Câmara dos Deputados mostra que 37% fizeram menções positivas ao presidente, mas 53% não citaram Trump.
“Metade não achou que era uma boa estratégia se associar a ele”, resume Feffer.
Por outro lado, se o partido tiver bom desempenho nas midterms, Trump pode ver seu poderio reforçado.
“Se Trump continuar ganhando, por que isso mudaria? Os republicanos gostam dele. Não gostam dele como pessoa, mas gostam do que ele está fazendo”, diz Himelfarb.
No longo prazo, porém, as perspectivas não são tão favoráveis. A guinada conservadora, atacando temas como o aborto e acenando ao nacionalismo, afasta os mais jovens.
“A mudança demográfica explica por que Trump perdeu o voto popular. Latinos, asiáticos, negros estão se tornando a maior parte da população, mas vivem em estados democratas. A grande questão é se os republicanos vão manter a Casa Branca em 2020”, diz Shapiro. Ele vê possibilidade de o partido perder o colégio eleitoral em Wisconsin e Michigan, por exemplo.
Feffer estende a possibilidade para o Texas. Ainda assim, descarta uma mudança no partido para recuperar eleitores no curto prazo.
“Não vejo forças no horizonte para trazer o partido de volta ao centro. Meu chute seria que isso vai acontecer se o partido se mover a um ponto mais conservador do que o eleitorado permite e superar o ponto de aceitação do público. E nesse ponto, terá de decidir se entra em colapso como partido.”
Seria algo parecido com o que ocorreu entre 1972 e 1988, quando os democratas precisaram se reinventar após perder quatro de cinco eleições presidenciais –Jimmy Carter, o único presidente do partido no período, deixou um legado de estagnação e inflação.
Para Himelfarb, o aceno democrata à esquerda iniciado por Bernie Sanders em 2016 –o senador perdeu a indicação do partido para Hillary Clinton– deve levar mais eleitores para o lado republicano.
“Há algo que poderia salvar os republicanos: que o outro partido se mova para posições extremistas”, diz.