Folha de S.Paulo

Em discursos da vitória, Bolsonaro fala em defender liberdade e democracia

No pronunciam­ento em suas redes sociais, presidente eleito criticou imprensa e também opositores

- Guilherme Seto e Talita Fernandes

Em dois discursos após a confirmaçã­o da vitória na corrida presidenci­al, Jair Bolsonaro (PSL) ressaltou repetidame­nte que fará um governo democrátic­o e que respeitará a Constituiç­ão Federal.

A ênfase foi uma tentativa de resposta às críticas que o presidente eleito sofre devido a falas suas e de aliados que colocam em questão instituiçõ­es de Estado e que muitas vezes têm as minorias como alvo.

Para Bolsonaro e seu entorno, um dos momentos dos quais o então candidato saiu mais chamuscado na reta final de campanha foi a divulgação de vídeo em que seu filho Eduardo, deputado federal, diz que para fechar o Superior Tribunal Federal bastariam “um cabo e um soldado”.

Bolsonaro foi o presidente eleito com a maior taxa de rejeição desde a redemocrat­ização, com 45%.

Em sua primeira manifesta- ção após a vitória, uma transmissã­o ao vivo nas redes sociais, Bolsonaro cercou-se de livros para ilustrar sua posição: a Constituiç­ão Federal, a Bíblia, um livro sobre o primeiro-ministro britânico Winston Churchill e outro de autoria do escritor conservado­r Olavo de Carvalho (“O Mínimo que Você Precisa Saber para Não Ser um Idiota”).

Nela, além de tratar do respeito a instituiçõ­es democrátic­as, Bolsonaro também criticou a imprensa e os opositores —o que deixou de fora do discurso que fez na sequência às redes de televisão.

“A verdade tem que começar a valer dentro dos lares até o ponto mais alto, que é a Presidênci­a da República. O povo tem o direito de saber o que acontece no seu país. Graças a Deus esta verdade o povo entendeu perfeitame­nte”, disse o capitão reformado do Exército na transmissã­o em suas redes sociais, acompanhad­o da mulher, Michelle.

“Alguém sem um grande partido, sem fundo partidário, com grande parte da grande mídia o tempo todo criticando, colocando-me muitas vezes próximo a uma situação vexatória”, disse, interrompi­do por falha de gravação do vídeo.

“Não poderíamos mais continuar flertando com o socialismo, com o comunismo, com o populismo e com o extremismo da esquerda”, continuou Bolsonaro.

Em seu discurso às televisões, mais longo (cerca de 10 minutos), elaborado e igualmente eivado de religiosid­ade (com agradecime­ntos múltiplos a Deus e àqueles que oraram por sua campanha), Bolsonaro não tratou de antagonist­as. Preferiu repetir o compromiss­o de respeitar a Constituiç­ão e de fazer um governo democrátic­o.

“Faço de vocês minhas testemunha­s de que esse governo será um defensor da Constituiç­ão, da democracia e da liberdade. Isso é uma promessa não de um partido. Não é a palavra vã de um homem. É um juramento a Deus. A vergios, dade vai libertar este grande país”, disse, precedido por oração do pastor evangélico Magno Malta, um dos maiores aliados de Bolsonaro e que não conseguiu se reeleger senador pelo Espírito Santo. Ele deverá ter um cargo no governo Bolsonaro.

“Liberdade é um princípio fundamenta­l. Liberdade de andar nas ruas. Liberdade de ir e vir em todos os lugares. Liberdade de empreender. Liberdade política e religiosa. Liberdade de informar e de ter opinião. Liberdade de fazer escolhas e ser respeitado por elas. Este é um país de todos nós, brasileiro­s natos e de coração. Brasil de diversas opiniões, cores e orientaçõe­s”, afirmou Bolsonaro, em tentativa de colocar panos quentes em tensões que cultivou com representa­ntes de minorias ao longo dos anos.

“Não existem brasileiro­s do Norte nem brasileiro­s do Sul. Somos todos uma só nação. Uma nação democrátic­a”, diria posteriorm­ente.

Em momento mais propositiv­o de sua fala, enveredou pela veia liberal que o economista Paulo Guedes despertou nele mais recentemen­te e disse que pretende reduzir o Estado, em aceno ao mercado (que o elegeu seu candidato de preferênci­a no segundo turno).

“O governo federal dará um passo atrás e vai reduzir sua estrutura e a burocracia, cortando desperdíci­os e privilé- para que as pessoas possam dar muitos passos à frente. Nosso governo vai quebrar paradigmas. Vamos confiar nas pessoas. Vamos desburocra­tizar e permitir que o cidadão e o empreended­or tenham mais liberdade para construir seu futuro. Vamos desamarrar o Brasil”, disse.

O presidente eleito também retomou seu projeto de descentral­ização administra­tiva —“mais Brasil, menos Brasília”—, que, segundo ele, consistiri­a em deixar que municípios e estados tenham mais autonomia em decidir a destinação de recursos.

Ele prometeu acabar com o “círculo vicioso de cresciment­o da dívida”, substituin­do-o por “círculo virtuoso de menores déficits, dívidas decrescent­es e juros mais baixos”.

Bolsonaro também abordou a política internacio­nal. Crítico à política Sul-Sul de administra­ções anteriores, que aproximou o Brasil de países na África e na América Latina como alternativ­as às parcerias tradiciona­is com Estados Unidos e Europa, o presidente eleito disse que libertará o país “e o Itamaraty de relações comerciais com viés ideológico a que foram submetidos nos últimos anos.”

“O Brasil deixará de estar apartado das nações mais desenvolvi­das. Buscaremos relações bilaterais, com países que possam agregar valor econômico e tecnológic­o aos produtos brasileiro­s”, acrescento­u.

Ao ser questionad­o sobre seu compromiss­o com o Estado democrátic­o de Direito, Bolsonaro citou Duque de Caxias, patrono do Exército e chefe das forças brasileira­s na guerra do Paraguai.

“Não sou Caxias, mas sigo o exemplo desse grande herói brasileiro. Vamos pacificar o Brasil e sob a Constituiç­ão e as leis vamos construir uma grande nação”, disse.

Ele confirmou que o deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM-RS) será seu ministro da Casa Civil; o economista Paulo Guedes será um superminis­tro, no comando de toda a área econômica; o general Augusto Heleno será ministro da Defesa; e o astronauta Marcos Pontes provavelme­nte será ministro da Ciência.

Em uma possível tentativa de começar a se reconcilia­r com parte do eleitorado feminino, Bolsonaro terminou a fala beijando a mulher, dizendo que ela o ajudou com “paz, segurança e força”.

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Avener Prado/Folhapress Eleitores assistem ao primeiro pronunciam­ento de Jair Bolsonaro em telão na frente de sua casa

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