Folha de S.Paulo

Brancos e nulos somam 9,6%, índice recorde em 2º turno pós-ditadura

- Marco Rodrigo Almeida

Brancos e nulos somaram 9,6% do total de votos no segundo turno da eleição presidenci­al deste ano, o maior índice já registrado no país desde o fim da ditadura militar. A abstenção chegou a 21,30%, índice similar ao dos últimos anos.

Após a redemocrat­ização, seis disputas presidenci­ais foram realizadas em dois turnos —as exceções foram as de 1994 e 1998, ambas vencidas por Fernando Henrique Cardoso na primeira fase.

Nas outras disputas em duas etapas (1989, 2002, 2006, 2010, 2014), a soma dos chamados votos inválidos sempre ficou na casa dos 6%.

Pesquisa Datafolha divulgada no sábado (27) já indicava que fatia expressiva do eleitorado iria às urnas sem optar por nenhum candidato. Os brancos, nulos e indecisos, de acordo com o instituto, chegavam a 13%, o maior índice para uma medicação às vésperas da eleição — em segundos turnos de eleições anteriores esse número chegou no máximo a 10%.

Os votos brancos neste segundo turno representa­ram 2,1%, número similar ao de anos anteriores. De 1989 para cá, o recorde de brancos foi registrado no segundo turno de 2010, 2,3% do total.

O salto nos inválidos desta vez deveu-se ao cresciment­o expressivo dos votos nulos. Eles chegaram a 7,4%, contra uma faixa de 4% nas corridas eleitorais passadas.

Até este ano, a maior taxa de voto nulo desde o fim da ditadura havia sido registrada no segundo turno de 2006, com 4,7% do total.

Pesquisas no campo das ciências sociais indicam que sobretudo o voto nulo representa um sentimento de ceticismo e protesto.

“Grande parte do eleitorado não aceitou nenhum dos dois candidatos”, resume Fernando Abrucio, cientista político e professor da Fundação Getulio Vargas.

Brancos, nulos e abstenções representa­m cerca de 41 milhões de eleitores.

“Mesmo havendo na disputa um candidato que se apresenta como antissiste­ma, como Jair Bolsonaro (PSL), grande parcela do eleitorado demonstrou rejeitar as opções oferecidas. Depois de tantos episódios traumático­s no país, o eleitor ainda não fez as pazes com a política”, diz o professor.

Ele argumenta que o quadro de sucessivos tormentos no Brasil desde 2014 —inúmeros casos de corrupção revelados pela Lava Jato, recessão, impeachmen­t de Dilma Rousseff (PT), alta impopulari­dade de Michel Temer (MDB)— levaram a um sentimento de descrédito pela política tradiciona­l que ainda não cicatrizou.

“Até por isso, será gigantesca a tarefa que Bolsonaro terá pela frente. Não apenas recuperar a economia do país, mas também reconectar a sociedade com a política, reabilitar a política aos olhos do cidadão comum. Isso exigirá muito mais moderação do que ele demonstrou até agora”, avalia Abrucio.

Bolsonaro venceu a eleição com 55% dos votos válidos, mais do que Dilma registrou em 2014 (51,6%), mas menos que Lula (61,7% em 2002 e 60,8% em 2006) e um pouco abaixo de Dilma em 2010 (56%).

No primeiro turno deste ano, brancos e nulos somaram 8,8% —menos que os 9,64% da primeira etapa de 2014 e muito próximos dos resultados de 2006 e 2010.

Pesquisado­res apostavam em um número maior, e as primeiras pesquisas da corrida presidenci­al pareciam corroborar essa ideia — Datafolha apontou 22% em agosto. O clima de forte polarizaçã­o, porém, parece ter levado o eleitor descontent­e a aderir a alguma candidatur­a na tentativa de evitar um mal que julgava maior.

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