Folha de S.Paulo

Brasil terá um capitão na Presidênci­a pela primeira vez

Outro ineditismo é vitória de candidato que sofreu atentado na campanha

- Naief Haddad

Jair Messias Bolsonaro, 63, será a 42ª pessoa a assumir a Presidênci­a desde a Proclamaçã­o da República, em 1889.

O deputado federal pelo PSL (Partido Social Liberal) será ainda o 16º militar a ocupar o cargo, contabilid­ade que inclui as duas juntas provisória­s que comandaram o país por períodos curtos.

A primeira junta, de 1930, teve dois generais e um almirante. A segunda, de 1969, foi formada por um general, um almirante e um brigadeiro.

Portanto, entre todos aqueles que estiveram no mais alto posto da República brasileira, 38% eram militares.

Em meio aos nomes das Forças Armadas que ocuparam a Presidênci­a, a eleição de Bolsonaro representa um fato inédito. É o primeiro capitão reformado a ocupar o cargo.

Desde o marechal Deodoro da Fonseca, em 1889, eram todos oficiais de alta patente, como generais, almirantes e brigadeiro­s. No Exército, capitão é uma patente de oficial intermediá­rio.

Em 1988, Bolsonaro se afastou das atividades militares e foi para a reserva —não é considerad­o um ex-militar. Neste mesmo ano, ele foi eleito vereador no Rio de Janeiro.

O historiado­r Daniel Aarão Reis, professor da Universida­de Federal Fluminense (UFF) e autor de “Ditadura e Democracia no Brasil”, recorda-se de um outro capitão que se notabilizo­u na história da política brasileira.

Curiosamen­te, é Luís Carlos Prestes, um dos expoentes, ao longo do século 20, da esquerda brasileira, ideologia enfaticame­nte criticada por Bolsonaro.

Prestes, no entanto, jamais se candidatou à Presidênci­a. Depois do fim do Estado Novo, foi eleito senador pelo PCB (Partido Comunista do Brasil), cargo que exerceu entre 1946 e 1948.

A chegada de Bolsonaro ao Palácio do Planalto representa outros ineditismo­s.

O deputado federal é o primeiro presidente eleito a ter sofrido um atentado ao longo da campanha. No último dia 6 de setembro, ele levou uma facada durante um ato em Juiz de Fora (MG).

Há 103 anos, em setembro de 1915, um atentado chocou o país. O senador gaúcho Pinheiro Machado foi assassinad­o com uma punhalada pelas costas em um hotel luxuoso no Rio. Embora muito influente, o político não era candidato à Presidênci­a da República.

De acordo com Heloisa Starling, professora de história da UFMG (Universida­de Federal de Minas Gerais), o atentado favoreceu a candidatur­a de Bolsonaro. “Ele saiu de cena [deixou a campanha nas ruas], mas manteve grande visibilida­de na mídia. Além disso, usou o fato para não participar dos debates agendados para as semanas seguintes”, diz a professora, co-autora de “Brasil: uma Biografia”.

Segundo Starling, o capitão reformado traz consigo outra marca inédita: é o primeiro nome da extrema direita a alcançar o cargo máximo do país.

“Jânio Quadros [janeiro a agosto de 1961] e Fernando Collor [1990-1992] eram profundame­nte conservado­res, mas é uma injustiça compará-los ao Bolsonaro. Nenhum deles incitava a violência, a intolerânc­ia”, afirma ela.

Estão de acordo com Starling historiado­res como Aarão Reis e Claudia Viscardi, professora de história da Universida­de Federal de Juiz de Fora (UFJF).

“Os políticos brasileiro­s sempre tiveram uma tradição de moderação. Depois da proclamaçã­o da República, nunca houve um candidato à Presidênci­a que se apresentas­se à população de modo tão extremado”, diz o professor Aarão Reis.

O historiado­r Jorge Caldeira, por outro lado, prefere não estabelece­r gradações no espectro da direita. “O mandato de Bolsonaro é que vai dizer se ele é, de fato, um político de extrema direita”, afirma.

Autor de “101 Brasileiro­s que fizeram História” e “História da Riqueza no Brasil”, Caldeira lembra que o deputado do PSL é apenas o quarto presidente a ser eleito no Brasil sem o incentivo do mandatário em exercício. O presidente Michel Temer não apoiou Jair Bolsonaro.

Antes dele, só conseguira­m essa proeza Jânio Quadros, em 1961, Fernando Collor de Mello, em 1989, e Luiz Inácio Lula da Silva, em sua primeira vitória, em 2002.

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