Governador eleito de SP atropela aliados e vira cacique tucano
Ao negar a política, empresário adotou estilo midiático na prefeitura; ele apostou alto e herdará espólio do PSDB
Em dois anos acelerados, o empresário João Doria virou prefeito da maior capital do país, tentou ser candidato a presidente e renunciou à prefeitura para disputar a vaga de governador paulista. Ao vencer, se firma como o principal herdeiro do espólio de um PSDB arrasado.
Para chegar onde está, Doria atropelou inimigos e até aliados, o que incluiu seu padrinho político, o ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB). Vitorioso, trabalhará para assumir o controle do partido, isolando Alckmin e outros velhos caciques tucanos.
Doria deve se aliar a Jair Bolsonaro (PSL), arrastar o PSDB à direita e se cercar de uma nova geração de tucanos.
Ao longo da campanha para o governo, Doria se descolou de Alckmin e tentou colar sua imagem à de Bolsonaro. No primeiro turno, veladamente; e depois, na segunda etapa, passou a andar por aí vestido com a camisa Bolsodoria, em uma junção dos nomes dos dois candidatos.
O contido Alckmin chegou a estourar durante uma reunião do tucanato, em que insinuou que Doria era traidor.
O gesto marcou o rompimento que já vinha se anunciando desde que o tucano assumiu a prefeitura paulistana.
Além de Alckmin, ao menos quatro ex-secretários da gestão de Doria hoje são fortes críticos ao estilo dele. A relação com o hoje prefeito Bruno Covas (PSDB) também chegou a estremecer, após Doria demiti-lo da pasta de Prefeituras Regionais.
Um dos motivos da contrariedade de aliados foi a obsessão, enquanto Doria era prefeito, em criar vitrines políticas relâmpago. O objetivo era tomar o lugar de Alckmin como candidato à Presidência do partido, o que acabou abortado após ele não decolar nas pesquisas, apesar das inúmeras viagens que Doria promoveu para autodivulgação.
Pouco tempo antes, o então governador havia bancado a candidatura de Doria a prefeito de São Paulo contra o desejo dos demais caciques do PSDB. Doria venceu, mas o partido saiu rachado.
Vestido de gari, Doria transformou a prefeitura num reality show, em que obrigava o secretariado a usar uniformes e varrer as ruas. Apesar disso, a zeladoria piorou na sua gestão.
Outras vitrines também se estilhaçariam —literalmente, no caso de muro de vidro colocado na USP. Doria chegou a declarar o fim da cracolândia em uma ação, mas pouco avançou em relação ao problema.
A principal marca do primeiro ano de Doria foi o programa Corujão da Saúde — que prevê a contratação de exames da iniciativa privada, com objetivo de diminuir a fila de espera.
Após declarar a fila zerada no início do programa, a demanda de exames voltou a crescer. Além disso, de acordo com o TCM (Tribunal de Contas do Município), ele cumpriu promessa realizar exames em no máximo 60 dias.
Posteriormente, Doria passaria a investir todas as fichas —e R$ 550 milhões—em um programa de grande visibilidade de pavimentação de ruas, o Asfalto Novo. Só para propagandear o projeto às vésperas da eleição para o governo, ele gastaria mais quase R$ 30 milhões.
A gestão de Doria também foi marcada por escândalo de corrupção em licitação bilionária da iluminação, caso em que Doria se tornou réu.
Recentemente, foi condenado em primeira instância à perda dos direitos políticos em outra ação, por improbidade administrativa. Neste caso, a acusação sustenta que o tucano usou o slogan “SP Cidade Linda”, de um programa de zeladoria, para promover a própria imagem. Ele ainda responde a outras ações.
Doria abandonou a prefeitura 1.000 dias antes do fim do mandato, longe de completar as metas e com alta rejeição na capital paulista.
O empresário é casado com a artista plástica Bia Doria, com quem teve três filhos. Com patrimônio declarado de R$ 189 milhões, Doria se ergueu no setor privado e se tornou conhecido pela atuação no Lide (Grupo de Líderes Empresariais), organização com mais de 1.700 associados que promove encontros com lideranças empresariais e políticas.
Ele ficou famoso como apresentador de TV —na Record, comandou reality show O Aprendiz nas temporadas de 2010 e 2011. Antes, nos anos 80, foi presidente da Paulistur, estatal de turismo, na prefeitura de Mario Covas. Também atuou na Embratur no governo de José Sarney (MDB).
“É o voto do coração. Quem ama o Brasil votou certo. E quem não ama muito, não tem problema, nós vamos governar para eles também João Doria (PSDB) em seu discurso de agradecimento após vitória no Governo de São Paulo