Novatos e baixo clero
Bolsonaro diz que governará sem os métodos da velha política
Fechadas as urnas do segundo turno, é hora de olhar para a frente. Concordemos com o resultado ou não, a vontade da maioria dos eleitores deve ser respeitada e cabe a todos nós monitorar cada passo do novo presidente, dos senadores, dos deputados federais e dos governadores dos estados.
A democracia não se realiza apenas no momento da votação. Ela deve ser encarada como um exercício diário de fiscalização de quem exerce o poder. O que esperar, então, deste governo Bolsonaro que se descortina diante de nós? Passado o calor da eleição, como se comportará o novo presidente frente a um Congresso renovado?
Eu arrisco dizer que se trata de um governo dominado por novatos e inexperientes, pouco habituados ao pesado jogo político nacional.
Para começo de conversa, Bolsonaro é, ele próprio, virgem em matéria administrativa — afinal, nunca ocupou um cargo no Executivo ao longo de sua vida pública. No Legislativo, apesar de exercer sete mandatos consecutivos como deputado federal, sempre atuou nas franjas do sistema, sem ocupar cargos de liderança ou exercer o comando de comissões importantes. Ele tampouco relatou ou aprovou matérias relevantes para o país. Sempre foi um parlamentar do chamado baixo clero.
Apesar de sua bem-sucedida carreira no mercado financeiro, Paulo Guedes— escolhido para comandar a economia—não tem passagens anteriores pelo governo.
Onix Lorenzoni, futuro ministro da Casa Civil, nunca foi membro da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e os postos mais altos que ocupou no Parlamento foram a liderança do DEM em 2007 e a presidência da Comissão de Agricultura e Pecuária em 2008. É muito pouco para quem terá a missão de comandar as relações entre Executivo e Legislativo no próximo governo.
Além disso, a ideia de nomear membros das Forças Armadas para postos chave no ministério e nas estatais indica que Bolsonaro não pretende contar com tecnocratas ou políticos experientes na condução do dia-a-dia do governo.
Alguns veem isso uma inovação em relação ao passado. Outros enxergam riscos à frente. A aposta numa completa reformulação da estrutura administrativa do governo (reduzindo os 29 ministérios atuais para 15) sendo comandada porministrosinexperientespode imputar ao governo Bolsonaro uma paralisia, que seria fatal diante dos imensos desafios impostos pela grave crise fiscal que atravessamos.
É óbvio que, com o apoio do Centrão, Bolsonaro deve conseguir uma boa base de apoio no Congresso, além de gozar de ampla popularidade que lhe garantirão aquela tradicional lua de mel de início de governo.
A grande questão é saber como ele se comportará quando essa fase passar. Dará poder cada vez maior aos novatos do PSL e a membros arrebanhados nas bancadas ruralista, evangélica e da segurança pública? Vai recorrer aos grandes caciques que sobreviveram à guilhotina popular (Renan, Rodrigo Maia, Jader Barbalho, Aécio Neves)? Ou exercerá um governo plebiscitário, fazendo ligação direta com a população, contando como o trunfo de ter as Forças Armadas consigo?
Bolsonaro recebeu a maioria dos votos dos brasileiros que buscam uma nova forma de fazer política e anuncia que vai governar sem os métodos e representantes da velha política. O futuro é incerto e precisamos ficar de olho.