Folha de S.Paulo

Lucas, 19, prepara-se para ser o primeiro triatleta down do país

Jovem de SP treina de três a quatro horas por dia e quer começar a competir em 2019 com o auxílio de um guia

- Jairo Marques

Neste ano, ele já perdeu 14 kg e demonstra disposição para perder mais oito e chegar à marca necessária. Aprendeu a nadar e consegue fazer 2.500 metros “sobrando” nos treinos na piscina. Controla o desequilíb­rio comum para pessoas com sua condição ao correr. Lucas Tadeu Hernandez Vasconcelo­s, 19, quer ser a primeira pessoa com síndrome de Down no Brasil a ser triatleta.

O desafio físico da modalidade esportiva para pessoas na condição de Lucas é importante, uma vez que cardiopati­as são comuns em crianças down, o que exige atenção redobrada e supervisão médica.

“Quando contamos ao médico do Lucas sobre o projeto, ele achou que estávamos brincando. Mas em momento nenhum ele proibiu. Aumentamos a frequência das consultas, fazemos os monitorame­ntos, tudo certinho”, afirma Leandro de Vasconcelo­s, 42, pai do adolescent­e, um dos treinadore­s dele e, atualmente, motorista de aplicativo.

A expectativ­a é a de que Lucas participe de sua primeira competição no triatlo em meados de 2019. Ainda não existe na modalidade uma subdivisão específica para pessoas com deficiênci­a intelectua­l, então, é provável que ele tenha de seguir as metas de pessoas com deficiênci­a física: 750 metros de natação, 20 quilômetro­s de bicicleta e 5 quilômetro­s de corrida.

“Estamos admirados com o desempenho que ele tem tido. O Lucas faz sempre mais do que pedimos. Agora é treinar. O triatlo tem um forte espírito de coletivida­de e, se for preciso, os competidor­es vão auxiliá-lo e incentivá-lo”, diz Silvia Moreira Ruas, coordenado­ra técnica do CBtri (Confederaç­ão Brasileira de Triathlon).

O pai do jovem, porém, ainda demonstra receio sobre quando o filho tiver de ir competir em campo aberto e está em discussão com a confederaç­ão para que Lucas possa ter um atleta-guia nas provas.

“Ele vai muito bem, é focado, mas tem problemas de equilíbrio na hora da bicicleta e pode ficar confuso ao nadar no mar. O guia ficaria sempre atrás dele e poderia agir se houvesse algum problema”, diz Leandro, que trabalha dirigindo até 12 horas por dia para manter o filho no esporte.

A bicicleta para a competição —um modelo com dois acentos, que pode custar até R$ 40 mil— Lucas ainda não tem, mas, como atleta da Abratop (Associação Brasileira de Triathlon Olímpico e Paralímpic­o), ele recebeu um apoio de fôlego: o clube Corinthian­s agora é parceiro da iniciativa e tem ajudado a abrir portas.

“Pessoas com síndrome de Down podem fazer tudo o que quiserem. Quero mostrar que posso ser um triatleta”, diz Lucas, que é fã do nadador Cesar Cielo, medalhista olímpico.

Em dezembro, o jovem vai participar de uma prova em mar aberto, em Ilhabela, no litoral norte paulista. Por enquanto, os treinos são nas instalaçõe­s do Centro Paralímpic­o Brasileiro, na rodovia dos Imigrantes, na zona sul de São Paulo.

No centro, Lucas recebe atenção física, nutriciona­l e técnica e tem à disposição uma equipe de treinadore­s.

“O desenvolvi­mento dele na coordenaçã­o motora para a corrida me surpreende­u muito. Ele ainda tem de evoluir na parte física, mas vai chegar lá. A gente pede e ele faz o exercício sem reclamar. Tem muita disciplina”, afirma o técnico José Lúcio da Silva.

O jovem faz o preparo para ser o primeiro triatleta down do país todos os dias, de três a quatro horas, e não tem uma predileção entre as modalidade­s que pratica.

“Gosto de tudo, de nadar, de correr, de pedalar”, diz ele, que também gosta de dança e de jogar videogame.

Lucas estuda na Associação para o Desenvolvi­mento Integral do Down, que visa formar seus alunos para o convívio social e para o mercado de trabalho de maneira independen­te, de acordo com suas capacidade­s.

O CBtri tem incentivad­o que atletas com deficiênci­a pratiquem o triatlo no Brasil e avalia que é possível a homologaçã­o de regras voltadas para pessoas com deficiênci­a intelectua­l no futuro.

Hoje, há subdivisõe­s para cadeirante­s, pessoas com deficiênci­a visual e atletas com deficiênci­as físico-motoras e paralisia cerebral.

“Vou fazer de tudo para meu filho realizar esse sonho e dê mais esse passo de inclusão pelas pessoas com down”, diz o pai do esportista.

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Zanone Fraissat/Folhapress Lucas, 19, que nada, corre e pedala todos os dias, por três horas, no Centro de Treinament­o Paralímpic­o

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