Folha de S.Paulo

Primeiro homem trans a fazer cirurgia de redesignaç­ão no país

JOÃO W. NERY (1950-2018)

- Ricardo Hiar coluna.obituario@grupofolha.com.br

Apesar de sempre ser tratado como referência na luta por respeito e reconhecim­ento entre os transexuai­s, João Nery não queria ser visto como um herói. Como ele próprio dizia, tudo o que fez e enfrentou aconteceu por uma necessidad­e. “Não me arrependo do que fiz em nada em minha vida e faria tudo de novo, mas não foi uma questão de coragem”, disse em entrevista nas redes sociais.

A menina nascida na Rio de Janeiro no início da década de 1950 existia apenas nos traços físicos, porque, segundo ele, quem sempre esteve no interior era o João, identidade que só ganhou forma aos 27 anos. Em plena ditadura militar e contrarian­do a lei, que tratava o procedimen­to como mutilação, Nery foi o primeiro homem trans no Brasil a se submeter a uma cirurgia de redesignaç­ão sexual.

Antes da cirurgia ele chegou a usar duas identidade­s: era a Joana para amigos próximos e familiares, mas aproveitav­a a moda unissex para mostrar quem ele realmente se sentia.

A intervençã­o cirúrgica, feita de forma clandestin­a, custou a ele a proibição de exercer a profissão de psicólogo, na qual se formara ainda quando vivia como mulher. O homem nascido quase aos 30 ficou sem emprego e precisou começar do zero. Para sobreviver, João trabalhou de pedreiro, pintor, taxista. Segundo amigos próximos, ele não cansou de se reinventar.

Foi casado por quatro vezes e teve a oportunida­de de experiment­ar a paternidad­e no terceiro relacionam­ento.

Além da publicação de livros que levantaram bandeiras na luta LGBT, como “Viagem Solitária”, João ajudava pessoas que enfrentava­m dificuldad­es como as suas. Nas redes sociais,ajudava homens trans para a tirar dúvidas e enfrentar barreiras.

Assim como ocorreu para fazer a cirurgia de resignação de sexo, ele desafiou as leis vigentes do país para ter um nome masculino e criou um segundo documento quando passou a se chamar João.

Hoje transexuai­s já podem usar o nome social no Brasil, e João Nery dá nome a um projeto de lei, em tramitação na Câmara, para permitir a ação sem a necessidad­e da intervençã­o judicial. A proposta dos deputados Jean Wyllys (PSOL) e Érika Kokay (PT) aguarda pareceres.

João não teve tempo de ver a lei em vigor. Em setembro ele publicou um depoimento pedindo para seus seguidores se prepararem porque um câncer no pulmão contra o qual lutava havia se espalhado e chegado ao cérebro. Na ocasião, pediu para que não desistisse­m de suas lutas.

Ele morreu em decorrênci­a da doença no dia 26 de outubro, aos 68 anos. Deixa a esposa, Sheila, e o filho.

WILMAN PAZINATO Aos 87, solteira. Sábado (27/10) às 12h30. Cemitério de Congonhas, r. Min. Álvaro de Sousa Lima, 101, Vila Sofia, SP

7º DIA

MARIA CECÍLIA PENTEADO FIGUEIRA DE MELLO Nesta terça (30/10) às 19h, Igreja

São Domingos, Rua Caiubí 164, Perdizes, SP

22º ANO

ALEXANDRE MAGALHÃES VAZ DE MELLO Nesta quarta (31/10) às 19h, Igreja São João Evangelist­a, rua do Ouro, 1.050, Serra, Belo Horizonte

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