Folha de S.Paulo

Xingado de burro por Caetano, jornalista que virou meme terá sua obra resgatada

- Eduardo Moura Arquivo Pessoal

Morto em 2009, o jornalista Geraldo Mayrink teve uma carreira produtiva. Entrevisto­u Garrincha, Elis Regina, Glauber Rocha e Tom Jobim. Perfilou Frank Sinatra e Billy Wilder. Biografou Juscelino Kubitschek, Jorge Amado e Vinicius de Moraes.

Em caixas, deixou cerca de 1.500 artigos, reportagen­s, entrevista­s, críticas, crônicas e ensaios —alguns nunca publicados—, que virão a público no próximo ano.

Gustavo Mayrink, filho do jornalista, catalogou os textos escritos pelo pai ao longo da carreira, entre 1961 e 2009, e vai disponibil­izá-los em um site, gratuitame­nte, em 2019. Também prepara um livro e um documentár­io.

“Meu pai virou meme depois de morto, e isso se sobrepôs ao legado jornalísti­co dele, o que foi muito triste na época.

O viral tem origem em 2012, quando a TV Cultura divulgou no YouTube um episódio de 1978 do programa Vox Populi, em que Caetano Veloso respondia a perguntas de várias pessoas, Mayrink entre elas.

“Caetano, quem são verdadeira­mente seus inimigos? Por que você fala tanto em patrulha?”.

A resposta do cantor a internet já conhece: “Você é burro, cara, que loucura, como você é burro. Que coisa absurda. Isso aí que você disse é tudo burrice. Eu não consigo gravar muito bem o que você falou, porque você fala de uma maneira burra. Você é mais burro ainda do que parece, entendeu? Você é um ignorante”.

A pergunta tinha a ver com uma declaração de Cacá Diegues, que usava o termo “patrulha ideológica” para designar quem criticava trabalhos artísticos que não tinham um caráter político.

Mas é improvável que Mayrink tenha perdido o sono pela resposta atravessad­a.

“Ser ofendido por Caetano é uma glória. Eu mesmo já fui e achei ótimo”, diz Ruy Castro, colunista da Folha, que foi colega de Mayrink no Grupo Bloch e na Playboy.

“Ele era muito engraçado na vida real e escrevia estupidame­nte bem. Seus textos eram sólidos, bem fundamenta­dos e redondos”, conta.

Já o jornalista Sergio Augusto conheceu Mayrink no Jornal do Brasil, onde os dois trabalhara­m numa equipe que tinha ainda Fernando Gabeira e Adauto Novaes.

“Nunca vi uma pessoa escrever com tanta facilidade”, diz Sergio sobre Mayrink, que chegou a assinar críticas de cinema sob o pseudônimo Lucas Gotardo, em referência a Jean-Luc Godard.

A ideia de compilar o trabalho do pai começou a surgir quando ele ainda estava vivo. A homenagem, diz Gustavo, será uma forma de mostrar um tipo de jornalismo que se pratica cada vez menos.

“Acompanhei de perto a descrença dele com o futuro do jornalismo”, diz.

 ??  ?? O jornalista Geraldo Mayrink (à dir.) e o escritor Jorge Amado
O jornalista Geraldo Mayrink (à dir.) e o escritor Jorge Amado

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil