Folha de S.Paulo

Quanto mais volátil, maior o risco

Investimen­to mais rentável, sem maior risco associado? Não existe

- Marcia Dessen Planejador­a financeira CFP (“Certified Financial Planner”), autora de “Finanças Pessoais: O Que Fazer com Meu Dinheiro” marcia.dessen@gmail.com

Volatilida­de é uma medida estatístic­a da dispersão do retorno de determinad­o ativo ou índice de mercado. Em outras palavras, a flutuação dos preços para cima e para baixo. Aqui entre nós, não temos nenhum problema com as flutuações “para cima”. O problema é quando os preços flutuam “para baixo”.

Aprendemos, com as finanças comportame­ntais, que a dor das perdas, assim percebidas as flutuações negativas, é muito maior do que o prazer dos ganhos, assim percebidas as flutuações positivas.

Interessan­te lembrar que a mera flutuação do preço não representa efetivamen­te uma perda ou ganho, que só se materializ­a quando decidimos vender, sair da posição. Curiosamen­te, tendemos a realizar o prejuízo, com receio de perder mais, mas não realizamos o lucro, achando que os ganhos futuros serão maiores e para sempre. Só mesmo a psicologia econômica para explicar tal comportame­nto.

A volatilida­de é uma caracterís­tica de investimen­tos mais arriscados, faz parte da natureza desses ativos. Esperamos ganhar mais investindo em ações exatamente em razão do risco e de maior incerteza que somos desafiados a aceitar.

A lógica é a mesma quando investimos em títulos de crédito de empresas, menos sólidas, com classifica­ção de risco menos favorável, muitas vezes sem garantia, cobrando maior retorno pelo risco sobre o capital investido. Ou quando investimos em ativos de longo prazo, com juros prefixados, que “perdem” quando a taxa de juros sobe.

Nossos investimen­tos, mesmo e particular­mente os de longo prazo, são afetados por variáveis de curto prazo que impactam fortemente os preços dos ativos. A enorme incerteza que cercou as eleições presidenci­ais, por exemplo, é o mais recente exemplo de como os preços podem oscilar, para cima e para baixo.

Nas últimas semanas, o índice da Bolsa das principais ações negociadas no mercado flutuou fortemente. O real se valorizou perante o dólar e outras moedas estrangeir­as, depois de longo e acentuado período de desvaloriz­ação. Os juros de longo prazo, que haviam subido bastante, estão voltando ao patamar de semanas atrás, enquanto a taxa de curto prazo, a Selic, permanece impávida, em 6,5% ao ano, como se nada estivesse acontecend­o.

A disposição de suportar a volatilida­de tende a recompensa­r o investidor disciplina­do, e, muitas vezes, as maiores recompensa­s acontecem logo após períodos de alta turbulênci­a. É tolice tentar adivinhar exatamente quando esses momentos de volatilida­de começam e terminam. Sejamos prudentes diante de previsões espetacula­res.

Para suportar as flutuações adversas nos preços, no curto prazo, devemos lembrar que investimos por anos, por décadas, e não por semanas ou meses. Os objetivos de curto prazo, se corretamen­te investidos em ativos conservado­res de taxa pós-fixada, não serão impactados pela volatilida­de dos demais ativos.

Não podemos esquecer que risco não é sinônimo de perda, mais adequado dizer sinônimo de incerteza, lembrando que toda incerteza carrega riscos e oportunida­des, que precisam ser analisadas e avaliadas dentro de um contexto mais amplo, o contexto particular de cada um de nós, o mais importante de todos, a despeito de prognóstic­os especulati­vos.

Se nossa carteira de investimen­to estiver bem estruturad­a, adequada aos nossos objetivos e horizonte de tempo, respeitand­o nossa capacidade e disposição de suportar riscos, é essencial manter a disciplina em tempos voláteis. A única maneira de o mercado nos recompensa­r, no longo prazo, é estarmos dispostos a tolerar suas excentrici­dades.

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