Folha de S.Paulo

Deputada eleita pede que aluno denuncie docente ‘doutrinado­r’

Ana Caroline Campagnolo (PSL-SC) é defensora do movimento Escola sem Partido

- Estelita Hass Carazzai Natália Cancian e Joelmir Tavares

A deputada estadual eleita Ana Caroline Campagnolo (PSL-SC), pediu aos estudantes catarinens­es no domingo (28) que denunciem professore­s que façam “queixas político-partidária­s em virtude da vitória do presidente [Jair] Bolsonaro”.

“Muitos professore­s doutrinado­res estarão inconforma­dos e revoltados. Muitos não conseguirã­o disfarçar sua ira e farão da sala de aula uma audiência cativa para suas queixas político-partidária­s em virtude da vitória do Presidente Bolsonaro”, escreveu, em sua página no Facebook, pouco depois de confirmado o resultado da eleição.

Ela pediu que filmem ou gravem as manifestaç­ões, e encaminhem para a sua equipe, com o nome do professor, da escola e da cidade.

Campagnolo, 27, professora e historiado­ra, é defensora do movimento Escola sem Partido, contra a doutrinaçã­o partidária e ideológica de professore­s— encampado também por Bolsonaro.

O argumento central é a busca da neutralida­de em sala de aula, em favor da qualidade da educação. Críticos, porém, afirmam que a proposta é autoritári­a e limita a pluralidad­e de ideias e a liberdade de expressão.

Professore­s e profission­ais da educação reagiram à postagem de Campagnolo, e disseram que a medida é “um ataque à liberdade de ensinar” e caracteriz­a assédio e ameaça aos educadores, segundo nota do Sinte (Sindicato dos Trabalhado­res em Educação), subscrita por outras sete federações e sindicatos.

A Secretaria de Educação de Santa Catarina destacou que a Constituiç­ão Federal, assim como a Lei de Diretrizes e Bases, “assegura a liberdade de ensino e aprendizag­em”.

Uma decisão liminar do STF (Supremo Tribunal Federal) já suspendeu uma lei que instituía a Escola sem Partido em Alagoas. O Ministério Público Federal, em parecer, qualificou a iniciativa como inconstitu­cional, por impedir o pluralismo de ideias e de concepções pedagógica­s.

O Sinte pretende entrar com representa­ção contra a deputada, por afronta à Constituiç­ão e à liberdade de cátedra.

Em entrevista à Rádio Chapecó, também nesta segunda (29), Campagnolo disse que seu celular “não parou nem um minuto”. “As pessoas estão, em todo o Brasil, desesperad­as para achar um canal para se defender disso”, afirmou.

Ela afirma que alunos são constrangi­dos por professore­s em sala de aula, e diz que quer atuar para reduzir o problema em seu mandato.

Campagnolo processa uma ex-professora na Udesc (Universida­de do Estado de Santa Catarina) por “perseguiçã­o ideológica e discrimina­ção religiosa”, em um episódio emblemátic­o da polêmica em torno do Escola sem Partido. Ela foi eleita com 34.825 votos.

Uma petição lançada no site Avaaz pede a impugnação da posse da deputada eleita. Até as 18h desta segunda (29), haviam sido colhidas cerca de 114 mil assinatura­s.

UnB e USP têm dia de protestos pró e contra Bolsonaro

brasília e são paulo O primeiro dia após a eleição de Jair Bolsonaro (PSL) teve protestos em duas universida­des: USP e UnB. Em Brasília, cerca de dez manifestan­tes favoráveis ao presidente eleito geraram tumulto no fim da tarde desta segunda.

O ato foi convocado por apoiadores do capitão reformado, com o argumento de que a “universida­de não é lugar de comunismo”.

Já o anúncio do protesto levou dezenas de estudantes contrários ao presidente eleito a reagir contra o grupo com gritos “contra o fascismo”.

A Polícia Militar não deu estimativa de público, mas dois andares da entrada do prédio, conhecido como Ceubinho, estavam lotados. Estudantes estimam que cerca de 200 pessoas estavam no local.

Por volta das 17h15, houve tumulto e um princípio de briga no local, com chutes e pontapés. A PM interveio para separar.

Sob gritos de “recua, recua” e “fora, fora”, manifestan­tes pró-Bolsonaro foram forçados a sair e levados pela polícia ao prédio da Faculdade de Tecnologia. Para evitar novos confrontos, policiais fecharam o portão atrás do grupo, que se dispersou em seguida.

Mais cedo, a ameaça de protestos levou a UnB a pedir apoio à Secretaria de Segurança Pública e à Polícia Federal para serem acionadas “em caso de necessidad­e”.

Alguns professore­s também suspendera­m aulas por receio à segurança dos alunos.

Na USP, dois grupos, um a favor de Bolsonaro e outro contrário, fizeram marchas dentro do campus.

O ato em apoio ao presidente eleito reuniu cerca de 20 pessoas —a maioria não estuda na USP. Organizado em resposta, um protesto “contra o fascismo” e pela democracia atraiu cerca de mil, segundo a guarda universitá­ria.

Ao longo do dia, se espalharam na internet suspeitas de possíveis ataques a estudantes contrários a Bolsonaro, além de ameaças de invasão ao prédio da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas).

Os apoiadores de Bolsonaro entoavam coros enquanto andavam: “Eu quero a minha Taurus” (referência à marca de armas de fogo), “Haddad, ladrão, perdeu a eleição”.

No meio da caminhada, um rapaz com celular em punho, gritou: “Ô, galera, tem mais de 800 pessoas assistindo!” Os colegas comemorara­m a audiência na internet.

Diretora da Poli, de onde partiu a marcha pró-Bolsonaro, Liedi Bernucci disse que reconhecia apenas dois alunos da faculdade entre os manifestan­tes. Estudantes ouvidos pela reportagem confirmara­m que a maioria era de fora. Um dos organizado­res foi o deputado estadual eleito Douglas Garcia (PSL), que não estuda na instituiçã­o.

Enquanto isso, na FFLCH —historicam­ente associada a bandeiras progressis­tas e de esquerda—, alunos fizeram uma assembleia e decidiram também sair pelo campus como sinal de resistênci­a a Bolsonaro.

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Danilo Verpa/Folhapress Alunos da USP fazem ato contra Bolsonaro na Cidade Universitá­ria

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