Folha de S.Paulo

Você tem uma razão para viver?

Mirian Goldenberg Antropólog­a e professora da UFRJ, é autora de “A Bela Velhice”

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Meus pesquisado­s afirmam que a pior parte da velhice é a invisibili­dade e a falta de significad­o da própria vida, a sensação de inutilidad­e, a falta de escuta e de reconhecim­ento.

Os homens falam mais do medo da solidão, de se sentirem inúteis e improdutiv­os e da importânci­a do amor. É o caso de José, de 91 anos.

“Meu tempo é dividido entre cuidar da saúde, me dedicar ao projeto de teatro e música que coordeno com idosos e com minha namorada. Meus projetos são de curto prazo. No ano que vem quero me dedicar mais à minha namorada, passear, viajar. O meu grupo de idosos me cobra muito, pois acha que vou parar o trabalho que faço com eles. Não vou parar, mas vou diminuir bastante. Quero ter mais tempo para namorar. Apesar de ela ser novinha, ter 65 anos, tem muito ciúme das idosas do meu grupo.”

Já as mulheres dizem que envelhecer pode ser libertador, como contou Ligia, 90

“Pensei que seria uma velhinha abandonada depois de perder meu marido, mas foi o contrário. Hoje eu sou dona do meu tempo. Posso sair, passear, viajar, almoçar com minhas amigas, ir ao cinema, ao teatro. Pela primeira vez na vida, posso cuidar de mim, gastar o meu dinheiro como eu quero. Nunca fui tão feliz.”

Todos destacam a importânci­a de construíre­m uma vida com significad­o, como Lauro, de 95 anos.

“Todas as semanas eu tenho ensaio com meu grupo musical. Sempre fazemos shows em hospitais e casas da terceira idade. Levamos um pouco de alegria para quem precisa. As pessoas mais velhas só querem sete “As”: atenção, atividade, alegria, amor, apoio, amizade e autonomia. Nós precisamos de uma razão para continuar levantando da cama. Senão, como iremos sobreviver em tempos tão sombrios, com tanto ódio, intolerânc­ia e violência?”

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