Entidades relatam preocupação com fala sobre a Folha
Para ANJ, OAB e outras organizações, discurso contra imprensa é antidemocrático
Associações de jornalistas e organizações de defesa dos direitos humanos repudiaram as afirmações de Jair Bolsonaro contra a Folha no Jornal Nacional. Para Gustavo Bebianno, braço direito de Bolsonaro, “ele não fez ataques, ele fez críticas”.
são paulo Associações de jornalistas profissionais e organizações de defesa dos direitos humanos manifestaram repúdio às afirmações do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) contra a Folha em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, na segunda-feira (29).
Na ocasião, ele afirmou: “No que depender de mim, imprensa que se comportar de maneira indigna não terá recursos do governo federal”. E completou: “Por si só esse jornal [Folha] se acabou”.
Para as organizações, Bolsonaro não deveria cogitar usar cortes de verbas oficiais para retaliar jornais. Além disso suas declarações alimentam um clima de confronto com a mídia que é contraproducente.
As entidades também defendem que a liberdade de atuação de uma imprensa livre e crítica é fundamental para que a democracia funcione.
Marcelo Rech, presidente ANJ (Associação Nacional de Jornais) e vice-presidente do Fórum Mundial de Editores, disse que é preocupante que o presidente eleito tenha reiterado a intenção de usar o corte de verbas publicitárias oficiais como forma de punição quando discorda de um jornal.
“Os investimentos do governo em publicidade, como qualquer outra verba pública, devem seguir sempre critérios técnicos, e não políticos ou partidários”, afirmou.
O presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, lembrou que a liberdade de imprensa ajuda a assegurar acesso à informação de qualidade.
“A liberdade de imprensa é garantida pela Constituição para que a sociedade tenha efetivado seu direito a ter informações de qualidade, críticas e isentas”, disse.
A seccional da OAB em São Paulo pontuou que a liberdade de expressão e de imprensa, ao lado do livre exercício da religião, constituem o “lume da democracia moderna”.
“Não se admite qualquer agressão aos princípios que regulam a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa, ou, ainda, ameaças às atividades de profissionais que militam nos meios de comunicação”, disse o presidente da entidade, Marcos da Costa.
A ABI (Associação Brasileira de Imprensa) disse em nota que “verbas de publicidade oficial não podem ser usadas como moeda de troca, ou distribuídas de acordo com as oscilações de humor de quem tem o dever de administrá-las com equilíbrio e lisura”.
Segundo o presidente da entidade, Domingos Meirelles, Bolsonaro “não recebeu alvará que o isenta dos compromissos com a democracia, cujo respeito à liberdade de expressão é um dos seus pilares”.
Emmanuel Colombié, diretor do escritório da América Latina da Repórteres Sem Fronteiras, afirmou em nota que “as declarações agressivas contra a imprensa são um mau presságio para esta nova era que se inaugura no Brasil”.
Colombié disse que o confronto com jornais é contraproducente e que, para preservar a democracia, Bolsonaro deve entender o papel da imprensa livre e independente.
Para Maria José Braga, presidente da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), Bolsonaro demonstrou despreparo para exercer um cargo em que receberá críticas constantes.
“Ele tem perfil autoritário, que não aceita qualquer questionamento, ignorando o papel dos jornalistas, que é exatamente o de buscar e divulgar informações de interesse público”, disse a dirigente.
“A Fenaj repudia a declaração do presidente eleito e solidariza-se com os jornalistas que trabalham na Folha.”
O diretor da Conectas Direitos Humanos, Marcos Fuchs, declarou que, em uma sociedade democrática, críticas aos veículos de comunicação são bem-vindas, mas não em tom de ameaça ou intimidação.
“É urgente que o presidente eleito se manifeste no sentido de garantir que, em seu governo, a liberdade de expressão será garantida tal qual está consagrada na Constituição.”
Segundo a coordenadora na América Latina do CPJ (Comitê de Proteção aos Jornalistas), Natalie Southwick, uma imprensa livre e independente é vital para a democracia.
“Bolsonaro tem que reconhecer isso e se concentrar em asseverar seu apoio à liberdade de imprensa, em vez de tentar desacreditar os meios de comunicação”, disse.
Para Southwick, a retórica anti-imprensa de Bolsonaro é preocupante “dado o clima no Brasil, com tantos ataques à liberdade de imprensa”.
Segundo relatório do CPJ divulgado nesta semana, o Brasil é o 10º país do mundo com o pior índice de impunidade em crimes contra jornalistas.
Em 2018, o país também ocupa o 102º lugar no ranking mundial de liberdade de imprensa elaborado pela Repórteres Sem Fronteiras.
“A liberdade de imprensa é garantida pela Constituição para que a sociedade tenha efetivado seu direito a ter informações de qualidade, críticas e isentas Claudio Lamachia
presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)
O novo presidente não recebeu alvará que o isenta dos compromissos com a democracia, cujo respeito à liberdade de expressão é um dos seus pilares Domingos Meirelles
presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa)
Os investimentos do governo em publicidade, como qualquer outra verba pública, devem seguir sempre critérios técnicos, e não políticos Marcelo Rech
presidente ANJ (Associação Nacional de Jornais)
A verba para propaganda oficial do governo deve ser restrita apenas a campanhas de utilidade pública, tais como vacinação, matrícula, calamidades e etc. Esses recursos devem ser aplicados com critérios objetivos de relevância, e não de forma discricionária, ao gosto do governante. O dinheiro público não é dinheiro do governante, é do cidadão João Amoêdo (Novo)
ex-presidenciável
“Consideramos a liberdade de imprensa um dos princípios fundamentais da democracia Candido Bracher
presidente do Itaú Unibanco
Acho necessário veículos como a Folha se manterem independentes, críticos e vigilantes. Da mesma forma que o presidente deve ter o direito de defender suas posições e atitudes, tendo espaço equivalente para qualquer tipo de esclarecimento, quando se fizer necessário Luciano Huck apresentador e empresário
Não é atribuição de nenhum governante ser o fiel da balança de quem deve ter liberdade ou não (...) Em uma democracia, ninguém está imune a críticas. A Folha tem dado uma importante contribuição jornalística ao país Marina Silva (Rede) ex-senadora e expresidenciável
O presidente eleito tem que reconhecer a importância da imprensa livre e independente e se concentrar em asseverar seu apoio à liberdade de imprensa, em vez de tentar desacreditar os meios de comunicação Natalie Southwick coordenadora na América Latina do CPJ (Comitê de Proteção aos Jornalistas)