Folha de S.Paulo

Bolsonaro e a imprensa

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

são paulo Jair Bolsonaro não gosta da Folha. É um direito dele. Mas, se o presidente eleito pretende cumprir sua promessa de obedecer à Constituiç­ão, precisa resignar-se à ideia de que vivemos num Estado liberal no qual vige a liberdade de imprensa.

Mais do que uma cereja decorativa no bolo da democracia, a liberdade de imprensa, ao lado das liberdades de expressão e de pensamento, são importante­s porque ajudam a manter sob controle tanto o poder do Estado como o de maiorias circunstan­ciais.

O filósofo John Stuart Mill (18061873) já disse quase tudo o que é preciso dizer sobre o assunto. Não é só o soberano que pode cometer injustiças contra o indivíduo. As “opiniões e sentimento­s prevalecen­tes”, que Mill chama de “tirania da maioria”, podem ser igualmente opressivas, se não mais.

Assegurar que ideias diferentes daquelas defendidas pelos poderosos e pelos numerosos possam circular é um passo necessário para que as teses oficiais e majoritári­as sejam contestada­s e, se estiverem erradas, como frequentem­ente estão, sejam abandonada­s. Mill, como bom iluminista, aposta que, no longo prazo, as melhores ideias triunfam sobre as piores.

A liberdade de imprensa especifica­mente (separada da liberdade de expressão e de pensamento) adquire especial importânci­a no atual momento, em que fake news ganham ampla circulação nas redes sociais. Não é que o jornalismo profission­al vá resolver esse problema, mas a imprensa facilita um pouco a vida do cidadão ao oferecer-lhe uma primeira filtragem, levando-lhe notícias que passaram por um processo de verificaçã­o, ainda que imperfeito.

O jornalismo não tem respostas definitiva­s para os grandes problemas do país, mas pode dar sua contribuiç­ão para o debate público, quando amplia o leque das ideias em circulação, zela pelos fatos e, de vez em quando, consegue revelar aquilo que poderosos gostariam de manter escondido.

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