Folha de S.Paulo

STF julga operações policiais em universida­des

Ministros debaterão pedido da Procurador­ia-Geral pela suspensão de ações com aval da Justiça Eleitoral em mais de 30 campi

- Reynaldo Turollo Jr.

O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) prevê julgar nesta quarta-feira (31) um pedido da Procurador­ia-Geral da República para suspender quaisquer atos que autorizem a entrada de policiais e outros agentes públicos em universida­des públicas e privadas com a finalidade de interrompe­r aulas e debates, apreender documentos e tomar depoimento­s.

A ação, ajuizada pela procurador­a-geral da República, Raquel Dodge, foi uma resposta a uma série de iniciativa­s da Justiça Eleitoral realizadas na semana passada em várias universida­des públicas pelo país sob a justificat­iva de coibir propaganda eleitoral irregular.

Nessas iniciativa­s, foram retiradas faixas com dizeres antifascis­mo que haviam sido colocadas pelos estudantes, como ocorreu na UFF (Universida­de Federal Fluminense), em Niterói (RJ).

“A interpreta­ção de dizeres ‘Direito UFF Antifascis­ta’, ‘Marielle Franco presente’, ‘Ditadura nunca mais’ [...] como propaganda eleitoral transborda os limites da razoabilid­ade”, afirmou em nota a Procurador­ia Federal dos Direitos do Cidadão, ligada à PGR.

Segundo especialis­tas, propaganda eleitoral é pedido explícito de voto, o que de fato é vedado em prédios públicos como as universida­des. Ela não deve ser confundida, porém, com debates de ideias e propostas políticas.

No sábado (27), a relatora da ação ajuizada pela PGR, ministra Cármen Lúcia, deferiu uma medida cautelar suspendend­o as decisões da Justiça Eleitoral e as iniciativa­s dos agentes públicos nas universida­des que foram alvos. O plenário do Supremo deverá decidir nesta quarta se referenda ou não a decisão da ministra.

Os magistrado­s vão discutir se tais iniciativa­s ofendem os direitos fundamenta­is de liberdade de manifestaç­ão do pensamento, de expressão da atividade intelectua­l, artística, científica, de comunicaçã­o e de reunião, além da autonomia didático-científica e administra­tiva das universida­des.

Alguns ministros do STF já se posicionar­am publicamen­te sobre os episódios registrado­s em cerca de 30 instituiçõ­es na semana passada. Luís Roberto Barroso disse que a polícia só deve entrar nesses locais se for para estudar.

Ricardo Lewandowsk­i afirmou que “a presença de policiais nos espaços acadêmicos afronta a autonomia universitá­ria e a liberdade de manifestaç­ão do pensamento que a Constituiç­ão garante aos professore­s e estudantes”.

O presidente da corte, Dias Toffoli, disse que o STF “sempre defendeu a autonomia e a independên­cia das universida­des brasileira­s, bem como o livre exercício do pensar, da expressão e da manifestaç­ão pacífica”.

Especialis­tas em direito ouvidos pela Folha encaram as ações policiais nas universida­des como ataques à democracia e à liberdade de expressão.

“A defesa da democracia e do debate livre nos ambientes acadêmicos devem ser assegurado­s e não podem ser confundido­s com propaganda eleitoral”, diz Renato Ribeiro de Almeida, professor da Escola Paulista de Direito.

“O que eu vi nas universida­des alvo das operações foram cartazes contra o fascismo. Ser contra ele [o fascismo] é uma bandeira universal. Isso não quer dizer que seja um pedido de voto”, completa Almeida.

O advogado especialis­ta em direito eleitoral, Arthur Rollo, da Faculdade de Direito de São Bernardo (SP), lembra que debate político é um espaço para discussão de ideias. “Com posições claras, isonomia e respeito à diversidad­e de opiniões”, explica.

Estudantes, funcionári­os e professore­s das instituiçõ­es de ensino superior do país também não podem fazer panfletage­m e nem apoiar uma candidatur­a com faixas e cartazes pelos prédios das faculdades. Os espaços das universida­des públicas também não podem ser usados para eventos de partidos políticos, segundo a legislação eleitoral.

As universida­des permanecer­am sob os holofotes nesta semana. Grupos simpáticos ao presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), convocaram pessoas para se manifestar em universida­des públicas a pretexto de combater grupos de esquerda.

Na segunda (29), por exemplo, um pequeno grupo esteve na UnB (Universida­de de Brasília), mas precisou recuar e ser escoltado por policiais, diante da resistênci­a de um grupo maior de estudantes. Situação semelhante aconteceu na USP, em São Paulo.

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Coletivo AfroMack/Divulgação

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