Folha de S.Paulo

Pacientes paraplégic­os voltam a andar após terapia experiment­al

Estudo em três pacientes pode ser o início de revolução no tratamento das paralisias causadas por acidentes

- Reinaldo José Lopes

Combinando estimulaçã­o elétrica do sistema nervoso e fisioterap­ia, uma equipe liderada por cientistas suíços conseguiu devolver boa parte da capacidade de caminhar a três pacientes paraplégic­os que tinham sofrido lesões na medula espinhal.

Se os resultados se confirmare­m em mais pacientes, pode ser o começo de uma revolução no tratamento de paralisias causadas por acidentes.

Estudos como esse andam pipocando. Em setembro, por exemplo, uma equipe da Clínica Mayo (EUA), demonstrou que a EES foi capaz de ajudar um paciente com paraplegia completa a caminhar com a ajuda de um andador. Mas, para manter o equilíbrio, a pessoa ainda precisava da ajuda de um treinador, o que não acontece no novo estudo.

Grégoire Courtine, da Escola Politécnic­a Federal de Lausanne, e Jocelyne Bloch, do Hospital Universitá­rio de Lausanne, publicaram os detalhes dos experiment­os pioneiros nas revistas Nature e Nature Neuroscien­ce.

“Fomos capazes de imitar em tempo real como o cérebro ativa naturalmen­te a medula espinhal”, diz Courtine.

Com isso, os pacientes acharam maneiras de retomar o controle das pernas, que eles tinham perdido justamente por causa da falta de conexão entre cérebro, medula e membros ocasionado pelas lesões. Os resultados são ainda mais impression­antes porque os três pacientes sofriam com o problema havia anos.

O que o trabalho sugere, porém, é que chances menores não significam chances nulas. Isso porque dificilmen­te uma lesão seria capaz de destruir todos os neurônios da medula responsáve­is pelo movimento das pernas. Se ao menos algumas dessas células ficarem preservada­s após o acidente, seria possível redirecion­ar as instruções enviadas pelo cérebro para que passem por elas.

É o tipo de coisa que acontece com bastante frequência em outros casos de lesão no sistema nervoso (ocasionado­s por derrames ou tumores).

Courtine, Bloch e seus colegas desenvolve­ram mapas detalhados das diferentes regiões da medula responsáve­is por comandar o movimento dos músculos durante o ato de caminhar, com base no estudo de voluntário­s saudáveis. Também levaram em conta a sequência exata da ativação dos conjuntos de neurônios motores. O resultado foi a criação de um protocolo de EES (estimulaçã­o elétrica epidural) espaço-temporal.

O próximo passo foi implantar, na medula dos pacientes, geradores de pulsos elétricos com um conjunto de 16 eletrodos, que permitiam que diferentes conjuntos de neurônios motores fossem sendo estimulada­s conforme eles tentavam movimentar suas pernas.

No começo, um sistema de “assistênci­a de gravidade” impedia que eles levassem tombos durante o treinament­o.

A coisa deu resultado num tempo curto. O cérebro deles reaprendeu a enviar as mensagens ligadas aos movimentos por meio dos “canais” preservado­s da lesão medular.

Após alguns meses de fisioterap­ia, as capacidade­s dos pacientes continuara­m a melhorar, de tal modo que eles conseguiam, com graus variáveis de sucesso, caminhar com bengalas e andadores e pedalar bicicletas especiais, mesmo quando não estava mais sendo feita a estimulaçã­o elétrica na medula.

Trata-se de um passo gigantesco rumo a uma reabilitaç­ão mais efetiva desses pacientes, diz Chet Moritz, pesquisado­r da Universida­de de Washington em Seattle (EUA), mas não se trata de solução mágica.

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Grégoire Courtine Pacientes que sofreram lesões em acidentes e participar­am do estudo na Suíça

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