Brasil atrasa medidas contra a poluição do ar
Ao mesmo tempo em que se realizava a primeira conferência global da Organização Mundial de Saúde inteiramente dedicada aos letais efeitos da poluição à saúde humana, em Genebra, na Suíça, o Brasil aprovava duas resoluções com alto potencial poluidor, com o aval de seu Ministério do Meio Ambiente.
Em reunião na última terça (30), o Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente) sacramentou uma das fases do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve), que trata do controle das emissões de gases poluentes para veículos pesados novos.
No Proconve foi aprovado o maior prazo possível para a adoção do padrão mais eficiente de controle de poluentes para caminhões e ônibus.
Ele já foi adotado nos EUA em 2010 e na Europa em 2012. A China deve adotar em 2021. No Brasil, só em 2023.
Na prática, quer dizer que esses veículos podem continuar a sair de fábrica sem os filtros que são reconhecidos como eficientes e utilizados pelas montadoras em boa parte dos países civilizados.
Caminhões e ônibus são responsáveis por 80% das emissões de material particulado, o grande causador de doenças respiratórias e mortalidade.
A OMS estima que todo ano 7 milhões de pessoas morrem por respirar ar tóxico. Um terço das mortes por acidente vascular cerebral, câncer de pulmão e doenças respiratórias podem estar ligadas à poluição do ar.
A segunda bomba poluidora aprovada pelo Conama foi o texto da resolução 03/90. Ela deixa de atualizar e regulamentar os defasados padrões nacionais de qualidade do ar.
Mantendo a régua antiga —e vencida— para medir os índices, a resolução torna a poluição menos identificável pela sociedade e a potencializa, já que que permite licenciamento ambiental de novas atividades econômicas em áreas já poluídas.
Por exemplo, permanece aceitável uma concentração de 120 ug/m³ (120 microgramas por metro cúbico) de material particulado (PM10) para uma média de 24 horas.
Segundo levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), em vários países são decretados estados de atenção ou alerta quando a concentração de PM10 ultrapassa os 50 ug/m3.
A resolução do Conama considera normal o que países como Áustria, Bélgica, Finlândia, Alemanha, Itália e Espanha caracterizam como uma situação de grave crise e perigo à vida.
Nesses países, quando se atinge essa concentração, são disparados alertas para a população e são tomadas medidas como a suspensão do tráfego em determinadas áreas e liberação de transporte público para coibir o uso de carros particulares.
Para Carlos Bocuhy, presidente do Proam, que é conselheiro do Conama e foi voto vencido, a proposta aprovada permite a “moratória” para a poluição no Brasil. “O Conama não está defendendo o meio ambiente e a saúde. Quem paga são os mais vulneráveis financeiramente, as crianças e os idosos”.
Ele ainda diz que em Paris 50 ug/m3 por dois dias já leva a medidas emergenciais. No Brasil, a emergência só será declarada se a concentração atingir 500 ug/m3. “Nunca será decretada emergência, mesmo com níveis altíssimos” de poluição, completa.
Para Evangelina Vormittag, diretora do Instituto Saúde e Sociedade, o texto aprovado não protege o meio ambiente, é ineficiente e inconstitucional. “O desenvolvimento econômico não precisa ser sujo, como já provaram diversos países”, diz.