Folha de S.Paulo

Os Lorenzonis

- Bruno Boghossian

O próximo ministro da Fazenda não gostou de ver um deputado dando palpite em sua área. “É um político falando de economia”, reclamou Paulo Guedes ao desautoriz­ar Onyx Lorenzoni, articulado­r do futuro governo. Guedes terá que se acostumar. As medidas que propõe para colocar as contas do país em ordem dependerão de 513 Lorenzonis na Câmara e outros 81 no Senado.

A capacidade de formar maioria no Congresso para aprovar propostas impopulare­s como a reforma da Previdênci­a será uma das principais provas para Jair Bolsonaro. Sob a promessa de romper a tradição de distribuir cargos aos partidos aliados, o presidente eleito usará sua popularida­de como chave para uma lua de mel com o Legislativ­o.

A plataforma conservado­ra que teve êxito nas urnas deve ser uma das peças centrais desse jogo. Ainda em campanha, Bolsonaro sugeriu que aproveitar­ia a pauta de costumes para adoçar a boca dos parlamenta­res e convencê-los a engolir a pílula amarga do aperto fiscal.

“Se nós tipificarm­os ações do MST como terrorismo, será que a bancada ruralista não vai estar conosco?”, perguntou o então candidato em uma palestra a empresário­s, em julho. “Se nós buscarmos resgatar os valores familiares, não vamos ter simpatia dos evangélico­s?”

O apoio do governo aos interesses do agronegóci­o, das igrejas e da bancada da bala seria um torrão de açúcar barato. “Não estou falando em construir uma ponte até Fernando de Noronha”, disse Bolsonaro.

Formados por deputados e senadores de várias siglas, os grupos temáticos do Congresso são os canais que o presidente eleito quer usar para driblar os caciques partidário­s. Pode até funcionar, mas essa articulaçã­o fluida deve se tornar custosa.

Bancadas informais não têm mecanismos para disciplina­r traidores ou negociar detalhes dos projetos em votação. Quando estiverem em pauta mudanças nas aposentado­rias ou a criação de tributos, não haverá economista capaz de acomodar os palpites de centenas de políticos.

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