Folha de S.Paulo

O fracasso na Libertador­es

O futebol brasileiro precisa encontrar os motivos para a derrota

- Paulo Vinícius Coelho Jornalista, cobriu seis Copas do Mundo (1994, 1998, 2006, 2010, 2014 e 2018)

O Brasil passou 22 anos como país hegemônico na Libertador­es. Entre 1992 e 2013, ganhou o torneio 13 vezes e houve clube brasileiro em 19 finais. Ausências apenas em 1996, com River Plate campeão, 2001, com Boca Juniors vencedor, e 2004, ano do Once Caldas (COL). Depois da conquista do Atlético-MG de Ronaldinho Gaúcho, há 5 temporadas, o sucesso minguou.

Das últimas cinco edições, só um finalista daqui: o Grêmio, em 2017. Neste ano, com oito brasileiro­s, a primeira Libertador­es com tantos representa­ntes de um mesmo país terminará com dois argentinos classifica­dos para a decisão.

À parte o recurso do Grêmio aos tribunais, é preciso entender as razões do desempenho ruim. Nos últimos dez anos, os times daqui venceram a Libertador­es cinco vezes, contra duas dos argentinos e uma do Atlético Nacional (COL). Não houve derrota de time do Brasil em final, desde 2010. Inter, Santos, Corinthian­s, Atlético-MG e Grêmio venceram adversário­s do México, Uruguai, Argentina, Paraguai e novamente Argentina.

A diferença econômica ajuda o Brasil. O Flamengo tem receita anual de R$ 600 milhões, o River Plate arrecada R$ 350 milhões por ano. Mas os argentinos melhoraram com a criação da Superliga e a maioria dos dirigentes daqui reclama de estruturas pré-falimentar­es. O presidente do Atlético-MG, Sérgio Sette Câmara, é um desses.

Na América do Sul inteira, é difícil encontrar clube saudável.

Do ponto de vista técnico, há dez anos discute-se a qualidade dos técnicos brasileiro­s. Não parece ser o problema central, mas é justo que faça parte do debate. É necessário olhar para tudo, observar todos os aspectos, sem preconceit­os. A procura é pelo antídoto da derrota.

Chama a atenção a informação do blog Patadas y Gambetas, do jornalista Tales Torraga, de que o Boca Juniors havia disputado 21 jogos a menos que o Palmeiras até a partida de volta da semifinal da Libertador­es. Ampliando o estudo e consideran­do apenas jogos oficiais, descobre-se que o Palmeiras disputou 67 partidas, o Grêmio 64, o River Plate 42 e o Boca Juniors 41. Diferença de 26 partidas oficiais a mais para os brasileiro­s. Mesmo consideran­do 8 jogos por mês, o que só acontece no Brasil, os argentinos jogaram o equivalent­e a três meses a menos.

É como se aqui o ano tivesse 15 meses de trabalho. O cansaço bate bem na hora de decidir.

“O Palmeiras disputou 9 partidas por mês nos últimos 3 meses”, disse Felipão após a derrota em La Bombonera. Ele não usou o argumento como muleta, mas citou o número.

Os clubes brasileiro­s têm mais orçamento e mais talento, descobrem mais jogadores e podem contratar mais estrangeir­os bons de bola. Os craques argentinos vão para a Europa. Os brasileiro­s também. Contrataçõ­es só de quem é bom, mas não o suficiente para os europeus. O debate precisa incluir tudo. Fernando Calazans cansouse de escrever nas páginas do jornal O Globo sobre a formação ruim de jogadores jovens nos clubes do Brasil. É também importante pensar nisso. Por outro lado, o Brasil é o único país que tem jogador na final da Champions League todos os anos desde 2000. Os maiores rivais em revelações, Alemanha, França, Espanha e Argentina, ficaram ausentes pelo menos em uma temporada.

Por mais motivos que se apresente, sempre será necessário pensar no calendário. Não é possível chegar às finais com o corpo castigado por 26 jogos a mais do que os rivais. A disputa não é só com os sul-americanos. A Europa venceu as últimas 4 Copas e os dirigentes de lá dizem que a hegemonia vai aumentar. Nesse caso, caberá ao Brasil a mesma representa­tividade da África.

Na Libertador­es, o país já está atrás da Argentina.

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