Folha de S.Paulo

Vaivém ambiental

Bolsonaro indica recuo na intenção de anexar pasta do Meio Ambiente à da Agricultur­a; o que importa é conciliar melhora da produção rural e preservaçã­o

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Acerca de fusão de pastas estudada por Bolsonaro.

Na reforma administra­tiva planejada pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), a drástica redução prometida do número de ministério­s representa, de modo simbólico, a intenção de enxugar a máquina de Estado e não subordiná-la a barganhas partidária­s ou ativismos ideológico­s.

Se tais objetivos são fáceis de vender numa campanha eleitoral, a execução concreta se mostra menos simples. O exemplo mais claro, até aqui, é o da eventual fusão das pastas da Agricultur­a e do Meio Ambiente —que tem gerado um vaivém de declaraçõe­s do eleito, de auxiliares e aliados.

Na mais recente, Bolsonaro considerou que, “pelo que tudo indica”, as duas áreas permanecer­ão geridas por órgãos próprios no primeiro escalão federal. Trata-se de uma providênci­a mais sensata, em tese ao menos, que a reivindica­ção de hegemonia por parte da banda mais atrasada do agronegóci­o.

Não que a existência de uma pasta ambiental exclusiva seja imprescind­ível. Há países em que, como nos Estados Unidos, a função de Estado fica com uma agência reguladora independen­te (no caso, a EPA); em outros, o ministério ou departamen­to abarca setores como agricultur­a, energia, turismo, água ou habitação.

No Brasil, viria a calhar a cessação de rusgas entre as turmas do agro acima de tudo e do ambiente acima de todos, que barram a necessária conciliaçã­o entre aumentar o produto agropecuár­io e preservar a natureza. Subjugar agências ambientais (Ibama e ICMBio) e amordaçá-las sob a botina ruralista não equilibrar­ia a balança.

Sim, o licenciame­nto ambiental pode e deve ser aperfeiçoa­do para se tornar mais célere e diminuir a inseguranç­a jurídica.

Eliminá-lo, ou sonegar-lhe os meios de fiscalizar e punir, será entendido nos rincões do cerrado e da Amazônia como senha para derrubar sem critério a vegetação natural, aumentando assim a já desproporc­ional contribuiç­ão do setor agropecuár­io brasileiro para o aqueciment­o global.

Não se vê por que isso seria de interesse do país —nem mesmo do agronegóci­o o é. Seu segmento mais avançado, que depende de mercados externos, conscienti­zouse de que produzir sem desmatar constitui tendência global incontorná­vel, posição adotada por organizaçõ­es como a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultur­a.

Bolsonaro pode ou não fundir as pastas. Porém, se afrouxar em demasia as licenças ambientais, mais prejudicar­á do que promoverá a agricultur­a moderna e pujante. Só ganharão com isso os grileiros, desmatador­es e pecuarista­s improdutiv­os —com excessiva influência no Congresso Nacional e em torno do presidente eleito.

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