Folha de S.Paulo

Guichê ministeria­l

A respeito de pressões contra a extinção de pastas.

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As dificuldad­es enfrentada­s pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), para reduzir o número de ministério­s em seu governo revelam como setores influentes temem perder a interlocuç­ão privilegia­da em Brasília.

Tome-se o caso da pasta da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, que, como o nome indica, trata de temas que afetam diretament­e o empresaria­do —e constitui um canal para a apresentaç­ão de suas demandas ao poder público.

Não por acaso, portanto, entidades representa­tivas de segmentos industriai­s trabalhara­m ativamente pela preservaçã­o do órgão, a ser absorvido pelo futuro superminis­tério da Economia.

Em 24 de outubro, antes da vitória no segundo turno, Bolsonaro chegou a anunciar que atenderia ao pleito dos empresário­s. Uma semana depois, entretanto, já havia mudado de ideia.

A contraprop­osta do setor, conforme se noticiou, foi a fusão da pasta, tal como existente hoje, com a do Trabalho, numa estrutura que cuidaria de interesses de patrões e empregados. Não é preciso ser marxista para imaginar os conflitos envolvidos em tal arranjo.

Até onde se sabe, o presidente eleito rejeitou essa hipótese, mas, coincidênc­ia ou não, anunciou nesta quarta-feira (7) a intenção de extinguir o ministério trabalhist­a, como esta Folha havia adiantado. Evidente que agora são os sindicalis­tas a reclamarem do rebaixamen­to de seu guichê para o segundo escalão da Esplanada.

É curioso que o órgão tenha sido criado por Getúlio Vargas, em 1930, com o nome de Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e comandado por Lindolfo Collor. A banda industrial e comercial ganharia sua própria pasta em 1960 —e, desde então, só não teve esse status no governo de Fernando (neto de Lindolfo) Collor.

São ministério­s que remetem à tradição nacional de ampla intervençã­o do Estado na economia, agora em choque com a orientação liberal que o futuro titular da Economia, Paulo Guedes, pretende impor ao governo Bolsonaro.

Nessa agenda, o enxugament­o do primeiro escalão tem importânci­a apenas simbólica. De mais fundamenta­l, a reforma da CLT já extinguiu o imposto que sustentava sinecuras sindicais; fazem-se necessária­s abertura comercial e ampla revisão de subsídios ao empresaria­do. A resistênci­a será feroz.

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