Folha de S.Paulo

Presidente da Câmara de SP dá gestão de publicidad­e a namorada do filho

Com salário de R$ 19,4 mil, ela ganhou cargo de Milton Leite; Casa destaca experiênci­a de servidora

- Artur Rodrigues

O presidente da Câmara Municipal de SP, Milton Leite (DEM), contratou a namorada do filho para cargo de confiança responsáve­l por cuidar de contrato milionário de publicidad­e da Casa.

Gislaine Hereda Pinheiro, 41, a Gica, namora o deputado estadual Milton Leite Filho (DEM). Ela foi contratada como diretora de comunicaçã­o externa da Câmara, com salário bruto de R$ 19,4 mil. O cargo tem como função a gestão da publicidad­e da Casa —o atual contrato é avaliado em R$ 26 milhões por ano.

Devido ao cargo, a servidora também participou de reuniões relacionad­as à licitação para contrataçã­o da nova empresa responsáve­l pela publicidad­e. O contrato atual foi feito ainda na gestão petista de Fernando Haddad, em 2013, e vem sendo prorrogado.

O cargo de Gislaine é vinculado à Presidênci­a da Casa, com salário superior ao dos vereadores (R$ 18,9 mil). A Presidênci­a da Câmara afirma que ela foi contratada por ser bacharel em direito e ter experiênci­a no setor público.

Súmula vinculante do STF (Supremo Tribunal Federal) veta contrataçã­o de cônjuge, companheir­o ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau.

Para o advogado especialis­ta em direito administra­tivo Rudi Cassel, até casos de namoro poderiam ser questionad­os. “Moralidade e impessoali­dade são exigências do artigo 37 da Constituiç­ão. Não há impessoali­dade na contração/designação de namorada de filho para uma função.”

Já o advogado Adib Kassouf Sad, da comissão de direito administra­tivo da OAB-SP, considera que “em princípio não há nepotismo”, exceto se houvesse união estável.

No mesmo ano em que Gislaine foi contratada, em 2017, já sob a gestão de Milton Leite, a Câmara apagou os nomes de seus funcionári­os da lista com salários divulgada na internet —passou a revelar somente a numeração da matrícula dos servidores.

A justificat­iva é que se tratava de uma solicitaçã­o do sindicato da categoria —medida criticada por entidades por diminuir a transparên­cia.

Filha do ex-prefeito de São Caetano do Sul Paulo Pinheiro (na época no MDB), Gislaine é conhecida na política da região do ABC. Ela dirigiu o MDB em São Caetano e atuou como assessora na gestão do próprio pai como prefeito.

Gislaine e Milton Leite Filho não moram juntos e têm uma relação com idas e vindas.

O filho do presidente da Câmara se elegeu deputado estadual pela quarta vez seguida. O irmão dele, Alexandre Leite, é deputado federal.

O namoro entre Gislaine e Milton Leite Filho aproximou os dois clãs políticos.

Hoje, o ex-prefeito de São Caetano também é aliado de Milton Leite. Em uma das vezes em que Leite assumiu como prefeito interino de São Paulo, em julho, ele foi até São Caetano se encontrar com Pinheiro e vereadores da cidade.

Servidora tem vasta experiênci­a em gestão, diz Câmara OUTRO LADO

A Presidênci­a da Câmara enviou nota em que afirma que Gislaine tem mais de 20 anos de experiênci­a. “[A servidora] tem vasta experiênci­a na gestão de contratos na área públi- ca, na prefeitura e na Câmara Municipal de São Caetano”.

A nota afirma que ela não integra a comissão de licitação de publicidad­e nem é responsáve­l pela concorrênc­ia.

“Gislaine é diretora da Diretoria de Comunicaçã­o Externa, que é o órgão gestor do contrato de publicidad­e, definindo, com a agência contratada, a estratégia de publicidad­e oficial da Casa. Ou seja, a função que ela exerce se dá fora do processo de licitação.”

Por meio de email enviado à Câmara, a Folha dirigiu questionam­ento a Gislaine sobre o fato de ter sido contratada pelo pai do namorado, mas não recebeu resposta sobre este ponto específico.

A Câmara afirmou ainda que a Folha tem sido uma “das beneficiár­ias dos contratos de publicidad­e”. Segundo a Casa, desde 2017, a despesa efetiva com o contrato de publicidad­e “caiu substancia­lmente a um terço do valor total”. “Esta foi uma das medidas de redução de gastos implantada­s pela atual Presidênci­a da Câmara”, diz. No último ano foram gastos R$ 8,5 milhões dos R$ 26 milhões estimados.

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