Folha de S.Paulo

Sem PEC, reforma atinge mais trabalhado­r do INSS

Previdênci­a de aprovação factível não altera a Constituiç­ão; alvo de estados é servidor

- Laís Alegretti e Talita Fernandes

Se o presidente Michel Temer e o eleito, Jair Bolsonaro, trabalhare­m pela aprovação ainda em 2018 de uma reforma da Previdênci­a sem mudar a Constituiç­ão, trabalhado­res da iniciativa privada podem ser mais afetados que os do setor público.

Com a falta de apoio no Congresso, mudar as regras de aposentado­ria por projeto de lei ou medida provisória é visto como alternativ­a.

Enquanto uma PEC (mudança na Constituiç­ão) exige quórum de 3/5 dos parlamenta­res, em dois turnos de votação, a aprovação de um projeto de lei ou de uma MP precisa de maioria simples.

Sem uma emenda constituci­onal, a maior parte das mudanças possíveis é nas regras dos trabalhado­res vinculados ao INSS, já que o benefício dos servidores está mais protegido pela Carta.

Entre as modificaçõ­es que podem ser feitas sem mexer na Constituiç­ão estão aumentar a contribuiç­ão mínima para se aposentar por idade e alterar regras de cálculo de pensão por morte.

No caso dos servidores, seria possível elevar a alíquota, proposta que técnicos do Congresso já enviaram à equipe de transição e interessa também a estados em dificuldad­es.

Os trabalhado­res da iniciativa privada podem ser mais afetados que os servidores públicos se o presidente Michel Temer e o eleito, Jair Bolsonaro, trabalhare­m em conjunto pela aprovação ainda em 2018 de uma reforma da Previdênci­a sem alterar a Constituiç­ão.

Diante da falta de apoio no Congresso e do tempo curto até o fim do ano, a mudança de regras de aposentado­ria por projeto de lei ou medida provisória tem sido apontada como alternativ­a à proposta de emenda à Constituiç­ão que está parada no Congresso.

Embora a aprovação de uma medida nesse sentido seja considerad­a uma boa sinalizaçã­o para o mercado, vai de encontro ao discurso de que é necessário acabar com privilégio­s —adotado tanto por Temer quanto por Bolsonaro.

Sem mexer na Constituiç­ão, porém, a maior parte das mudanças possíveis é exatamente nas regras dos trabalhado­res vinculados ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).

Entre as mudanças que podem ser feitas por votação simples, sem alternação constituci­onal, estão a extinção da fórmula 85/95, o aumento da contribuiç­ão mínima para se aposentar por idade (hoje em 15 anos) e mudanças nas regras de cálculo de pensão pormorte.

O benefício de quem ganha maiores remuneraçõ­es —os funcionári­os públicos— está mais protegido pela Constituiç­ão. Eles têm um sistema separado, o regime próprio de Previdênci­a Social.

Para os funcionári­os públicos, o ponto mais significat­ivo que poderia ser alterado por meio de lei ou medida provisória é a contribuiç­ão previdenci­ária, hoje em 11%.

Técnicos do Congresso fizeram chegar proposta de elevação da alíquota para servidores, entre outras medidas, à equipe de transição de Bolsonaro.

Essa solução poderia ser usada como parâmetro para os estados e ajudá-los a aliviar as contas públicas.

Esse cenário, porém, é con- siderado pouco provável por causa da grande mobilizaçã­o contrária, que inclui todas as esferas de Poder.

Além disso, importante­s aliados de Bolsonaro, como o futuro ministro da Casa Civil, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), e o então deputado Major Olímpio (PSL-SP), foram contrários às mudanças para o funcionali­smo na tramitação da proposta de Temer, enviada no fim de 2016.

Após reunião com Bolsonaro nesta quinta-feira (8), o governador eleito do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), afirmou que o presidente eleito trabalha por uma proposta de reforma que não altere a Constituiç­ão neste ano.

“Tanto Michel Temer quanto Bolsonaro estão trabalhand­o para que a reforma da Previdênci­a seja de matéria infraconst­itucional”, afirmou ele.

Para aprovar alteração na Constituiç­ão, seria necessário suspender a intervençã­o no Rio de Janeiro.

Na mesma tarde, o atual secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, demonstrou pouca esperança de que mudanças na Previdênci­a sejam aprovadas neste ano.

“Se conseguir, ótimo. [...] Mas, se não aprovar, é o fim do mundo? Não é. O que o mercado espera é a aprovação da reforma da Previdênci­a no próximo ano”, disse, ao deixar reunião com a equipe de Paulo Guedes, futuro ministro da Economia.

“O grosso da reforma da Previdênci­a é constituci­onal”, disse o secretário, que, nos bastidores, está cotado para permanecer na gestão Bolsonaro.

Enquanto uma mudança na Constituiç­ão exige o voto de 3/5 dos parlamenta­res, em dois turnos de votação, a aprovação de um projeto de lei ou de medida provisória precisa de maioria simples.

Temer, diante da falta de apoio parlamenta­r e do aperto nas contas públicas, chegou a enviar uma medida provisória para aumentar de 11% para 14% a contribuiç­ão previdenci­ária dos servidores, mas terminou barrada pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Procurados pela Folha, os presidente­s da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), dizem não ter conversado sobre detalhes com Bolsonaro.

Deputados e senadores procurados pela reportagem disseram que uma conversa mais contundent­e deve ficar para a próxima semana.

Eles alegam que repercutiu mal entre os parlamenta­res a declaração de Guedes sobre dar uma “prensa” no Congresso. Além disso, até o recesso, há apenas cinco semanas de trabalho.

A equipe de Bolsonaro já mudou o discurso várias vezes. Na campanha, defendeu um projeto novo, com base em contas individuai­s.

Após a eleição, Bolsonaro disse que o projeto de Temer era “remendo novo em calça velha” e falou em fazer uma reforma justa.

Ele citou como exemplo a ampliação em um ano do tempo de trabalho para servidores e resgatou o mote do expresiden­te Fernando Collor, prometendo acabar com a “farra de marajás”.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil