Final de 1976 entre River e Boca ainda gera polêmica
Até março deste ano, antes de os rivais decidirem a Supercopa Argentina, só um gol havia sido marcado em uma final disputada entre Boca Juniors e River Plate. Gol controverso de uma partida tensa, histórica e que, depois daquele 22 de dezembro de 1976, ninguém mais pôde ver novamente.
Não há registros em vídeo da cobrança de falta de Rubén Suñé, que decidiu o Nacional há 42 anos, com vitória do Boca por 1 a 0. A partida foi transmitida ao vivo para o país, mas o que aconteceu com a fita (desaparecida) é alvo de várias teorias, nenhuma delas comprovada.
O único fato concreto é que o jogador do Boca cobrou a falta enquanto o goleiro do River, Ubaldo Fillol, ainda arrumava a barreira. Fez o gol.
Neste sábado (10), as duas equipes fazem, em La Bombonera, a primeira partida da decisão da Libertadores, e apenas a segunda final relevante na história envolvendo uma das maiores rivalidades sul-americanas.
Na Supercopa de 2018, o River Plate venceu o rival por 2 a 0 e sagrou-se campeão, mas trata-se de um troféu recente e de pouca expressão.
“Fiquei com tanta raiva que me lembro muito pouco daquele jogo. Não merecíamos perder. Nosso time era melhor que o do Boca. Bem melhor”, relembra à Folha o goleiro Fillol, que oito anos depois foi jogar no Flamengo.
O sentimento amargo em relação àquela partida é compartilhado pelo colega de equipe Leopoldo Luque, campeão com Fillol da Copa do Mundo de 1978 pela seleção.
“Me sinto um pouco culpado [pelo lance]. Cheguei a dar um pique, estava quase chegando na bola para evitar que [Suñé] fosse chutar, mas ele cobrou”, diz Luque. “Que se perca dessa maneira, ainda mais em um clássico, é frustrante.”
A edição especial da revista argentina El Gráfico sobre o título do Boca, publicada em 28 de dezembro de 1976, traz a imagem do árbitro Arturo Ithurralde levantando os braços e autorizando a cobrança de falta.
A revista também procura esclarecer uma outra polêmica daquele jogo: um suposto pênalti do goleiro do Boca, Hugo Gatti, sobre Luque.
Na seção dedicada ao lance, com fotos do momento no qual Gatti derruba o atacante, a El Gráfico diz no texto de apoio das imagens: “Gatti vai para o chão e chega primeiro na bola, tocando para um dos lados. Não houve infração.”
Mais de 40 anos depois, Leopoldo Luque segue irredutível quanto ao lance e defende que sofreu a penalidade.
“Fui arrancando com a bola e ia chutar, mas não consegui. Ele me toca e, bem... foi dentro da área. Seu braço pega no peito do meu pé direito e me derruba”, afirma o exatleta do River Plate.
O 1 a 0 deu ao Boca o título do Nacional, que se juntou ao Metropolitano conquistado no primeiro semestre para consagrar o bicampeonato em 1976 sob o comando do técnico Juan Carlos Lorenzo.
Rubén Suñé, que ainda não tinha feito nenhum gol em toda a temporada, marcou seu primeiro e único naquele ano justamente diante do arquirrival. O suficiente para imortalizá-lo na história do Boca.
Hoje, o ex-camisa 5 tem uma estátua no hall de entrada da Bombonera, ao lado de outros grandes ídolos como Diego Maradona, Juan Román Riquelme e Martín Palermo.
“Foi uma das melhores noites da minha vida. Durante todo o ano eu não havia marcado um gol, e esta noite coube a mim marcar o que nos dá o campeonato”, afirmou Suñé à El Gráfico, ainda nos vestiários do estádio Cilindro, em Avellaneda, antes de seu último banho como um mero mortal nas páginas da maior rivalidade da Argentina.
Último encontro pela Libertadores teve uso de gás e foi suspenso
Na última vez em que Boca Juniors e River Plate se enfrentaram pela Copa Libertadores, a partida acabou antes do apito final, e a resolução sobre o clássico virou caso de tribunal.
Em duelo pelas oitavas de final do torneio em 2015, o River venceu o jogo de ida por 1 a 0, no Monumental de Nuñez, e foi à Bombonera precisando apenas de um empate para garantir a classificação. As equipes foram para o intervalo com 0 a 0 no placar e, no retorno para o segundo tempo, começou a confusão.
Um torcedor do Boca encontrou uma brecha na grade da arquibancada e espirrou gás de pimenta na direção do túnel inflável que fazia o acesso do vestiário visitante ao campo.
Alguns jogadores do River Plate voltaram ao gramado enjoados e com os olhos vermelhos, irritados pela ação do gás. A partida ficou paralisada por mais de uma hora, até que as autoridades decidiram suspender o clássico.
A decisão sobre como resolver o prosseguimento do jogo, então, foi para os tribunais.
Dois dias depois, a Conmebol informou que o Boca Juniors estava eliminado da Copa Libertadores por conta do incidente. Além da eliminação, precisou arcar com uma multa de US$ 200 mil (cerca de R$ 598 mil) e um jogo com portões fechados na Libertadores do ano seguinte.
O River se classificou para as quartas de final e, posteriormente, conquistou o título, seu terceiro na história.
As torcidas se provocam até hoje pelo episódio do gás. A Borrachos del Tablón, principal organizada do River, diz que o Boca “usou o gás e abandonou a Copa”, além de ter “chorado por ver o torneio pela televisão”.
Já a La Doce, barra brava do Boca, retruca dizendo que quem abandonou foi o rival, que “ganhou a Copa no Paraguai”, em referência ao local da sede da Conmebol, onde foi decidida a suspensão do clube da Copa Libertadores.