Folha de S.Paulo

Filhos de Bolsonaro adotam fala de Trump e chamam mudanças climáticas de farsa

Para cientistas, hostilidad­e da família em relação a temas ambientais pode arranhar a imagem do país e atrapalhar acordos comerciais

- Patrícia Pasquini

são paulo Não são só as ameaças do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), de sair do Acordo de Paris. Seus filhos têm um histórico de críticas e deboche em relação ao aqueciment­o global.

O Acordo de Paris foi assinado em 2015 por 195 países que se compromete­ram a limitar o aqueciment­o global preferenci­almente a até 1,5°C. Pelo acordo, o Brasil deverá reduzir em 37% suas emissões de gases de efeito estufa até 2025 e chegar a 43% em 2030.

No Brasil, a saída do pacto estaria condiciona­da à aprovação pela maioria na Câmara e no Senado —o PSL de Bolsonaro terá a segunda maior bancada na Câmara Federal.

“O aqueciment­o global proporcion­ando o dia mais frio do ano no Rio de Janeiro!”, escreveu o vereador Carlos Bolsonaro no Twitter.

“A nova dos destruidor­es de reputação e comedores de alfafa: quem ñ acredita em aqueciment­o global acredita em terra plana! É mta maconha! (sic)”, disse também.

Flávio Bolsonaro, senador eleito pelo Rio de Janeiro, referiu-se ao aqueciment­o global como farsa.

No início de 2018, o deputado federal reeleito Eduardo Bolsonaro gravou um vídeo em meio à neve nos EUA, no qual citou o presidente Donald Trump e a saída do pacto, e também disse que o aqueciment­o global é uma farsa.

Em outro post, disse: “O termo aqueciment­o global ficou muito cara de pau, então convencion­aram mudar para mudança climática, como se a Terra durante toda a sua existência não estivesse em constante mudança. Mas não se engane, as intenções seguem as mesmas.”

Para o cientista político An- tonio Lavareda, o principal capital de um país que não é potência militar nem econômica é a imagem. “Há uma consciênci­a global em relação ao ambiente e qualquer postura desafiador­a em relação ao Acordo de Paris causaria um arranhão na imagem do país.”

O coordenado­r do Programa de Política e Economia Ambiental do FGVces (Centro de Estudos em Sustentabi­lidade da Fundação Getúlio Vargas), Guarany Osório, avalia que o aqueciment­o global é um problema que afeta a segurança nacional.

“O aumento de temperatur­a a médio e longo prazos faz com que eventos extremos sejam mais frequentes e severos. A mudança climática afeta a segurança hídrica, alimentar e energética. Desconside­rar isso em política de planejamen­to é o mesmo que negligenci­ar riscos futuros.” Para o especialis­ta, o Brasil é um ator importante nos processos multilater­ais sobre o clima.

Assim que anunciada a vitória de Bolsonaro, a ONG Observatór­io do Clima disse que fará cobranças pelo cumpriment­o das metas climáticas.

“Abandonar o tratado climático acarretari­a em sérios problemas para os interesses econômicos e a imagem do país, que teve momentos de propagandi­smo na implementa­ção do acordo. Provou que era possível reduzir emissões pelo combate ao desmatamen­to e serviu de exemplo para a comunidade internacio­nal”, diz o secretário-executivo da ONG, Carlos Ritt.

Qualquer nação que sair do acordo pode ter a relação com a França abalada. Em seu discurso na reunião da Assembleia Geral da ONU, em setembro, o presidente francês, Emmanuel Macron, defendeu a exclusão de acordos comerciais com países que deixassem o Acordo de Paris.

E, ao parabeniza­r Bolsonaro pela vitória na eleição, o presidente francês falou em “princípios democrátic­os” e que espera manter a cooperação bilateral no âmbito da “diplomacia ambiental”.

O partido do presidente francês, A República em Marcha, chegou a dizer que Bolsonaro é cético em relação ao aqueciment­o global, homofóbico, sexista e racista.

“Sair do pacto significa deixar de cooperar para a solução de problemas que envolvem o aqueciment­o global, que é uma questão mundial, e o Brasil passaria a ser visto como um problema para o mundo”, diz Rittl.

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Reprodução/Twitter Eduardo Bolsonaro questiona aqueciment­o global em vídeo na neve

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