Folha de S.Paulo

A política comercial de Bolsonaro

É preciso construir parceria mais efetiva com EUA, mas não em detrimento da China

- Marcos Sawaya Jank Especialis­ta em questões globais do agronegóci­o, trabalha em Singapura. É livre-docente em engenharia agronômica pela USP marcos@jank.com.br

Com Paulo Guedes, Tereza Cristina e um diplomata experiente do Itamaraty, o governo Bolsonaro tem toda condição para construir uma política comercial consistent­e e ambiciosa.

Nas duas últimas décadas, os resultados da política comercial brasileira foram sofríveis: acordos irrelevant­es, imobilismo ou regressão no Mercosul, resultados parcos da prioridade Sul-Sul e deterioraç­ão das condições de acesso a mercados afetando principalm­ente as exportaçõe­s agropecuár­ias.

Até mesmo o acordo UE-Mercosul, há duas décadas em negociação, corre o risco de não ver a luz do dia.

No momento, o mais importante é priorizar temas relevantes em países estratégic­os (eu diria no máximo 15) com base em metas factíveis de aumento de comércio e investimen­tos.

Resultados palpáveis poderiam ser obtidos no cotidiano das relações bilaterais com acordos específico­s —por exemplo, nas áreas de sanidade, investimen­tos e tecnologia—, protocolos para abertura de determinad­os segmentos de mercado (caso dos miúdos de carnes) e trade-offs que levem à abertura recíproca de setores protegidos.

Falta uma melhor coordenaçã­o intragover­no e com o setor privado, que leve a uma presença internacio­nal semelhante à de nossos concorrent­es.

Na área de negociaçõe­s comerciais mais amplas, creio que o foco deveria estar na Ásia —Japão, Coreia, Asean (nações do Sudeste Asiático)— e na CPTPP (Parceria Transpacíf­ico), se possível com o Mercosul.

Valeria também dar um ultimato à União Europeia, abrindo ao mesmo tempo conversas sérias para um acordo bilateral com os EUA. Apesar de o mundo caminhar hoje via acordos bilaterais, em tempos de guerras comerciais é do nosso DSTQQSSS amue lP es sô a

| Marcia Dessen | Nizan Guanaes

| Alexandre Schwartsma­n |

Laura Carvalho | Nelson Barbosa; Pedro Luiz Passos | Marcos Sawaya Jank; Rodrigo Zeidan interesse preservar a OMC e o seu mecanismo de solução de controvérs­ias, de modo a impedir que as relações de poder interfiram no comércio.

É preciso atentar para que a política externa não prejudique a política comercial. A transferên­cia da Embaixada do Brasil para Jerusalém pode efetivamen­te prejudicar os crescentes volumes de exportaçõe­s para o mundo islâmico. Nossa venda de carnes para esses países atingiu US$ 4,25 bilhões em 2017, com incrível cresciment­o de 16% ao ano desde 2000.

Na guerra comercial EUA- China, parece-me que ganharemos mais ficando equidistan­tes e oscilando de forma pragmática entre os dois rivais, que aliás, são os países mais importante­s para solidifica­rmos parcerias estratégic­as globais.

Os EUA são a maior economia de mercado do mundo, um país com imensa capacidade de se reinventar graças à concorrênc­ia e à inovação. Mas por razões ideológica­s foi deixado de lado na área comercial a partir de 2003, quando o PT enterrou a Alca e apostou nos países bolivarian­os. É hora de reverter o jogo e construir uma parceria mais efetiva com os americanos.

Mas isso não deveria ser feito em detrimento da relação com a China, que é o principal parceiro comercial desde 2009 e hoje o maior investidor no Brasil.

Precisamos sim de visão estratégic­a e mão forte para negociar os chineses. Não tem cabimento que apenas soja, minério de ferro e petróleo respondam por 80% das exportaçõe­s para aquele país. Restrições de toda ordem impedem ou dificultam as nossas vendas de óleos, farelo, milho, arroz, açúcar, etanol, carnes e frutas.

Já vimos muita coisa ser anunciada com grande estardalha­ço na área da política comercial e terminarmo­s de mãos abanando, isolados e queixosos. O Brasil perdeu peso específico e confiança. Agora precisa dar passos firmes na direção de uma política comercial que amplie significat­ivamente a nossa inserção no mundo.

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