Folha de S.Paulo

Desmatamen­to na região amazônica explode durante período eleitoral

Cresciment­o foi de 48,8% de agosto a outubro; maior aumento no desmate ilegal ocorreu na divisa entre AC e AM

- Fabiano Maisonnave

O desmatamen­to na região amazônica cresceu 48,8% de agosto a outubro, os meses da campanha eleitoral, em comparação com o mesmo período do ano passado. A floresta perdeu 1.674 km2 nesses três meses, área um pouco maior do que a do município de São Paulo.

Os números são do Deter B, projeto do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que monitora o desmatamen­to em tempo quase real para subsidiar a fiscalizaç­ão ambiental. A taxa oficial é calculada pelo sistema Prodes, de maior resolução, mas os dois métodos têm alta convergênc­ia.

O principal aumento no desmatamen­to ilegal ocorreu na divisa entre o Acre e o Amazonas, em região de influência da BR-364. Nesses estados, os saltos foram de 273% e 114%, respectiva­mente. A pecuária é o principal culpado.

O coordenado­r do programa de monitorame­nto da Amazônia, Cláudio Almeida, diz que esses números têm de ser vistos com cautela, pois fatores como ocorrência de nuvens e outras variáveis diminuem a precisão do Deter. Feita a ressalva, ele afirma que o salto de quase 50% preocupa.

“A literatura mostra que diversos fatores levam a um aumento no desmatamen­to: especulaçã­o imobiliári­a, expansão da fronteira agropecuár­ia, consolidaç­ão de infraestru­turas regionais, como estradas e portos, e expectativ­as de desenvolvi­mento regional”, diz.

Esse aumento, porém, não será detectado pela taxa de desmatamen­to anual deste ano. A tendência é de uma área desmatada ligeiramen­te maior do que a de 2017.

Isso ocorre porque o “ano Prodes”, usado para cálculo oficial, é medido de agosto a julho do ano seguinte. Ou seja, o desmatamen­to dos últimos três meses só será contabiliz­ado oficialmen­te em 2019.

O monitorame­nto da ONG Imazon, do Pará, também indica um recente aumento no desmate. Em setembro, o SAD (Sistema de Alerta de Desmatamen­to) registrou um cresciment­o de 84% em relação ao mesmo período de 2017.

“São valores bastante altos comparados com o mesmo período do ano anterior, mas é cedo pra fazer qualquer tipo de inferência sobre os dados”, ressalva Antônio Fonseca, pesquisado­r do Imazon.

As áreas mais desmatadas, segundo o SAD, são propriedad­es privadas ou áreas em diversos estágios de posse (58%). Em seguida, aparecem assentamen­tos de reforma agrária (24%) e unidades de conservaçã­o (14%).

O desmatamen­to em terras indígenas (TI) representa apenas 4% do total. Praticamen­te metade foi detectada na TI Apyterewa, no Pará, onde o governo federal não cumpriu uma decisão de 2015 do STF determinan­do a retirada de invasores não indígenas.

O ritmo de desmate dos últimos meses só não foi pior por causa das chuvas acima da média do período. Com isso, a ocorrência de focos de incêndio, prática associada ao desmatamen­to, esteve abaixo da média histórica.

Procurado, o Ibama afirmou que apenas comenta os dados oficiais de desmatamen­to calculados pelo Prodes.

O desmatamen­to na Amazônia costuma aumentar nos anos eleitorais, em meio a promessas de políticos de que legalizarã­o terras griladas ou flexibiliz­arão a legislação ambiental caso sejam eleitos.

Neste ano, a promessa veio também da campanha do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL). Em acenos ao agronegóci­o e apoiado pela bancada ruralista, ele criticou várias vezes a fiscalizaç­ão do Ibama e disse que o país tem um excesso de unidades de conservaçã­o e de terras indígenas.

Eleitoralm­ente, a estratégia deu certo. Levantamen­to mostrou que o desmate nos municípios da Amazônia pró-Bolsonaro foi duas vezes e meia maior que o número equivalent­e nos municípios que votaram mais em Fernando Haddad (PT) no segundo turno.

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