Estou a ficar vintage
O prêmio que o mundo dá às pessoas que não jogam nada fora
Às vezes eu vejo um carro novo e penso: “Olha só: um carro novo”. Porque sou uma pessoa interessante e complexa. Mas depois passam alguns anos, volto a cruzar-me com o mesmo modelo de carro, e o que antes era novo, nessa altura, parece antiquado.
Mais uns anos passam e o carro deixa de parecer antiquado, já é outra coisa: é um clássico. O carro continua sendo exatamente
DS o mesmo, no entanto.
Tempo passou sobre ele e sobre mim. E eu não vi o tempo passar, só vi esses sinais. Mas porque é que o tempo faz questão de mudar a minha opinião sobre um Volkswagen? Em que dia (hora?, minuto?, segundo?) o carro deixou de me parecer novo e passou a ser velho?
E quando ficou subitamente um clássico? Sempre que vejo alguém dirigindo um carro
Daniel Furlan clássico, pergunto: “Será que esta pessoa, quando comprou o carro, em 1960, já sabia que estava a adquirir um clássico de 2018? E quantos anos ela teve de dirigir um carro velho até um dia sair da garagem e constatar: ‘que curioso, eu tenho é um clássico’?”
Acontece quase o mesmo à roupa. Várias peças passam duas vezes pelo nosso guardaroupa. Primeiro a gente vai à loja comprá-las, quando são novas. Depois usa, elas vão ficando velhas, saem de moda, e a gente oferece, ou joga fora. E, vinte anos depois, vamos a outras lojas comprálas de novo, porque são vintage. O vintage é o prêmio que o mundo dá às pessoas que não jogam nada fora. Durante anos elas são feias crisálidas que acumulam tralhas; de repente são lindas borboletas