Vilão Grindelwald espelha ascensão nacionalista
Personagem de Johnny Depp em ‘Animais Fantásticos 2’ acredita na superioridade dos bruxos e tem affair com Dumbledore
Ambientado na Paris do fim da década de 1920, “Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald”, segundo filme da saga derivada do universo Harry Potter, utiliza o vilão interpretado por Johnny Depp para refletir a ascensão ultranacionalista na Europa e as ações que levaram o continente ao nazismo e à Segunda Guerra Mundial.
Gellert Grindelwald, personagem de um Depp com cabelos esbranquiçados de tão loiros, é um fugitivo do Ministério da Magia com ideias radicais de superioridade dos bruxos de sangue puro e de opressão dos trouxas —como os humanos normais são conhecidos no mundo criado pela escritora J. K. Rowling. No longa que estreia nesta quinta-feira (15), ele divide a comunidade mágica de uma maneira nunca vista na série.
“Grindelwald é um vilão muito mais interessante e assustador que Voldemort”, diz o produtor inglês David Heyman, que está na franquia desde o primeiro filme, “Harry Potter e a Pedra Filosofal” (2001).
“Voldemort era o mal puro, um sociopata incapaz de amar ou ter sentimentos. Já Grindelwald é perigoso porque seus argumentos fazem sentido: por que os bruxos deveriam se esconder da sociedade? É uma ideia sedutora, mas sabemos as consequências desse pensamento se ele assumir o poder.”
Heyman afirma que o filme é “o mais adulto” da série Harry Potter, mas o protagonista Eddie Redmayne, dono do papel do estudioso bruxo Newt Scamander, lembra que não é uma “declaração política”.
“Há paralelos com os tempos atuais, mas Jo [como os atores se referem a Rowling] escreveu o roteiro há três anos. Como uma artista genial, ela nos abraça e coloca um espelho na nossa frente, capturando a situação do mundo com antenas mais sensíveis. Mas espero que a política não fique na cabeça do espectador o tempo todo. Queremos só que encoraje as pessoas a ter uma cabeça ativa em relação ao que está acontecendo ao nosso redor.”
É neste espírito que encontramos Scamander em “Animais Fantásticos 2”. Amante da fauna e da flora do mundo mágico, ele não deseja revirar Paris em busca de Grindelwald e prefere ficar no seu zoológico particular —até algo mudar sua posição. “Newt é um renegado que só sente empatia por outras criaturas. Ele criou um casulo e acha que não precisa sair para o mundo”, conta Redmayne à Folha.
“O problema surge porque os riscos para esse mundo se tornaram extremos e ele precisa tomar partido. O personagem percebe que não basta apenas ser uma pessoa boa, mas entrar na luta e tomar decisões fortes.”
Apesar dos temas grandiosos, a continuação também traz vários elementos para os fãs de Harry Potter com a aproximação natural dos dois universos. Além da aparição de personagens como Minerva McGonagall e Nicolas Flamel, o filme lida pela primeira vez com a homossexualidade de Dumbledore (agora vivido por Jude Law), revelada em 2007 por Rowling.
De maneira sutil, descobrimos que a relação dele com Grindelwald era “maior que uma amizade”. “Não acho que estamos escondendo a homossexualidade de Dumbledore. Acho que está claro que havia uma relação de paixão ali, mas será amor de verdade ou uma manipulação por parte de Grindelwald?”, afirma David Heyman.
“Precisamos ter calma, pois é uma história contada ao longo de cinco filmes. Achei que é uma cena linda e suficiente para nos levar para o resto da jornada.”
Thales de Menezes
“Animais Fantásticos e Onde Habitam” chegou aos cinemas em 2016 com o jogo ganho. Os adeptos de Harry Potter ainda lamentavam o fim dos filmes do bruxinho, então uma nova saga escrita por J. K. Rowling, ambientada algumas décadas antes no universo do personagem, veio amenizar a crise de abstinência dessa legião de fãs.
Estreia agora o segundo dos cinco filmes prometidos na saga. Em “Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald”, o magizoólogo Newt Scamander é convocado por seu professor em Hogwarts, Alvo Dumbledore, para perseguir o mago das trevas Gellert Grindelwald, que foge do Congresso Mágico dos EUA.
De certa forma, o novo longa pode ser considerado uma espécie de “O Império ContraAtaca” da franquia “Animais Fantásticos”.
Como o segundo filme de “Star Wars” lançado nos cinemas, é mais movimentado que o primeiro e tem maior dose de efeitos visuais, desenvolvimento de personagens interessantes e, principalmente, um final que deixa várias pontas desamarradas para o próximo longa da série.
O filme não é nada didático. Quem resolver vê-lo sem conhecer o primeiro irá ficar perdido entre os dois lados que duelam no submundo dos bruxos na década de 1920. E a narrativa inconclusiva depois de duas horas de sessão pode frustrar os desavisados.
Definitivamente uma obra para iniciados, “Os Crimes de Grindelwald” chega mais perto do ritmo e do encanto de Harry Potter. Deve muito ao roteiro “montanha-russa”, jargão antigo do cinema para filmes que têm ação ininterrupta, e, principalmente, aos atores encarregados dos personagens fundamentais da trama.
Eddie Redmayne ainda é uma incógnita. Supervalorizado com um Oscar prematuro e imerecido para sua personificação do cientista Stephen Hawking em “A Teoria de Tudo”, alterna bons desempenhos (“Sete Dias com Marilyn”) e atuações desastrosas (“O Destino de Júpiter”).
Como o herói Newt Scamander, empresta fragilidade e timidez quase nerd ao jovem que carrega seus animais fantásticos numa pequena mala. Os bichos são suas armas nas situações de perigo. Com o perdão dos fãs de J. K. Rowling, a essência do personagem lembra um pouco a animação “Pokémon”.
Mas Redmayne corre o risco de virar coadjuvante numa saga que tem dois atores acostumados a arrebatar plateias. Johnny Depp, como Grindelwald, e Jude Law, no papel de Dumbledore, fazem um duelo de charme que ganhará destaque no próximo filme da franquia. Os dois passam a impressão de estarem se divertindo muito no set.
Apagado em cena está Ezra Miller, o Flash do recente “Liga da Justiça”. É outro que interpreta um tipo que deve crescer na trama da saga, o órfão Credence Barebone, bruxo poderoso que Dumbledore quer a seu lado.
Assim, prometendo mais intensidade dramática nos longas futuros, “Os Crimes de Grindelwald” fica como um episódio intermediário na franquia. Sem o ineditismo de um novo mundo préHarry Potter, revelado no filme de 2016, essa sequência é uma sucessão de bons pegas entre criaturas fantásticas, que até disfarçam um roteiro simplório. Que venha o terceiro, suplicam os pottermaníacos.