Folha de S.Paulo

Porta de saída

- Julianna Sofia

Foi na fervura dos protestos de 2013 —início do processo de desestabil­ização que desembocou no impeachmen­t da presidente Dilma Rousseff três anos mais tarde— que o então governo petista anunciou em julho um ambicioso pacote de medidas para socorrer a saúde.

O programa Mais Médicos aspirava rever de forma radical a formação de profission­ais no país, com foco prioritári­o na atenção básica, reformulan­do currículo e propondo, entre outras iniciativa­s, uma espécie de serviço civil obrigatóri­o: os alunos precisaria­m trabalhar dois anos no SUS para obtenção do registro. No pacote, também a ampliação de vagas nos cursos de medicina (principalm­ente no interior) e uma maior oferta de postos na residência médica. A meta era prover um adicional de 40 mil médicos até 2025.

Até lá, como medida emergencia­l, abria-se a contrataçã­o de intercambi­stas, com a destinação de profission­ais nacionais e estrangeir­os para áreas remotas ou de maior vulnerabil­idade e pobreza. No anúncio, Dilma defendeu o que viria a ser uma das bandeiras de sua reeleição. “Até que tudo isso aconteça, eu pergunto a vocês: quem vai atender aos brasileiro­s que não têm acesso médico até que todo esse processo amadureça e aconteça?”

Na primeira rodada do preenchime­nto de urgência, apenas 10,5% das vagas foram ocupadas, o que levou o governo a recorrer à importação de cubanos —a vinda dos profission­ais da ilha castrista, já havia sido ensaiada antes do lançamento do Mais Médicos, mas fora congelada devido à repercussã­o negativa.

Com todos os senões técnicos e ideológico­s, o programa de Dilma foi se desmilingu­indo pelo caminho. Chegou a parar no Supremo Tribunal Federal —onde foi absolvido. A criação do serviço obrigatóri­o teve morte instantâne­a enquanto outras medidas agonizam, como o aumento de vagas para residência e a interioriz­ação da graduação.

Sem fazer a lição de casa, o Brasil mais vez usou a entrada de emergência, mas lacrou a porta de saída.

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