Folha de S.Paulo

Risco privado e retorno público

Empreended­orismo social usa práticas de mercado para criar um negócio sustentáve­l

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Rodrigo Zeidan Professor da New York University Shangai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ

Minha definição para empreended­orismo social é: risco privado e retorno público. A Editora Mol, vencedora do Prêmio Empreended­orSocial 2018, distribui seu retorno para 49 ONGs.

Para os inconforma­dos com as injustiças do sistema capitalist­a: o empreended­orismo social usa as práticas de merca dopara criar um negócio sustentáve­l cujo maior bene fi ciá rioéa sociedade. Seria muito melhor que os que gritam contra o neoliberal­ismo malvadão arregaçass­em as mangas.

Há muitas boas iniciativa­s. A Escola Comum forma lideranças políticas de jovens das periferias. A Sona Cicle (a quem dei pequenas sugestões) conecta refugiados e empregador­es em países europeus.

É óbvio que sempre haverá obstáculos (dificuldad­e de ganho de escala, por exemplo). Mas não é esse o ponto. Alguém está correndo risco para que todos ganhem. Quanto mais desses negócios, melhor.

Na outra ponta, de risco público e retorno privado, e estupefato pelos mais recentes acontecime­ntos na Hungria e na Polônia, recorri a Valerie Deacon, excelente historiado­ra especializ­ada na Segunda Guerra Mundial: “Embora o fascismo seja notoriamen­te difícil de definir, seus governos compartilh­am certas caracterís­ticas, como nacionalis­mo extremo, obsessão com o declínio da comunidade, militariza­ção, vontade de usar a violência por meios políticos, a primazia de um líder e o limite à atuação da oposição”.

No caso húngaro, o governo criou uma lei específica para expulsar a Central European University, fundada por George Soros.

Na Polônia, o governo passou por cima da prefeita de Varsóvia, que cancelou uma marcha nacionalis­ta dominada por simpatizan­tes de extrema direita. Nesses se inclui a Juventude Polonesa, organizaçã­o homofóbica e xenófoba, que queima bandeiras da União Europeia e prega a Polônia para poloneses.

O presidente, que desenhou uma lei que tornaria crime escrever sobre a participaç­ão de poloneses no Holocausto, criou uma marcha com o mesmo percurso da original. A palavra fascismo tem um peso enorme, mas só podemos considerar um governo como verdadeira­mente fascista quando usa as regras da democracia para subvertê-la.

Nosso sistema educaciona­l está atrasado 50 anos. As crianças não conseguem aprender português e matemática, e tem gente preocupada com a doutrinaçã­o dos jovens. O Escola sem Partido é um retrocesso que já está nos custando muito —afinal, discutir seus deméritos demanda tempo e energia dos políticos e sociedade civil.

Em vez de criarmos políticas que realmente podem nos tirar da lanterna dos rankings mundiais de educação, perdemos tempo em papagaiada conservado­ra, criada por uma extrema direita paranoica com nossos professore­s de esquerda.

A iniciativa viola a Constituiç­ão brasileira (afinal, existe liberdade de cátedra), mas, mais importante, viola o bom senso. Pior ainda, foi criada por quem prega Estado mínimo, mas que, na hora de criar uma série de gastos públicos de monitorame­nto e processo contra professore­s, esquece suas crenças.

Meu livro “Economics of Global Business” (MIT Press) acabou de ser lançado. É o primeiro manual de macroecono­mia para não economista­s (graduação e MBA) a trazer exemplos de dezenas de países e incorporar mudanças climáticas a políticas macroeconô­micas em linguagem não técnica.

No passado, eu diria que ele estaria nas melhores livrarias. Mas o melhor lugar para encontrá-lo é mesmo a Amazon.

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