Folha de S.Paulo

Eleitas bolsonaris­tas buscam espaço no governo

Entre aliados, avalia-se que prestígio de Bia Kicis e Joice Hasselmann é mais aparente que real

- Julio Wiziack e Marina Dias

Um telefonema da deputada eleita Bia Kicis (PRPDF) para Jair Bolsonaro na semana passada derrubou a indicação da educadora Maria Inês Fini para o Ministério da Educação.

Pessoas que presenciar­am a ligação ao lado do presidente eleito afirmam que, de início, ele não queria desistir de uma nomeação chancelada pelo general Augusto Heleno, homem de sua confiança e futuro ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucio­nal).

O general queria sua amiga no cargo pela experiênci­a acumulada por ela no comando do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educaciona­is do MEC. Mas não foi suficiente.

Bastou Kicis dizer que Maria Inês criou o Enem e lecionou na Unicamp, universida­de com muitos acadêmicos alinhados ao pensamento de esquerda e com quadros nas gestões petistas, que a educadora logo perdeu a vez.

Ex-procurador­a do Distrito Federal, Kicis faz dupla com a também deputada eleita Joice Hasselmann (PSL-SP) em busca de protagonis­mo e influência no novo governo: ambas são conselheir­as de Bolsonaro e tentam demonstrar poder mesmo sem cargos formais na transição.

No núcleo mais próximo ao presidente eleito, há quem diga que elas mais aparentam desfrutar de algum prestígio do que efetivamen­te vão ter a partir de janeiro.

Mas, em uma equipe com pouca experiênci­a política, as novas deputadas se apressam a ocupar espaço e têm se movimentad­o com desenvoltu­ra até aqui.

Kicis e Hasselmann podem se tornar ministras —e não escondem gostar da ideia—, mas, publicamen­te, dizem ter preferênci­a em ser combatente­s no Congresso, exercendo o mandato como espécie de missão em defesa do governo.

“Claro que isso depende de votação, mas minha ideia é presidir a CCJ [Comissão de Constituiç­ão e Justiça]. Agora, ninguém recusa uma convocação do presidente da República [para um ministério]”, disse Kicis à Folha.

Aos 57 anos, a advogada se aproximou de Bolsonaro como presidente do Instituto Resgata Brasil, que militou no Congresso em defesa de pautas como o voto impresso e a Escola sem Partido.

Foi ela quem costurou os contatos iniciais que levaram ao casamento entre Bolsonaro e seu guru, o economista Paulo Guedes, e esteva presente quando os dois se viram pela primeira vez, em 2017, no Rio.

Desde então, tem sido uma das mais presentes conselheir­as do presidente eleito, especialme­nte na indicação para cargos. “Eu falo o que acho mas, no final, a decisão é dele [Bolsonaro]”, disse.

Kicis também compartilh­a de algumas ideias de Guedes para a economia. Defende, por exemplo, o fortalecim­ento de estados e municípios sem medo de sofrer resistênci­a do funcionali­smo público federal, setor que, segundo ela, ajudou em sua eleição —obteve 86,4 mil votos.

Nas disputas no Congresso, quer que a presidênci­a da Câmara fique com um alguém que represente o “novo”, mas que não seja “novato”.

Já disse que não gostaria de ver Rodrigo Maia (DEM-RJ) reeleito ao comando da Casa e aposta em nomes como o do pastor João Campos (PRB-GO) e de Paulo Eduardo Martins (PSC-PR) para o posto.

No Senado, diante do favoritism­o de Renan Calheiros (MDB-AL) para presidir a Casa, Kicis diz acreditar em uma reviravolt­a. “Viemos ao poder porque o povo quer mudança. Maia na Câmara e Renan no Senado é mais do mesmo”.

Hasselmann, por sua vez, é mais pragmática e tem articulado por Maia.

Na quinta-feira (8), por exemplo, esteve com o presidente da Câmara para discutir a sucessão na Casa —função que seria de Onyx Lorenzoni, futuro ministro da Casa Civil e chefe da transição.

Garantiu que ajudaria o democrata a vencer resistênci­as dentro do PSL e que levaria o presidente do partido, Luciano Bivar, para uma visita à re- sidência oficial na próxima semana. Deixou boa impressão.

A jornalista de 40 anos teve cerca de 1 milhão de votos e já disse a pessoas próximas que não vê Maia como o candidato ideal. “É preciso cara limpa, experiênci­a e votos para comandar a Câmara”, afirma.

Mas a disposição de Maia —que teve pouco mais de 70 mil votos— de fazer avançar a agenda liberal de Bolsonaro na economia e sua capacidade de diálogo, inclusive com partidos da oposição, fez com que ele ganhasse pontos com Hasselmann.

O presidente eleito, por sua vez, sinalizou que não quer interferir nas disputas pelo comando da Câmara e do Senado, mas tem preferênci­a por outros nomes antes de Maia.

Na formação da nova Esplanada, Hasselmann também tenta mostrar alguma ingerência. Foi ela, por exemplo, quem apresentou Viviane Senna a Bolsonaro, ainda durante a campanha eleitoral, com a ideia de cacifá-la para a Educação. Nesta semana, Viviane esteve em Brasília com o presidente eleito, mas nenhum anúncio oficial foi feito.

A deputada eleita pelo PSL tem investido também na relação com a futura primeira-dama, Michelle. Prepara com ela o que auxiliares têm chamado de “surpresa” para a posse de Bolsonaro, em 1º de janeiro.

Sem constrangi­mento, transita entre as funções de mestre de cerimônia e coordenado­ra da agenda de Bolsonaro.

Há duas semanas, postada na antessala do gabinete de transição, tentou que o pastor Laurindo Shalom fosse recebido pelo presidente eleito.

Ele queria convidar Bolsonaro para um evento em homenagem a Nelson Mandela, na África do Sul, mas passou quase uma hora na espera, distribuin­do “shalom, shalom” para quem, diferentem­ente dele, tinha hora marcada com o capitão reformado. Não foi recebido e a bênção completa foi derramada apenas sobre Hasselmann, em hebraico.

“Minha ideia é presidir a CCJ [Comissão de Constituiç­ão e Justiça]. Agora, ninguém recusa uma convocação do presidente [para um ministério] Bia Kicis (PRP-DF) deputada federal eleita

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Pedro Ladeira/Folhapress A deputada federal eleita Joice Hasselmann (PSL-SP)

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