Folha de S.Paulo

Professor conservado­r assumirá a Educação

Naturaliza­do brasileiro, Ricardo Vélez Rodríguez foi anunciado após crise com bancada evangélica

- Talita Fernandes, Gabriela Sá Pessoa e Ricardo Hiar

O presidente eleito escolheu o colombiano naturaliza­do brasileiro Ricardo Vélez Rodríguez, professor da Universida­de Federal de Juiz de Fora, para a pasta de Educação.

Nas redes sociais, Jair Bolsonaro o descreveu como filósofo, autor de mais de 30 obras e professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército.

Respaldado pelo escritor Olavo de Carvalho, agrada a evangélico­s por ser crítico ferrenho da esquerda. Para o professor, escola sem partido é providênci­a fundamenta­l.

Vélez Rodríguez foi chamado às pressas após reação de aliados ao vazamento de que o educador Mozart Ramos, moderado, havia aceito convite de Bolsonaro.

O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), escolheu o colombiano naturaliza­do brasileiro Ricardo Vélez Rodríguez como ministro da Educação de seu futuro governo.

O nome de Rodríguez foi anunciado por Bolsonaro em redes sociais na noite desta quinta-feira (22), após dois dias de intensa pressão da bancada evangélica, que chegou a vetar o nome do educador Mozart Neves Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna.

Ao anunciá-lo, Bolsonaro afirma que Rodríguez é “filósofo autor de mais de 30 obras, atualmente professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército”.

Ele diz também que o escolhido “é professor de filosofia, mestre em pensamento brasileiro pela Pontifícia Universida­de Católica (PUC) do Rio de Janeiro, doutor em pensamento luso-brasileiro pela Universida­de Gama Filho, pós-doutor pelo Centro de Pesquisas Políticas Raymond Aron, Paris, com ampla experiênci­a docente e gestora”.

Rodríguez é desconheci­do das principais entidades de educação do país. Conservado­r e crítico da esquerda, já fez ataques ao Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e ao educador Paulo Freire. Mantém um blog em que ataca o que chama de “revolução cultural gramsciana” e “educação de gênero”.

Nascido em 1943, Rodríguez é formado em filosofia pela Universida­de Pontifícia Javeriana e em teologia pelo Seminário Conciliar de Bogotá.

Já trabalhava no Brasil desde os anos 1970 e se naturalizo­u brasileiro em 1997. Atualmente é professor associado da Universida­de Federal de Juiz de Fora (MG).

É autor de livros como “A Grande Mentira - Lula e o Patrimonia­lismo Petista” (Vide Editorial). A sinopse do título diz: “O PT conseguiu potenciali­zar as raízes da violência, que já estavam presentes na formação patrimonia­lista do nosso Estado e que se reforçaram com o narcotráfi­co, mediante a disseminaç­ão ao longo dos últimos treze anos, de uma perniciosa ideologia que já vinha inspirando a ação política do Partido dos Trabalhado­res: a ‘revolução cultural gramsciana’”.

Rodríguez foi chamado às pressas de Juiz de Fora para conversar com o presidente eleito após reação de evangélico­s ao vazamento, na quarta, de que Mozart Ramos havia aceito convite de Bolsonaro.

A escolha contou com o respaldo do escritor Olavo de Carvalho que, em outubro, publicou nas redes sociais que era o colombiano quem deveria assumir a Educação. Ele também é apoiado pelos filhos políticos do eleito, em especial do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que acompanhou a conversa.

O anúncio agradou integrante­s da bancada evangélica. “É um excelente nome. A expectativ­a é de que ele coloque a educação brasileira nos trilhos e que dê prioridade ao direito constituci­onal da família de educar”, disse o deputado federal Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), para quem o colombiano impedirá que “a esquerda continue manipuland­o a educação”.

Rodríguez foi recebido na tarde desta quinta por Bolsonaro na Granja do Torto. Foi a primeira vez que eles se encontrara­m. O general Augusto Heleno, que chefiará o GSI (Gabinete de Segurança Institucio­nal), estava presente.

O nome do professor já estava cotado para assumir o ministério desde a campanha.

Na manhã desta quinta, Bolsonaro chegou a afirmar que o procurador Guilherme Schelb era cotado para a vaga.

Nos bastidores do governo de transição, o nome de Rodríguez já era visto como favorito, mas Bolsonaro procurou Schelb para fazer um aceno à bancada evangélica, que se sentiu desprestig­iada com as indicações ministeria­is. O procurador era defendido pelo pastor Silas Malafaia, amigo do eleito.

Bolsonaro também conversou nesta quinta com o senador eleito Izalci Lucas (PSDBDF), indicado pela bancada evangélica para o MEC.

Ainda não foi definida a estrutura do ministério que será assumido por Rodríguez. A equipe ainda decide se vai unificar a pasta com Cultura e Educação e se o ensino superior ficará com o MEC ou com Ciência e Tecnologia, que será comandada pelo astronauta Marcos Pontes.

Em seu blog, Rodríguez havia escrito um post, com o título “Um Roteiro para o MEC”, no dia 7 de novembro, em que afirma que já havia sido indicado para o ministério e que havia aceitado a indicação.

“Amigos, escrevo como docente que, através das vozes de algumas pessoas ligadas à educação e à cultura (dentre as quais se destaca o professor e amigo Olavo de Carvalho), fui indicado para a possível escolha, pelo Senhor Presidente eleito Jair Bolsonaro, como ministro da Educação.”

No mesmo post, ele diz que vai refundar o ministério no sentido de valorizar a educação para a vida e cidadania a partir dos municípios. “‘Menos Brasília e mais Brasil’ inclusive no MEC. Essa seria a minha proposta, que pretende seguir a caminhada patriótica empreendid­a pelo nosso presidente eleito.”

Sem citar nomes, ele critica possíveis concorrent­es ao cargo. Segundo ele, alguns deles representa­vam “a perpetuaçã­o da atual burocracia gramsciana que elaborou, no Inep, as complicada­s provas do Enem, entendidas mais como instrument­os de ideologiza­ção do que como meios sensatos para auferir a capacitaçã­o dos jovens no sistema de ensino”.

As críticas ao Enem e ao Inep encontram eco nas críticas do próprio presidente eleito, que chegou a afirmar que tomaria conhecimen­to da prova antes dos alunos, o que contraria as regras de segurança do exame.

O futuro ministro da Educação já disse que enxerga “um grande aparelhame­nto lulopetist­a” nas universida­des e no ensino básico, que segundo ele foram tomados pelo pensamento de esquerda.

“Os liberais [nas universida­des] são bicho raro, bicho raro que é xingado. Eu, como sou descendent­e de hispânicos, gosto da briga e parto pa-

ra o ataque. A melhor forma de lutar contra esses calhordas é partindo para o ataque e dando chute na canela. Todo mundo me conhece na universida­de por isso, eu sou de briga, entro na briga, não tenho medo deles”, disse Vélez Rodríguez, em 2013, em entrevista a um podcast do Instituto Mises Brasil, ligado ao pensamento liberal.

Essa postura, em suas palavras, fez com que fosse marginaliz­ado por agências financiado­ras de pesquisas. Rodríguez diz que foi barrado em bancas de defesa de trabalhos acadêmicos em universida­des como a Unicamp.

Para especialis­tas ouvidos pela Folha, Rodríguez é pouco conhecido entre entidades que trabalham com educação, e a falta de experiênci­a em gestão no setor público será um obstáculo adicional.

De acordo com Priscila Cruz, presidente-executiva do movimento Todos pela Educação, ele terá pouco tempo para estabelece­r que tipo de política vai priorizar.

“Não o conhecia, mas, pelo que pude ver, é uma pessoa que tem um alinhament­o ideológico com o presidente eleito. É um acadêmico, o que é bom de um lado, mas não tem experiênci­a em gestão pública. Isso coloca para ele um desafio profission­al em muito pouco tempo, pois ele tem um mês para entender a estrutura do MEC e definir muita coisa”, afirma.

“Ele é uma pessoa da teologia, que nunca gerenciou nada no setor público e que terá que administra­r um dos maiores orçamentos da União”, disse Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educaciona­is da FGV e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

“Ele está distante em qualquer aspecto da gestão educaciona­l, e há um risco de uma pessoa que não entenda da área querer modificar vários avanços, que, mesmo lentos, ocorreram nos últimos anos. Há um risco de querer jogar a criança com a água do banho.”

Bolsonaro escolhe colombiano crítico da esquerda para comandar Educação

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Reprodução O novo ministro, Ricardo Vélez Rodríguez

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