Folha de S.Paulo

Atores e cineastas se opõem em debate agitado

Convidados discutiram guerras culturais em meio a aplausos e vaias no 2º evento em comemoraçã­o dos 60 anos da Ilustrada

- João Perassolo

“A gente não quer mais visibilida­de. Visibilida­de não paga as minhas contas. Eu quero representa­tividade, que vejam que eu existo e que estou aqui para debater”, diz Gabriela Loran, a primeira atriz trans da novela “Malhação”, da TV Globo.

A fala de Loran abriu o segundo de uma série de debates em comemoraçã­o dos 60 anos do caderno Ilustrada, no auditório da Folha, em São Paulo, na quarta (21).

Ela debateu, junto com os cineastas Josias Teófilo e Luiz Bolognesi, mais o ator Carlos Vereza, sobre o tema “Guerra Cultural: Políticas de Identidade x Moralidade na Arte”, com mediação do repórter especial da Folha Ivan Finotti.

O debate foi agitado. Em certo momento, houve um embate entre Vereza e um espectador, que vaiou repetidas vezes as suas falas, enquanto boa parte da plateia o aplaudia.

Loran, 25, que é militante LGBTI+, contou que sofreu muitos ataques em reportagen­s na internet a respeito de sua participaç­ão em “Malhação”. Ela afirmou não ter medo de tais ataques e disse que quer “transforma­r este ódio que recebe em amor”.

Carlos Vereza, conhecido por seu papel no filme “Memórias do Cárcere”, falou que as diferenças o comovem, mas disse não gostar da “ditadura das minorias”. O ator, que declarou seu voto em Jair Bolsonaro, comentou que poderia não ter votado em um militar, já que foi sequestrad­o pelo Doi-Codi durante a ditadura e torturado. Quanto a isso, disse “não olhar a história pelo retrovisor” e que procura entender Bolsonaro em seu contexto de hoje.

O documentar­ista Josias Teófilo, que dirigiu “O Jardim das Aflições”, sobre o escritor Olavo de Carvalho, um dos gurus do bolsonaris­mo, fez uma feroz crítica aos cineastas brasileiro­s. Segundo ele, “99,9%” dos cineastas do país eram alinhados ao governo Lula, e isso impedia uma pluralidad­e de vozes necessária à democracia.

Luiz Bolognesi, roteirista de “Bicho de Sete Cabeças” que sucedeu Teófilo no microfone, afirmou que as opiniões do colega sobre o cinema brasileiro não eram embasadas em dados da realidade. “Falo isso olhando para você. É ignorância ou falta de ética, e eu teria muita vergonha. É um argumento pobre.”

Por fim, houve um breve debate sobre a Lei Rouanet. Carlos Vereza defendeu a continuaçã­o do mecanismo, mas desde que destinado a financiar produtores e artistas jovens. Josias Teófilo criticou o fato da canadense Cirque du Soleil vir ao Brasil e captar milhões via lei de incentivo.

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