Folha de S.Paulo

‘Pais de Primeira’, sitcom na Globo, captura tragicoméd­ia da paternidad­e

- “Pais de Primeira” estreia na Globo neste domingo (25), às 13h53

Só bruxaria explica o que passa com a memória de pais e mães para que, tão poucos anos após a chegada do rebento, nela perdure só o que é doce e feliz —e talvez um e outro episódio terrível porém pitoresco que anime a roda em uma das 207 festinhas infantis que você passa a frequentar.

Todo drama cotidiano, todo desespero absoluto com coisas comezinhas, os fracassos, as dores, a solidão do ‘não é possível que isso só aconteça comigo’, esses esvaecem.

É no resgaste desse limbo de desgosto —e de seu estado alterno, o encantamen­to— que está a força cômica de “Pais de Primeira”, série de Antonio Prata que estreia neste domingo (25) na Globo e cujo piloto está na Globoplay (serão mais cinco episódios de meia hora nas próximas semanas e 14 na segunda temporada, já em produção).

Com a chegada de Olivia e Daniel, a paternidad­e tomou muito dos últimos cinco anos de Prata, inclusive das crônicas nesta Folha, e parecia inevitável ela inspirar seu primeiro projeto como showrunner.

Junto do amigo e corroteiri­sta Chico Mattoso (ele também pai de dois), o escritor criou Taís e Pedro, um casal de 30 e algo que, após alguns anos vivendo juntos, se veem grávidos no momento em que faziam planos opostos (ela, subir na carreira; ele, largar o emprego e viver de música).

O que se desdobra daí, os dois às voltas com uma recémnasci­da, é imediatame­nte familiar a quem já tentou educar um pequeno humano, e poderia descambar para o clichê.

Mas isso não acontece, graças ao empenho dos roteirista­s com os diálogos (o time conta, além dos dois, com Thiago Dottori, Bruna Paixão e Tati Bernardi, também colunista da Folha e mãe recente).

“Pais de Primeira” é engraçada porque é real, porque aqueles que a escrevem privilegia­ram esse naturalism­o em detrimento das piadas caricature­scas que recheiam a maioria das comédias brasileira­s (tanto é assim que há muito mais séries dramáticas bem sucedidas por aqui do que cômicas, e nesta seara vamos bem quase que só nas de esquetes).

A feliz escolha dos protagonis­tas possibilit­a que esse roteiro decole. A doçura desajeitad­a do Pedro de George Sauma (“Toma Lá da Cá”) e o timing mordaz da Taís de Renata Gaspar (de “Tá no Ar”) —cuja envergadur­a dramática é um colosso— faz deles um poço de empatia, relacionáv­eis e interessan­tes.

Uma pena que parte dos coadjuvant­es, mesmo os mais experiente­s, ainda opere no registro dos surrados humorístic­os de claque da TV aberta, o que causa ruído nas cenas que vão além do par central e dos veteranos Marisa Orth e Daniel Dantas, que fazem dos pais de Pedro.

Essa graça melancólic­a, esse humor ora doído ora empático, são um traço comum na escrita de Prata e também a marca de um de seus humoristas preferidos, o americano Louis C.K., talvez o mais sublime cronista dos EUA hoje.

Jerry Seinfeld, outros dos preferidos, diz que a coisa mais importante na arte é a proporção. O timing, o quanto arriscar, até onde ir.

A julgar pelo piloto, “Pais de Primeira” acerta a mão.

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Estevam Avellar/Divulgação Renata Gaspar e George Sauma em ‘Pais de Primeira’

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