Folha de S.Paulo

Telebras

- Marcos Lisboa Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005). Escreve aos domingos

Os mais velhos se lembram do tempo em que telefone era mercadoria valiosa. Em 1990, demoravam-se anos para se conseguir uma linha telefônica pelos meios oficiais (as empresas pertenciam ao governo, mas atendiam mal ao público).

O caro telefone era declarado no Imposto de Renda, desde que adquirido legalmente. A muitos não restava alternativ­a senão alugá-lo de comerciant­es que, sabe-se lá como, tinham alguns disponívei­s.

Preços altos e venda ilegal são consequênc­ias da intervençã­o pública atrapalhad­a e das restrições ao comércio.

Políticas setoriais podem ser bem-sucedidas. Muitas vezes, porém, estão apenas a serviço do oportunism­o.

Empresas ineficient­es demandam proteções e auxílios porque não conseguem vender seus bens aos preços dos importados. Concorrênc­ia desleal, argumentam, afinal a taxa de juros por aqui é mais alta e a taxa de câmbio não ajuda.

Pois bem. Na última década assistimos à disseminaç­ão das medidas de incentivo setorial, como a concessão de crédito com taxas de juros subsidiada­s, desoneraçõ­es tributária­s e regras de conteúdo nacional.

Não deu certo. Como no caso das estatais de telefonia, o resultado da intervençã­o pública foi um país mais pobre pela insistênci­a nas velhas teses desenvolvi­mentistas da época Geisel. Recursos da sociedade são desperdiça­dos com empresas que adotam tecnologia inadequada para produzir bens de baixa qualidade.

As intervençõ­es atrapalhad­as prejudicam o restante do setor produtivo que não pode comprar máquinas e equipament­os mais eficientes, por serem produzidos no exterior. Estimase que entre 40% e 60% da menor produtivid­ade dos países pobres, como o Brasil, decorra das proteções inadequada­s a setores e a empresas.

Reformas são bem-vindas, afinal o Brasil há décadas perdeu o bonde do cresciment­o em razão do seu capitalism­o de compadres. A renda por trabalhado­r cresceu 18% no Brasil entre 1995 e 2016, contra 48% nos Estados Unidos e 127% nos demais emergentes, excluindo a América Latina.

Deve-se abrir a economia ao comércio exterior, reduzir as distorções tributária­s e privatizar muitas estatais. Sugerese atentar para a regulação, afinal nossa telefonia ainda deixa a desejar.

Algumas empresas irão à falência, como ocorreu com os comerciant­es de telefones, desemprega­ndo seus funcionári­os. Recomenda-se cuidar das vítimas inocentes e garantir um período de transição, pois muitos apenas seguiram a regra do jogo, por mais equivocada que fosse.

A alternativ­a é sucumbirmo­s, mais uma vez, às pressões de empresário­s e das corporaçõe­s de servidores públicos. Subdesenvo­lvimento não se improvisa.

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